Flávio Dino, governador do MaranhãoDivulgação
Por ESTADÃO CONTEÚDO
Publicado 06/05/2021 08:45
Rio - Em um polêmico julgamento sobre os limites da liberdade de expressão e o que pode ser enquadrado como discurso de ódio, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) condenou, na terça-feira, pelo placar apertado de 4 a 3, um contador do Maranhão por propaganda eleitoral antecipada, de cunho negativo, contra o governador Flávio Dino (PCdoB). Everildo Bastos Gomes postou no Instagram um vídeo com críticas a Dino, chamado de "ladrão" e caracterizado como nazista nas imagens. Na época da postagem, a conta de Everildo tinha cerca de 2,5 mil seguidores.
Integrantes do tribunal e especialistas ouvidos pelo Estadão apontam que o caso pode abrir precedente para, em outro momento, a Justiça Eleitoral punir quem usar as redes sociais para chamar o presidente Jair Bolsonaro de "fascista" e "genocida", por exemplo.
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Antes do período permitido para a campanha eleitoral de 2018, que começou em 15 de agosto daquele ano, Everildo postou um vídeo que caracterizava Dino como um nazista de nariz comprido, como o personagem Pinóquio, acompanhado da expressão "Fora, ladrão!" e a hashtag "#DinovoNÃO". A decisão do plenário TSE restabeleceu a condenação de R$ 5 mil que o Tribunal Regional Eleitoral do Maranhão havia imposto a Everildo.
"A livre manifestação do pensamento não constitui direito absoluto, de modo que o discurso de ódio - que não se confunde com críticas ácidas e agudas - não deve ser tolerado, em resguardo à higidez do processo eleitoral, da igualdade de chances e da proteção da honra e da imagem dos players", escreveu o ministro Tarcisio Vieira de Carvalho em seu voto.

"Dúvida não há de que as expressões utilizadas pelo representado a exemplo da pecha de nazista, ofenderam inexoravelmente a honra do governador, consubstanciando discurso de ódio passível de enquadramento no campo da propaganda eleitoral antecipada negativa".

O diretório do PCdoB no Maranhão acionou a Justiça Eleitoral sob a acusação de que Everildo utilizou o Instagram com o intuito de "rebaixar" a imagem política do governador antes do período autorizado por lei para a propaganda.

O vídeo continha os seguintes dizeres: "Dino, Dino, Dino, Dino, Fora Ladrão", "Os ‘comunista’ (sic) roubando", "O Maranhão tá cheio de rato" e "Bando de comunista ladrão".

Na opinião do ministro Edson Fachin, atribuir o adjetivo "nazista" a um candidato "corporifica inadmissível discurso de ódio". "Apor a alguém a pecha de nazista busca atribuir a um ser humano características como a de rejeição a determinados extratos sociais, de adoção de pontos de vista ideologicamente antidemocráticos, além de buscar lhe vestir de toda a reprovação que a história mundial assentou sobre todos os homens que perfilharam o ideal do nazismo durante a Segunda Guerra Mundial", observou.

O ministro Alexandre de Moraes, por sua vez, reforçou o entendimento dos colegas, ao destacar a importância de a Justiça Eleitoral deixar claro que discursos dessa natureza não serão admitidos. Moraes vai comandar o TSE durante as eleições do ano que vem. "Talvez as redes sociais tenham tornado tão banais essas ofensas e perseguições que há um momento em que há necessidade de se mostrar que as milícias digitais não atuam em terra de ninguém", disse.

"Esses indivíduos não estão atuando sozinhos, há uma rede miliciana de ofensas, de antipropagandas, porque imputar nazismo a um agente político é uma antipropaganda. O momento é importante para a Justiça Eleitoral mostrar que isso não será admitido para deslegitimar as eleições", afirmou.

Divisão

A análise da controvérsia rachou o plenário. Relator do caso, o presidente do TSE, Luís Roberto Barroso, se manifestou contra a punição do contador. Para Barroso, o vídeo representava "manifestação de cidadão comum em rede social" em forma de sátira. Na opinião do ministro, não é qualquer crítica contundente ou ofensa à honra que caracteriza propaganda eleitoral negativa antecipada, sob pena de se colocar em risco a liberdade de expressão.

"As ofensas à honra são reprováveis e há meios jurídicos adequados no processo criminal e civil para repeli-las. Apenas não considerei propaganda política antecipada. Para não banalizar uma expressão que é importante, a do discurso de ódio, chamar alguém de corrupto, de comunista, de fascista pode ser injusto, cruel, mas não é discurso de ódio", disse Barroso.

Punido, o contador Everildo Bastos Gomes disse à reportagem que o vídeo publicado contra Dino foi feito por terceiros e recebido por ele em um grupo de WhatsApp. "De certa forma me arrependo (da publicação), outras pessoas publicaram, inclusive quem fez na época nem foi citado", afirmou o contador.

"Votei em Bolsonaro, sou de direita, meu último voto na esquerda foi em Flávio Dino em 2014. Se Bolsonaro processar todo mundo que chama ele de genocida, o TSE vai ter muito trabalho", disse. Dino não se manifestou sobre o resultado do julgamento.

Para Rodolfo Viana, membro da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep), o julgamento do TSE levanta preocupações. "Há pontos na decisão que podem autorizar, sim, excessos do Judiciário em prejuízo à liberdade de expressão, uma vez que banaliza o conceito de discurso de ódio, amplia demasiadamente o conceito de propaganda eleitoral negativa, pune desproporcionalmente o exercício da crítica política e estimula a cultura de restrição à liberdade de expressão", avaliou.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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