A sensação térmica em Vila do Céu era de 40 graus na quinta-feira, quando Julio recebeu O DIA no consultório. Do bolso, ele tira um lenço para enxugar o suor no rosto. Apesar do ar condicionado, o calor é quase insuportável. Uma realidade que não assusta quem tem no currículo experiências no Haiti, onde o atendimento era feito em postos sem ventilação ou qualquer iluminação.
“Achei que iria encontrar um cenário no Rio muito pior do que realmente é. Vi que tem estrutura e a equipe é dedicada. É possível fazer um bom trabalho”, avalia ele, que deixou dois filhos na ilha de Fidel. “Um deles será médico”, diz, orgulhoso. Por aqui, o trabalho na comunidade de 29 mil habitantes será exaustivo. No hospital onde atuava em Cuba, ele tinha sob sua atenção 1,2 mil pessoas. Em Vila do Céu, serão 4 mil. Pacientes como a pequena Mariana Cadena, de 6 meses, estão na lista de atendimento. Enquanto mama, sua mãe, a camelô Raquel Cadena, 38, diz estar esperançosa.
“Ficamos quase dois meses sem o médico de família. A ajuda vinha da enfermeira, que acompanhava o peso da neném. Estava preocupada com o desenvolvimento dela”, avalia Raquel. A mãe disse não se importar com a consulta auxiliada por uma enfermeira tradutora. “Quero alguém para me atender. Não importa de onde venha”.
Dos R$ 10 mil que o governo brasileiro vai passar para a Organização Pan-Americana de Saúde, referentes ao trabalho dos cubanos, Julio e sua família vão ficar com cerca de R$ 2,3 mil. O restante é retido por Cuba, que durante os três anos que os médicos vão ficar aqui continuará depositando o salário deles. “O que vai para lá será reinvestido na área de saúde. Não é para mim. É para todo mundo”, explica Julio, sem se mostrar incomodado.
Cidade que mais avançou
Medo da violência noticiada
A rotina no Rio é parecida com a de Cuba. São 40 horas por semana, mas lá os médicos trabalham quatro horas todos os sábados. Assim como o colega que atua em Vila do Céu, José Manuel Anaya, 45, que trabalha no Centro de Saúde de Inhoaíba, passou pela Venezuela. Também esteve em Gana antes de vir para o Brasil.
No Rio, admite ter medo da violência: “Vejo nos jornais que aqui tem três, quatro mortos por dia. Por isso, estou sempre atento”, afirma o cubano, que ainda não teve tempo para conhecer pontos turísticos da cidade.