A responsabilidade pelos pagamentos de pensões por invalidez ou por morte em casos de acidente de trânsito segue sendo do Instituto Nacional do Seguro SocialMarcello Casal Jr / Agência Brasil
Publicado 09/11/2023 17:52
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Brasília - Vídeo engana ao afirmar que foram feitas mudanças na lei que dispõe sobre o pagamento de pensões por invalidez ou morte em casos de acidente de trânsito. Segundo a publicação, o repasse dos valores passaria a ser de responsabilidade do motorista causador do acidente. Consultados pelo Comprova, advogados explicam que os pagamentos seguem sendo feitos pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e destacam que não ocorreram alterações recentes na lei. O INSS, conforme já previsto em legislação, pode, porém, processar o motorista, quando comprovada a culpa, em uma ação para ressarcimento dos valores pagos às vítimas.
Conteúdo investigado: Vídeo mostra um suposto integrante da Polícia Rodoviária Federal (PRF) falando para algumas pessoas, que estão sentadas ao seu redor. Um homem faz uma narração por cima das imagens e afirma que uma mudança na lei passa a responsabilizar o motorista, em caso de acidente de trânsito, pelo pagamento de pensão à vítima. Segundo o narrador, antes, o governo era responsável por essa indenização. O discurso do suposto agente da PRF vai ao encontro do que diz o narrador.

Onde foi publicado: Kwai e WhatsApp.

Conclusão do Comprova: Vídeo que circula nas redes sociais engana ao afirmar que "nova lei" obriga o motorista ou o dono do carro causador de acidentes de trânsito a pagar pensões por invalidez às vítimas.

A responsabilidade pelos pagamentos de pensões por invalidez ou por morte em casos de acidente de trânsito segue sendo do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). O que ocorre é que o órgão pode entrar com uma ação contra o motorista, caso fique comprovada sua culpa, para o ressarcimento dos cofres públicos com o pagamento dos benefícios às vítimas. Nem o motorista nem o dono do veículo fazem pagamentos de pensões previdenciárias diretamente às vítimas.

Além disso, há uma diferença entre o pagamento de benefícios previdenciários e processos por responsabilidade civil. Vítimas de acidentes podem processar os causadores dos acidentes na esfera civil, em busca de indenizações.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. No Kwai, até 8 de novembro de 2023, o vídeo teve mais de 45 mil visualizações, 2 mil likes, 164 comentários e 1.6 mil compartilhamentos. Não é possível saber o alcance da publicação no WhatsApp.

Como verificamos: O Comprova entrevistou dois advogados trabalhistas e os questionou sobre as informações apresentadas no vídeo, e então verificou a legislação a respeito deste tipo de situação. Também entrou em contato com a PRF e o INSS, além do autor do conteúdo.

Responsabilidade pelo pagamento de pensões e auxílios segue sendo do INSS
"O que ocorre no vídeo, me parece, é uma confusão entre o benefício previdenciário, que permanece sob a obrigação do INSS, e a ação que o INSS pode tomar contra o motorista que causou esse acidente, então comprovada a culpa", explica Lucas Vieira Negrão, advogado especialista em direito previdenciário e do trabalho, do escritório Miguel Neto Advogados Associados.

Conforme previsto na Lei nº 8.213/1991, o INSS é responsável pelo pagamento de seus assegurados, inclusive em caso de acidente de trânsito, em casos de invalidez ou morte. Quando um contribuinte do INSS é vítima de um acidente de trânsito que o deixe inválido, o instituto previdenciário arca com o auxílio-acidente ou a aposentadoria por invalidez. Em casos de morte do assegurado, o INSS passa a pagar a pensão por morte à família.

"Essa mesma sistemática permanece, não houve nenhuma alteração legal", assegura Negrão. "O que há é que o motorista culpado pode sofrer um processo de ação regressiva pelo INSS, para ressarcir aos cofres públicos as despesas do instituto com o pagamento desses benefícios. Isso já é algo que está previsto em lei, não é algo novo."

Ainda assim, segundo o advogado, na maioria dos casos, não ocorrem processos por ações regressivas. "Apesar do INSS ter essa possibilidade, não é algo que ele está tomando muito comumente, até pelo alto volume de acidentes. É algo que está começando a engrenar agora", diz Negrão.

Responsabilidade civil em casos de acidentes
Além da possibilidade de ações de ressarcimento movidas pelo INSS, existe a responsabilidade civil da pessoa que causa um acidente. O Código Civil (CC), de 2002, no artigo 927, prevê que "aquele que, por ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo". "Existe a possibilidade da vítima ou dos familiares da vítima pedirem na esfera civil uma pensão vitalícia em razão do acidente verificado, se for comprovada culpa ou dolo", esclarece Lucas Sampaio Santos, do escritório Abe Advogados. O pagamento de uma indenização na esfera civil não impede que a vítima tenha direito aos benefícios previdenciários.

A indenização civil está prevista no artigo 950 do CC. O referido trecho afirma que, "se da ofensa resultar defeito pelo qual o ofendido não possa exercer o seu ofício ou profissão, ou se lhe diminua a capacidade de trabalho, a indenização, além das despesas do tratamento e lucros cessantes até ao fim da convalescença, incluirá pensão correspondente à importância do trabalho para que se inabilitou, ou da depreciação que ele sofreu".

"Esse direito sempre existiu. Se um caminhoneiro atropela meu filho e deixa ele paraplégico, eu tenho todo o direito de pedir que ele pague essa indenização na esfera civil. Não há nada que tenha mudado. Esse temor deveria ser anterior a qualquer tipo de situação, a responsabilidade civil sempre existiu", afirma Santos.

O que diz a PRF
Por e-mail, a PRF afirmou que realizou consulta junto às assessorias regionais de comunicação do órgão, mas não conseguiu identificar o local, a data e o contexto em que foi gravado o vídeo. A entidade disse ainda que não tem registro de ações em que os agentes da PRF orientem condutores sobre a possibilidade de pagamento de aposentadorias em casos de acidente de trânsito. O órgão não confirmou se a pessoa no vídeo se trata de fato de um agente da Polícia Rodoviária Federal.

O que diz o INSS
Em resposta ao Comprova, o INSS disse que "o governo federal continua sendo o responsável por pagar todos os benefícios da Previdência Social, por meio do INSS". E reforçou que o órgão pode pedir ressarcimento ao motorista causador do acidente que provocou a morte ou a invalidez de outra pessoa.

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova buscou contato com a pessoa responsável pela publicação através de mensagem direta via Facebook, mas não obteve resposta até a publicação desta verificação.

O que podemos aprender com esta verificação: O vídeo dá a entender que houve a criação de uma nova lei, que poderia prejudicar motoristas, mas não houve mudanças recentes na lei. Misturar fatos verídicos e informações inventadas é uma prática comum de perfis que costumam disseminar desinformação. Nessas publicações, também é comum que sejam citados altos valores, associados a supostas políticas do governo que prejudicam a população. Ao se deparar com conteúdos deste tipo, consulte os órgãos oficiais e veículos de imprensa de sua confiança.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O Estadão Verifica também realizou checagem sobre o mesmo vídeo investigado aqui. O Comprova já verificou outros conteúdos relativos a pagamentos de pensões e auxílios pelo INSS. Já mostramos que o auxílio-reclusão é garantido por lei desde 1960 e seu valor é equiparado ao salário mínimo e que é enganoso que Paulo Guedes anunciou redução em aposentadorias e outros benefícios do INSS.
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