Luiz Paulo Dominguetti Pereira depõe na CPI da Covid. Pedro França/Agência Senado
Por O Dia
Publicado 01/07/2021 12:18 | Atualizado 01/07/2021 15:29
Durante seu depoimento na CPI da Covid, o representante da Davati Medical Supply, Luiz Paulo Dominguetti Pereira, afirmou que o deputado Luis Miranda (DEM-DF) tentou negociar a compra de vacinas contra a covid-19 com a empresa Davati Medical Supply. Durante a comissão, o depoente apresentou um áudio que seria de Miranda tentando negociar o prosseguimento da venda com membros da Davatti.

O áudio teria sido enviado a Dominguetti por Cristiano Alberto Carvalho, representante oficial da Davatti no Brasil, após o depoimento de Miranda na CPI. "O Christiano (Alberto Carvalho, representante da Davati) me relatava que volta e meia tinha parlamentares, não sei quem, o procurando, e quem mais o incomodava era o deputado Luís Miranda, o mais insistente com a compra, negociação de vacinas", disse o policial.
Dominguetti afirma que no áudio o parlamentar tentava intermediar a compra de vacinas. Segundo o depoente, o áudio foi enviado seguido da mensagem "olha ele lá, porém fazendo o inverso aqui". Veja:

Após apresentar o áudio, Dominguetti afirmou que, na gravação, Miranda também se referia ao irmão, o servidor do ministério da Saúde, Luis Ricardo Miranda, embora o áudio não deixasse essa prerrogativa clara e não fosse possível confirmar se o deputado, de fato, se referia a compra de vacinas.
Publicidade
No áudio, porém, a expressão "meu irmão" utilizada por Miranda soa como uma gíria que o deputado repete várias vezes ao longo da conversa. Na mensagem também não há menção a qual produto estava sendo negociado, nem para quem.

"Eu não vou mais perder tempo com esse comprador, porque desgastou muito, meu irmão, nos últimos 60 dias. É muita conversa fiada no mercado e aí eu nem me sinto confortável", diz o deputado na mensagem. O policial disse que recebeu o áudio após o depoimento de Luis Miranda na CPI semana passada. A gravação, de acordo com Dominguetti, não foi enviada a ele. A denúncia, por sua vez, acabou agitando os senadores da comissão. 
"Chapéu de otário é marreta, irmão. O senhor está sob juramento. Não venha achar que aqui todo mundo é otário, nem pateta. Veja qual é seu papel aqui. Do nada surge um áudio do deputado Luis Miranda”, afirmou o senador Omar Aziz (PSD-AM) a Dominguetti. 
Publicidade
Também chamou a atenção dos parlamentares da CPI o fato de o senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ), que não integra a comissão, sair em defesa do policial que denunciou corrupção no governo. Em resposta a Aziz, Flávio disse que "o áudio é importante". Ao que o presidente da comissão reiterou que Miranda foi convocado para falar de novo à CPI e completou: "Se o deputado Luís Miranda está envolvido com maracutaia, pegou pernada, isso é problema dele, não é nosso".
"Essa CPI não vai aceitar esse tipo de coisa. Nós não estamos aqui para isso. Estamos aqui para investigar. Esses genocidas que causaram tanta dor ao Brasil vão ser responsabilizados sim, haja o que houver", declarou Renan Calheiros (MDB-AL) em bate-boca com a tropa de choque do Palácio do Planalto na CPI.
Publicidade
Em seguida, Calheiros afirmou que a PF "foi usada" ao abrir o inquérito para proteger o dono da Precisa Medicamentos, Francisco Maximiano, envolvida no escândalo de compra da vacina indiana Covaxin, apenas para configurá-lo como "investigado". Os senadores Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE) e Marcos Rogério (DEM-RO), aliados de Bolsonaro, discutiram após o questionamento de Calheiros sobre a atuação da Polícia Federal. Desse modo, seria mais fácil a aprovação de um habeas corpus para que ele pudesse se manter em silêncio na comissão. O direito em questão foi aprovado pela ministra Rosa Weber nesta quarta-feira, 30.
"Ontem [quarta-feira, nós tivemos uma eloquente utilização da instituição da Polícia Federal. Porque, não sendo investigado nessa comissão, o senhor Maximiano teve contra si aberto uma investigação na Polícia Federal. E essa investigação serviu de base para a concessão do habeas corpus pela ministra Rosa Weber, numa burla", disse Renan. 
Publicidade
Durante a discussão, Luis Miranda, citado pelo depoente, entrou na sessão e conversou com Aziz e Calheiros, aumentando ainda mais o tom do debate entre os senadores. Ele foi para uma sala reservada conversar com alguns membros da CPI. Assista:
Publicidade
Momentos depois, a senadora Simone Tebet chegou a questionar o motivo de Dominguetti, policial da ativa, não ter dado voz de prisão em flagrante por pedido de corrupção.
"Vossa senhoria poderia ter dado voz de prisão em flagrante e não o fez, por quê?", questionou. Confira:
Publicidade
O vice-presidente da sessão, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), determinou a apreensão do celular de Dominguetti para análise do áudio e afirmou que o mesmo será disponibilizado para todos os senadores da comissão.
Publicidade
"Essa presidência vai requisitar do senhor depoente o seu telefone para perícia imediata por parte da Polícia Legislativa do Senado. Eu peço para que a secretaria da comissão assim determine", pontuou.
Acompanhe ao vivo:
Publicidade
O deputado Miranda se tornou pivô na CPI após ter dito que alertou o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) sobre um suposto esquema de corrupção na compra da vacina indiana da Covaxin. Os senadores suspeitam de uma tentativa do governo do presidente Jair Bolsonaro de tentar "virar o jogo" na investigação. Renan Calheiros afirmou que o governo tenta atrapalhar a apuração, citando também uma estratégia de abrir inquérito na Polícia Federal e barrar o depoimento de investigados na CPI, entre eles o do dono da Precisa Medicamentos, Maximiano, que negociou a compra da Covaxin.
Publicidade
Davati
A Davati, empresa que Dominguetti afirmou representar, chegou ao governo por meio de um oficial da reserva do Exército que integra a chamada "Abin paralela", grupo de informantes que Bolsonaro afirma manter para não depender dos órgãos oficiais de informação. O coronel Roberto Criscuoli disse à reportagem ter sido responsável por fazer a ponte entre a Davati Medical Supply e o Ministério da Saúde. A empresa nega que o policial seja seu representante.

Em e-mail à reportagem, porém, o responsável pela Davati nos Estados Unidos, Herman Cárdenas, admitiu que o nome de Dominguetti foi incluído em comunicações com o governo brasileiro sobre oferta de vacinas da AstraZeneca apresentada pela companhia. O nome de Dominguetti foi incluído "a pedido", de acordo com Cárdenas, sem explicar quem teria feito a solicitação.

"Incluímos o nome do Sr. Dominguetti no FCO (oferta) que apresentamos ao governo brasileiro porque nos pediram e presumimos que ele fosse representante deles", afirmou Cárdenas, por e-mail.

"A história tem focinho de estelionato, rabo de estelionato, pé de estelionato. Será que é estelionato? Vamos descobrir, mas chama atenção a repetição do procedimento do governo cheio de amadorismo, privilégio às relações de amizade e aos velhos esquemas. Manter o foco é essencial", afirmou Alessandro Vieira (Cidadania-SE), suplente na CPI.
Publicidade
'Melhorar o valor'

Dominguetti relatou na CPI que foi pressionado a "melhorar esse valor, para cima" durante a negociação para venda de vacinas contra a covid-19 ao Ministério da Saúde. Ele reafirmou nesta quinta-feira ter recebido um pedido de propina de US$ 1 dólar por dose do ex-diretor de Logística em Saúde do ministério Roberto Ferreira Dias, exonerado ontem do cargo. De acordo com ele, o pedido de propina foi feito apenas por Dias durante as negociações, em um jantar no dia 25 de janeiro. O vendedor negou que outra pessoa do Ministério da Saúde ou do governo tenha feito uma solicitação parecida.

Dominguetti tentou vender 400 milhões de doses da AstraZeneca a US$ 3,50 por unidade ao governo brasileiro. De acordo com ele, o então diretor do ministério afirmou que "a vacina, naquele valor, não seria feita pelo ministério, temos que melhorar esse valor". "É para cima, é para mais, aí se pediu que tem que se comprar dentro do ministério e se pediu esse acréscimo de 1 dólar por dose. Eu já, de imediato, eu já disse que não tinha como fazer", afirmou no depoimento à CPI.

'Militar infiltrado'

"Dominguetti é militar infiltrado que apresentou um áudio de 2020 para implicar Luis Miranda e seu irmão. Todos devem ser rigorosamente investigados. Dominguetti precisa sair preso da CPI por sabotar as investigações. Isso é um escândalo e tem a digital do Planalto". A frase é do deputado federal Ivan Valente (PSOL-SP), em publicação no Twitter, sobre o áudio veiculado pelo policial militar Luiz Paulo Dominguetti Pereira durante seu depoimento na CPI.
*Com informações do Estadão Conteúdo
Leia mais