Publicado 22/06/2023 21:25
Brasília - Condenado a nove anos e quatro meses de prisão por planejar um atentado com bomba próximo ao Aeroporto de Brasília, no final de dezembro de 2022, George Washington de Oliveira Sousa se recusou a responder todas as perguntas relacionadas ao crime que cometeu. Ele negou, no entanto, envolvimento com os atos golpistas do início deste ano, tema da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do 8 de Janeiro, em que ele participou nesta quinta-feira, 22.
"Permanecerei calado", repetiu por diversas vezes, com um papel em mãos com instruções de como se portar em determinadas situações do depoimento. Ele, que estava acompanhado da advogada, não quis dizer onde comprou os explosivos, quem bancou sua viagem a Brasília ou se teve ajuda de outras pessoas para montar uma bomba.
George Washington afirmou que o ato pelo qual foi condenado não tem relação com os ataques a prédios públicos em 8 de janeiro. "Eu já fui condenado, estou preso. E meu caso não tem nada a ver com o caso do dia 8, que corresponde a essa CPMI", disse ele.
Durante a sessão, ele preferiu não responder às perguntas da relatora da CPMI, senadora Eliziane Gama (PSD-MA). Ele chegou sem algemas e acompanhado de uma advogada.
"Vale matar por uma causa política?", cobrou o deputado Pastor Henrique Vieira (PSOL-RJ). "Nada a declarar, senhor", respondeu o depoente. "Quem é Jair Bolsonaro para você?", insistiu o parlamentar. "Nada a declarar."
Das poucas vezes em que resolveu falar, George Washington preferiu se defender e alegou que havia "infiltrados" entre os acampados no Quartel-General do Exército. "Eram muitos infiltrados. Quando eram descobertos, saíam e depois apareciam outros", afirmou. Ele também alegou que o próprio Exército identificava os infiltrados.
A Polícia Federal apontou que os extremistas que depredaram o Supremo Tribunal Federal (STF), o Palácio do Planalto e o Congresso Nacional no 8 de janeiro partiram do QG.
Um pedido de habeas corpus foi protocolado por George Washington no STF nesta quarta-feira, 21. Até então, o relator, ministro Luiz Fux, não proferiu uma decisão.
George Washington também afirmou que o depoimento dado à polícia ainda no dia 24 de dezembro foi feito sob coação. A declaração provocou reação de integrantes da CPMI. Eliziane considerou que a denúncia "não tem fundamentação". "Ao longo de todo o processo, ele em nenhum momento fez essa denúncia. Não se sustenta", disse.
Além dele, a comissão ouviu Valdir Pires Dantas Filho e Renato Martins Carrijo, peritos autores do laudo da Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF), e o delegado da PCDF Leonardo de Castro
O perito Carrijo contou que foram usados dispositivos explosivos destinados à destruição de rochas em pedreiras. Ele explicou que o material parecia "degradado" e o detonador improvisado com itens que podem ter sido comprados pela internet.
George Washington atuou ao lado de Alan Diego dos Santos Rodrigues - condenado a cinco anos e quatro meses de prisão - para colocar uma bomba no eixo traseiro de um caminhão-tanque estacionado no Aeroporto de Brasília, que estava carregado de combustível de aviação. Antes de que o artefato fosse detonado, o motorista do caminhão percebeu a presença do explosivo, o retirou e acionou a polícia.
Segundo o delegado da PCDF, ele e Alan participaram da tentativa de invasão da sede da Polícia Federal, no dia 12 de dezembro, semanas antes do planejamento do atentado.
O artefato explosivo foi encontrado à margem da pista, no gramado de um canteiro central, na Estrada Parque Aeroporto. Imagens de circuito externo de câmeras apresentadas à CPMI exibem um veículo parando na rodovia e depositando o material na madrugada.
Carrijo estava de plantão no dia da operação e pediu para que Valdir Pires, de folga no dia, atuasse em parceria para apurar a possível existência de outros explosivos no entorno. A operação policial ainda encontrou cinco outros materiais explosivos dentro do carro de George Washington sem um dispositivo próprio para explosão. A investigação também localizou um arsenal "com um grande poder de fogo", segundo o delegado da PCDF, na casa.
Ainda de acordo com os peritos, três hipóteses foram especuladas caso o dispositivo explodisse: o não rompimento do caso do combustível - o mais improvável -, um incêndio causado pelo rompimento do casco ou, num cenário mais extremo, uma explosão que poderia lançar objetos a centenas de metros, com potencial de causar mortes.
Apoiador do ex-presidente Jair Bolsonaro, George Washington era um gerente de postos de combustíveis e confessou em depoimento à PCDF que planejou o atentado com bomba para chamar a atenção para o seu grupo. Ele fez parte do grupo de bolsonaristas que acamparam no QG do Exército e foi preso ainda nos últimos dias do ano passado.
Na fase da investigação policial, ele confessou que queria atingir um poste duplo de uma subestação de energia em Taguatinga, região administrativa do Distrito Federal, para provocar falta de energia e dar "início ao caos que levaria a decretação de estado de sítio".
Houve tumulto antes mesmo da fala de George Washington. Duarte (PSB-MA) reclamou do depoimento de Silvinei Vasques, ex-diretor da Polícia Rodoviária Federal (PRF), alegando que ele mentiu e deveria ser preso.
O presidente da CPMI, Arthur Maia (União Brasil-BA) interrompeu o pronunciamento e falou que não admitiria discurso político em questões de ordem. Maia adicionou que não irá prender depoentes. "Essa presidência não será palco de circo em momento nenhum enquanto eu estiver presidente. Eu não vou prender ninguém para chamar a atenção da mídia", disse.
Na CPMI, petistas lembraram de Wellington Macedo de Souza, outro suspeito de participar do plano. Ele foi assessor da Diretoria de Promoção e Fortalecimento dos Direitos da Criança e do Adolescente da Secretaria Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos do governo Bolsonaro, então chefiado por Damares Alves (Republicanos-DF), agora senadora e participante do colegiado.
Um vídeo fazendo a associação de Wellington a Damares foi apresentado pelo deputado Rogério Correia (PT-MG) na CPMI. Outros parlamentares jogaram o conteúdo nas redes. "Wellington nunca foi meu assessor. Vamos acabar já com essa narrativa. Ele trabalhou em uma secretaria ligada ao ministério", disse Damares
Wellington foi denunciado pelo Ministério Público por envolvimento no planejamento do atentado. Ele não prestou depoimento, está foragido desde o dia da tentativa e rompeu a tornozeleira eletrônica que usava.
A confusão continuou depois da chegada de George Washington. O senador Jorge Seif (PL-SC) interrompeu a fala de Correia, que pediu para que ele calasse a boca. "Cala a boca é o c…", rebateu Seif.
Conselho de Ética
O deputado Abilio Brunini (PL-MT) interrompeu a fala de Correia. Maia ameaçou apresentar representação contra Abilio no Conselho de Ética caso as sucessivas intervenções em cima das falas de parlamentares continuassem.
"Eu não vou permitir que Vossa Excelência fique tumultuando esse trabalho aqui na CPMI. Se Vossa Excelência insistir com esse papel, vou fazer uma representação desta presidência contra Vossa Excelência no Conselho de Ética", disse Maia, com o dedo em riste. Abilio é uma presença constante na comissão mesmo não sendo membro.
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