Publicado 22/08/2023 15:30
Brasília - A Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) dos Atos Golpistas de 8 de Janeiro chegou a um impasse nesta terça-feira, 22, que levou ao cancelamento da sessão que iria deliberar sobre a aprovação de novos requerimentos.
A discussão foi inviabilizada porque governistas e oposicionistas se recusaram a fazer acordos sobre a pauta a ser votada. De um lado, a base do governo cobra a aprovação de quebras de sigilo de aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). No outro flanco, a oposição acusa os governistas de obstruírem as suas pautas e cobram que sejam votados temas que desgastem o Planalto.
"Não tem acordo. Não tem jeito. Vai ser feita uma pauta e vai votar do jeito que ele (Maia) colocar", resumiu o deputado Rogério Correia (PT). "Eles (bolsonaristas) não querem investigação. Eles querem fazer apenas a narrativa deles de que isso (8 de Janeiro) foi culpa do G.Dias a mando do presidente do Lula para fazer baderna em Brasília", completou o petista.
A sessão desta terça-feira foi adiada inicialmente por duas horas. Durante a manhã, a relatora Eliziane Gama (PSD-MA) se reuniu com integrantes do colegiado para costurar os acordos que poderiam viabilizar a aprovação dos requerimentos apresentados por ela. As negociações, contudo, terminaram sem um entendimento entre a base governista e a oposição. A reunião deliberativa estava prevista para começar às 11h, mas acabou adiada para as 14h. Antes de esgotar o prazo, os parlamentares se reuniram às 12h com Maia, porém, mais uma vez, não houve recuo de nenhum dos lados.
Eliziane preparou para a sessão desta terça-feira uma lista de quatro requerimentos prioritários para serem aprovados. Os pedidos incluem a quebra do sigilo telefônico do presidente do PL, Valdemar Costa Neto, e do ex-ministro da Defesa Paulo Sérgio Nogueira; a produção de relatórios de inteligência financeira (RIFs) da deputada federal Carla Zambelli (PL-SP) e do general Mauro Lourena Cid, assim como a quebra do sigilo bancário do militares e do sigilo telefônico da parlamentar.
Os pedidos de quebra de sigilo apresentados pela relatora estão amparados em depoimentos recentes prestados à CPMI, como o do hacker Walter Delgatti Netto, que acusou Bolsonaro de oferecer indulto a ele em troca de invadir o sistema das urnas eletrônicas. De acordo com a declaração de Delgatti, os participantes da trama golpista eram justamente Zambelli, Valdemar e Nogueira, além do ex-presidente.
A quebra do sigilo bancário do general Cid, que é pai do ex-ajudante de ordens da Presidência Mauro Cid, figura numa outra frente de investigação que apura se o esquema de desvios de presentes do acervo pessoal da Presidência foi usado para financiar os atos golpistas de 8 de Janeiro e a estadia de Bolsonaro nos Estados Unidos.
As quebras de sigilo são tidas como peças fundamentais para basear as próximas convocações da CPMI. Os eventos recentes envolvendo Bolsonaro fizeram com que os integrantes do colegiado passassem a discutir de forma mais ativa a viabilidade de sua convocação. Para isso, no entanto, há a compreensão de que é preciso fechar o cerco contra aliados do ex-presidente e obter mais informações financeiras para confrontá-lo com dados.
Na pauta prévia a ser discutida pelos parlamentares nesta terça-feira constavam requerimentos de solicitação de relatórios de movimentação financeira de Bolsonaro e da ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro, o que impulsionou ainda mais a revolta da oposição. A base governista na CPMI quer aproveitar o cerco a Bolsonaro para obter informações sobre a sua movimentação financeira nos últimos anos.
A tropa de choque bolsonarista trucou e disse aceitar a produção dos relatórios pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF), desde que sejam aprovadas outros pedidos de informação que, segundo eles, também não têm relação com o objeto da CPMI, como a quebra de sigilo da primeira-dama Janja. As medidas são consideradas impensáveis para ambos os lados, o que travou a pauta da comissão.
Cabe ao presidente da CPMI definir o que será votado em cada sessão deliberativa. O governo tem maioria para aprovar os requerimentos que desejar, mas Maia tem feito costuras para não deixar os bolsonaristas completamente desprestigiados. "Eles (oposição) não têm força para travar a pauta. Eles só travam a pauta se tiver o apoio do presidente", disse Rogério Correia.
Em outros momentos de crise na comissão, o presidente prometeu pautar diversas vezes os requerimentos da oposição que foram rejeitados em bloco pelo governo. Diante do avanço das investigações contra Bolsonaro, os dois blocos não estão mais dispostos a ceder. Sem a possibilidade de acordo, caberá a Maia acomodar na pauta os interesses de cada lado.
Os oposicionistas têm acusado Eliziane de obstruir as suas demandas. Outra queixa recorrente é de que o colegiado se desviou do objetivo inicial ao se debruçar sobre o esquema de desvios de joias por Bolsonaro e seus aliados. Parte das revelações sobre este caso surgiram como desdobramento de quebras de sigilo aprovadas pela comissão. "A CPMI está indo por um caminho que está se distanciando do objetivo dela", disse o senador Marco Rogério (PL-RO).
Para fechar o acordo nesta terça-feira, a oposição cobrava a aprovação das quebras de sigilo telefônico e telemático do comandante da Força Nacional e do hacker Walter Delgatti Netto, no período de 2019 a 2023. O pedido não era visto por governistas como impraticável, mas o que o inviabilizava era a demanda dos bolsonaristas para evitar novas investidas contra os aliados de Bolsonaro.
Os parlamentares terão agora uma semana para refazer as suas estratégias e convencer Maia a pautar os requerimentos de interesse de cada lado. A próxima sessão da CPMI está marcada para quinta-feira, 24, quando será ouvido o sargento Luis Marcos dos Reis, que é investigado por pagar as contas de Michelle Bolsonaro com uso de dinheiro vivo. Na terça-feira, 29, os colegiado volta a discutir em sessão deliberativa depois de ouvir o ex-comandante da Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF) Fábio Augusto. Por fim, na quinta-feira da semana que vem será a vez do ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) Gonçalves Dias prestar seu depoimento.
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