Lideranças dos garimpeiros teriam acionado a Polícia Federal na manhã do dia 8Polícia Federal - Ascom/MS
Publicado 15/08/2022 18:37
Quatro garimpeiros brasileiros e um venezuelano foram executados a tiros em um garimpo ilegal na fronteira da Venezuela com o Brasil, segundo a Polícia Civil de Roraima. Os corpos foram retirados do local por um helicóptero ligado ao garimpo e levados para o território brasileiro antes da chegada das autoridades policiais venezuelanas.
Os cadáveres foram deixados próximo a uma rodovia vicinal, na vila de Campos Novos, no município Iracema, a cerca de 100 quilômetros da capital, Boa Vista. A Polícia Civil confirmou que o Instituto Médico Legal (IML) fez a perícia e identificou as vítimas na sexta-feira, 12.
O coordenador de articulação política de um movimento de garimpeiros, Jailson Mesquita, disse ter procurado a Polícia Federal (PF) na manhã de segunda-feira, 8, para relatar o assassinato dos cinco garimpeiros enquanto dormiam, na madrugada do domingo, 7, em uma região remota de garimpo do Cerro Delgado Chalbaud, na Venezuela, na fronteira com Roraima. Ele disse que havia procurado as autoridades para a remoção dos corpos, mas os próprios garimpeiros se anteciparam e fizeram o traslado de helicóptero.
Os cadáveres estavam enrolados em lonas e presos em uma rede. Informada sobre os corpos, a polícia de Iracema providenciou o traslado para o IML de Boa Vista. Foram identificados os corpos dos brasileiros Francisco Pereira, de 42 anos, Raimundo Charles da Conceição Pereira, de 40, Dilviane Nunes da Silva, de 35, e João Barbosa da Silva, de 57 anos. Raimundo e Francisco eram irmãos e Dilviane seria a cozinheira do garimpo. Também foi identificado entre as vítimas o venezuelano Oswaldo José Figuera Suarez, de 31 anos.
O laudo pericial apontou como causa das mortes projéteis disparados por armas de fogo. Os corpos foram liberados para sepultamento. A família do venezuelano providenciou o traslado do corpo de Suarez para ser sepultado no país vizinho. Na terça-feira, 9, quando membros do Ministério Público da Venezuela se deslocaram para a região, os corpos já tinham sido removidos para o Brasil.
Conforme a Polícia Civil de Roraima, as causas da chacina serão investigadas pela polícia venezuelana. "A responsabilidade quanto à investigação é da polícia do país vizinho, com a qual haverá colaboração", disse, em nota. Garimpeiros brasileiros divulgaram em redes sociais que os colegas teriam sido mortos pela Guarda Nacional da Venezuela, o que foi desmentido por outros garimpeiros. A ação criminosa teria como objetivo o roubo das máquinas brasileiras usadas no garimpo.
O Ministério do Interior, Justiça e Paz da Venezuela anunciou a abertura de uma investigação sobre as mortes em Cerro Delgado Chalbaud, que fica na margem do Rio Orinoco, região também conhecida como Parima B. Segundo o órgão, a equipe que se deslocou de avião de Caracas para Puerto Ayacucho e seguiu até a área de conflito já produziu um relatório com laudos da vistoria e depoimentos de testemunhas.
Como no lado brasileiro, o garimpo ilegal na fronteira da Venezuela acontece também em terras indígenas. Conforme a União Sindical dos Garimpeiros da Amazônia Legal (Usagal), cerca de 5 mil garimpeiros exploram ouro no lado venezuelano da fronteira, entre eles de 500 a mil brasileiros que passaram a trabalhar no país vizinho devido às operações contra o garimpo ilegal em terras indígenas de Roraima. Muitos deles, no entanto, mantêm as atividades nos dois lados da região fronteiriça.
Entidades que atuam na região amazônica relatam grande aumento da exploração mineral em terras indígenas nos últimos anos. No lado brasileiro, os garimpos ilegais avançaram em territórios Yanomami, em Roraima, Munduruku, no Pará, e no Vale do Javari, no Amazonas.
Além da poluição das águas com o mercúrio, os garimpeiros destroem florestas nativas e levam doenças às populações tradicionais, como a malária e o novo coronavírus. O garimpo clandestino acontece ao longo de toda a fronteira norte do Brasil, desde a Colômbia até a Guiana Francesa.
Um estudo do Insituto Igarapé, com base em mais de 300 operações da Polícia Federal na região entre 2016 e 2018, mostrou que os crimes ambientais na Amazônia, como desmatamento, invasão de terras públicas e garimpo ilegal, estão conectados com outros crimes como corrupção, falsificação de documentos, tráfico de drogas e violência direta contra pessoas, como trabalho em regime de escravidão e homicídios.
O estudo mostrou que essa criminalidade se ramifica por outros estados e ultrapassa fronteiras. Apontou ainda que a maior parte dos crimes ambientais e seus derivados acontecem em terras indígenas.
Sobre a morte dos garimpeiros, a reportagem entrou em contato com o Ministério das Relações Exteriores e a Polícia Federal, superintendência de Roraima, mas ainda não houve retorno.
Leia mais