Rio - Não durou muito a alegria de gays, lésbicas, bissexuais, transexuais, transgêneros e travestis (LGBTs), nestas eleições. Em menos de 24 horas, as convicções religiosas da presidenciável Marina Silva e a pressão de setores evangélicos conservadores retiraram do programa de governo do PSB a defesa de direitos civis para o grupo.
O documento, apresentado na sexta-feira, atendia às demandas da comunidade LGBT, como a defesa do casamento civil entre pessoas do mesmo sexo e a criminalização da homofobia. No sábado, porém, o movimento teve um choque de realidade pela manhã, quando nota distribuída pela coordenação de campanha da candidata do PSB retificou as diretrizes de seu eventual futuro governo.
“Houve erro”, disse a candidata em visita à favela da Rocinha. “Publicaram o texto tal qual apresentado pelos movimentos sociais”, afirmou, referindo-se ao programa oficial apresentado ontem.
Entre as alterações, estavam a substituição do termo “casamento civil igualitário” por “união civil” — algo genérico, que não tem aplicação legal, segundo o advogado Sergio Bittencourt. “Ninguém vai ao cartório e diz querer registrar união civil. Casa-se no civil ou registra-se união estável. São coisas diferentes e ambas uniões civis. É defender coisa nenhuma”, explica.
Com as mudanças, Marina não angariou simpatias nem de setores mais radicais da igreja evangélica nem, tampouco, dos mais progressistas. E menos ainda dos LGBTs. “Vou esperar até segunda-feira (amanhã) para ver se ela se posiciona. As palavras foram atenuadas, mas permanece a agenda gay. Se ela não se posicionar, eu vou descer o pau”, ameaçou o pastor Silas Malafaia, dizendo-se representante do pensamento evangélico que, hoje, segundo ele, abarcaria quase 30% da população brasileira.
LEIA: Jovem faz selfie irônica com Silas Malafaia dentro de avião e vira hit
Ouvidos pelo DIA, dois outros pastores, no entanto, lamentaram o recuo da também evangélica Marina Silva. “Jesus andava com os excluídos e denunciava os fundamentalistas de seu tempo. Negar direitos civis é anticristão, é um desrespeito à memória histórica do mestre”, declarou Henrique Vieira, pastor da Igreja Batista do Caminho, em Niterói. Na mesma linha, está Marcos Gladstone, da Igreja Cristã Contemporânea: “É muito triste, porque a defesa do estado laico e dos direitos civis é uma garantia de que podemos professar a nossa fé.” Ambos negaram ser representados por Malafaia.
O deputado federal Jean Wyllys (Psol-RJ), que é ativista LGBT, afirmou que, com a atitude, Marina Silva “brinca com o sentimento de milhares de pessoas”. “Acreditaram nela, tiveram a esperança de que teriam uma aliada na luta por direitos civis. Iludiram-se”, lamentou o parlamentar.
Já Claudio Nascimento, fundador da Parada Gay de Copacabana, questiona a independência de um possível futuro governo de Marina: “Será que ela vai governar sob o olhar dos fundamentalistas religiosos?”
Versão 1
CASAMENTO CIVIL
Apoiar proposta em defesa do casamento civil igualitário, com vistas à aprovação do projeto de lei e da emenda constitucional, que garatem o direito ao casamento igualitário na Constituição e no Código Civil.
HOMOFOBIA
Articular no Legislativo votação da PLC 122/06, que equipara discriminação por orientação sexual e identidade de gênero à do racismo, que já inclui nacionalidade e religião.
IDENTIDADE
Comprometer-se com a aprovação da Lei da Identidade de Gênero, que regulamenta o direito ao reconhecimento da identidade das “pessoas trans”, com base no modo como se sentem e se veem, dispensando autorização judicial, laudos médicos e psicológicos, e cirurgias.
ADOÇÃO
Eliminar obstáculos à adoção de crianças por casais homoafetivos.
BULLYING
Incluir o combate ao bullying, à homofobia e ao preconceito no Plano Nacional de Educação, desenvolvendo material didático destinado a conscientizar sobre à diversidade de orientação sexual e às novas famílias.
SAÚDE
Garantir e ampliar a oferta de tratamento e serviços de saúde para que atendam às necessidades especiais da população LGBT no SUS.
TRABALHO
Assegurar que cursos e oportunidades de educação que a população LGBT possui, para garantir ingresso no mercado de trabalho.
DIREITOS HUMANOS
Dar efetividade ao Plano Nacional de Promoção da Cidadania e Direitos Humanos LGBT.
Versão 2
UNIÃO CIVIL
Garantir os direitos oriundos da união civil entre pessoas do mesmo sexo.
IDENTIDADE
Aprovado no Congresso Nacional o Projeto de Lei de Identidade de Gênero, que regulamenta o direito ao reconhecimento da identidade das “pessoas trans”, com base em como se sentem e veem. Dispensar autorização judicial, laudos médicos e psicológicos e as cirurgias.
ADOÇÃO
Como nos processos de adoção interessa o bem-estar da criança que será adotada, dar tratamento igual aos casais adotantes, com todas as exigências e cuidados iguais para ambas modalidades de união, homo ou heterossexual.
BULLYING
Incluir o combate ao bullying, à homofobia e ao preconceito no Plano Nacional de Educação.
SAÚDE
Garantir e ampliar a oferta de tratamentos e serviços de saúde para que atendam as necessidades especiais da população LGBT no SUS.
TRABALHO
Assegurar que os cursos e oportunidades de educação e capacitação formal considerem os anseios de formação da população LGBT para garantir ingresso no mercado de trabalho.
DIREITOS HUMANOS
Considerar as proposições do Plano Nacional de Promoção da Cidadania e Direitos Humanos LGBT na elaboração de políticas públicas específicas para populações LGBT.