Um mês após a tragédia natural, o local onde 11 pessoas morreram continua da mesma maneira após a última vítima ter sido encontrada Foto:Divulgação
Publicado 02/05/2022 18:28
Costa Verde – Um mês após sofrer com uma das chuvas mais fortes de toda a sua história, Angra dos Reis – no litoral sul do estado do Rio de Janeiro -, vai voltando aos poucos à sua rotina. Porém, como em toda a tragédia, as marcas continuam visíveis, tanto nas encostas que circundam todo o território do município, quanto no dia a dia daqueles que tiveram suas vidas mudadas pela força da natureza.
Os moradores do bairro de Monsuaba, onde 11 pessoas perderam a vida em um deslizamento de terra na madrugada do dia 2 de abril, aos poucos vão retomando seus afazeres. Muitos ainda têm dificuldade em aceitar o que aconteceu durante aquela noite no fim da rua Francisco Cesário Alvim.
Uma semana após o deslizamento, uma missa foi celebrada pelas almas dos que se foram. Alunos da rede municipal de ensino soltaram balões homenageando os mortos no reinício das aulas nas escolas do bairro. Dezenas de famílias da localidade estão morando em novas casas com o auxílio do Aluguel Social, mas nada disso as faz esquecer daqueles que se foram.
Segundo moradores, a rua onde aconteceu o deslizamento está parecendo um cemitério, pois diversas residências precisaram ser interditadas. No local onde a encosta cedeu, muitos móveis que apareceram durante as escavações ainda estão à mostra sujos de barro, o que acaba relembrando a tragédia a todo instante para aqueles que ficaram.
Após a última vítima ter sido encontrada, as máquinas deixaram o bairro e o local continua da mesma forma que foi deixado depois da saída das equipes de busca e salvamento.
Alguns homens que trabalharam no resgate das vítimas estão precisando de auxílio psicológico para superar os momentos de dor e desespero vividos durante os salvamentos.
O tenente bombeiro André Kaizer, de 53 anos, tem passado por momentos difíceis neste primeiro mês pós-tragédia. Mesmo tendo salvado seis pessoas com seus companheiros, ele ainda pensa naquelas que eles não conseguiram ajudar, e classificou aquele 2 de abril como o pior dia de sua vida.
- Fomos os primeiros a chegar no local. Entramos em um buraco e uma lage desceu em cima da gente. Ficamos presos com uma menina de 13 anos que pedia pra gente não desistir dela. O barro estava descendo em cima de nós, então pedi uma alavanca, uma marreta e conseguimos quebrar a laje que prendia as pernas da menina. O sargento Alex ainda retirou outra garota que estava soterrada -, contou Kaizer, emocionado.
O tenente ainda lembra que, poucos instantes após chegarem com as vítimas a um lugar seguro, a encosta acabou de descer e soterrou o local.
Outro bombeiro, que pediu para não ser identificado, contou que participou das buscas nas três tragédias naturais que aconteceram em Angra nas duas últimas duas décadas.
- As experiências anteriores que tive com esse tipo de evento facilitaram a visualização dos corpos -, disse ele.
O bombeiro contou que foi muito triste encontrar uma família que tentava fugir do desmoronamento. A mãe e um filho pequeno, que ela provavelmente levava no colo, foram os primeiros a ser achados.
- Fomos retirando a terra e os entulhos, e assim que descobrimos o corpo da mãe, logo apareceu uma parte do braço da criança. Fomos desenterrando mais um pouco e logo apareceu o corpo do avô e um pouco mais para a direita já tínhamos encontrado o corpo do filho mais velho, de aproximadamente uns 9 anos -, contou.
Todo o drama vivido naquela noite deixou algum tipo de sequela naqueles que conseguiram se salvar e nos que participaram das buscas. Além de ter dificuldade para dormir desde o salvamento, o tenente André Kaizer também está tratando a pressão arterial que desde o episódio se encontra alterada.
- Eu ainda retirei mais uma criança de 06 anos, mas ela já estava em óbito. A carga emocional foi muito alta e eu e meus companheiros vivemos o desespero de todas as famílias que tiveram entes queridos soterrados –, contou André Kaizer, lembrando que ainda ouve os gritos de socorro pelos quais ele e a equipe eram guiados na madrugada chuvosa e escura.

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