Rio - Após a segunda Guerra Mundial, o mundo foi dividido em duas grandes áreas de influência. Os Estados Unidos, com o Plano Marshall, intensificaram investimentos para reconstruir a Europa e solidificarem-se naquele continente. Ao mesmo tempo aportaram no Japão, fazendo frente à influência da União Soviética na Ásia. Com os recursos americanos, os japoneses se tornaram imbatíveis na fabricação de aparelhos elétricos, que tinham o transistor como novidade.
Na década de 70, período do milagre brasileiro e anos de chumbo, empresários brasileiros associaram-se a japoneses e instalaram indústrias no Brasil. Um dos fabricantes de televisão se superou na propaganda, que dizia: “Os nossos japoneses são melhores que os japoneses dos outros.” A derrota dos setores populares, nacionalistas e de esquerda na eleição deste ano rememora tal propaganda.
A primeira eleição presidencial após a ditadura empresarial-militar elegeu herdeiro da ditadura que iniciou o ciclo neoliberal, mas sofreu impeachment. A eleição seguinte elegeu um sociólogo cassado pelo regime militar, que — esquecendo o que escrevera — intensificou as políticas liberais, vendeu o Brasil, como disse um dos seus auxiliares, subtraiu direitos dos trabalhadores, negociou uma emenda que lhe possibilitasse a reeleição e aprofundou a miséria.
Nas eleições de 2002, um novo projeto foi apresentado ao povo brasileiro. A esperança venceu o medo, e tivemos o menor índice de abstenções, votos nulos e brancos das últimas 10 eleições. Mas, violando-se a razão da esperança, foi implementada reforma da previdência que não se fizera em governos anteriores e instituída tributação sobre aposentadorias. Para a presidência do Banco Central foi nomeado um banqueiro, eleito deputado pelo partido derrotado, que havia deixado a presidência de um dos principais bancos estadunidenses.
A política conservadora que se implementou satisfez os interesses da classe dominante, mas contemplou os mais pobres com migalhas decorrentes de recursos transferidos dos setores médios da sociedade. Manifestantes foram criminalizados como não ocorria desde o período mais duro da ditadura empresarial-militar. O resultado da truculência foi a eficiente desarticulação das organizações populares, com resultado expresso nas urnas.
O povo não elege candidatos populares para a implementação de políticas conservadoras. Para isto votaria em candidatos conservadores. Afinal, as políticas conservadoras dos conservadores são melhores que as políticas conservadoras dos outros. A direita incivilizada sabe, mais que os candidatos populares, implementar políticas impopulares. Quem vota num candidato que se diz progressista espera dele políticas progressistas. De outro modo é a desnorteante infidelidade eleitoral.
João Batista Damasceno é doutor em Ciência Política pela UFF e juiz de Direito