Por thiago.antunes

Rio - O jurista e cientista político alemão Karl Loewenstein analisou os horrores praticados pelo nazismo sob as leis que ele mesmo fazia. Muitos executores de barbaridades foram posteriormente absolvidos alegando legalidade e obediência hierárquica. Mas os formuladores das leis iníquas não puderam isto alegar.

Seus estudos tiveram grande impacto no pensamento constitucional do Ocidente. Em sua obra ‘Teoria da Constituição’, Karl Loewenstein afirmou que as constituições são aquilo que fazem com ela na prática.

Dispõe a Constituição que são funções institucionais do Ministério Público “promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos” e “requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial”.

A Constituição é clara. O MP pode promover o inquérito civil público. Quanto a inquérito policial e diligências investigatórias, apenas pode requisitar a atuação policial. Mas o MP tem promovido inquérito policial, e há decisões judiciais legitimando isto. Apesar do texto, a Constituição é o que se faz na prática com ela.

O perigo de tais atuações à margem da legalidade é a perda da referência até onde pode ir o agente público. Um promotor endereçou cartas a empresários perguntando sobre a atuação de um juiz considerado garantista dos direitos dos acusados.

A resposta foi que estavam insatisfeitos e que se deveria ser mais duro com os indesejáveis. Estas respostas foram remetidas ao tribunal, pedindo procedimento contra o juiz como se fossem manifestações espontâneas dos empresários.

As “colaborações premiadas” são práticas regulamentadas por lei e sujeitas a prévia homologação judicial. Mas membros do MP têm ouvido presos ‘informalmente’ e atribuído a tais ‘depoimentos’ o rótulo de “colaboração espontânea” com o fim de incriminar pessoas contra as quais desejam ver instaurado procedimento.

Em Magé, no ano de 1996, um promotor deixou de ser falsamente acusado de tentativa de crime sexual porque outro promotor que sabia da trama “bateu com a língua nos dentes” e o promotor que seria acusado foi avisado por um juiz. É perigoso um sistema no qual as liberdades ficam sujeitas aos caprichos de autoridades. Só a legalidade é parâmetro para as liberdades públicas.

João Batista Damasceno é doutor em Ciência Política e juiz de Direito

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