Anielle Franco afirma que assédios de Silvio Almeida iniciaram em 2022Wilson Dias/Joédson Alves / Agência Brasil
Publicado 04/10/2024 18:06
Rio - Pela primeira vez, a ministra da Igualdade Racial Anielle Franco falou sobre seus sentimentos acerca do assédio que sofreu do ex-ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania Silvio Almeida. Por quase dois anos, comentários sexistas evoluíram para convites impertinentes e toques indesejados quando os dois se encontravam. 
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Em entrevista à revista Veja, publicada nesta sexta-feira (4), Anielle descreve como se sentiu e explicou o motivo de não ter denunciado os assédios antes. "É muito difícil falar sobre isso… Ninguém se sente à vontade pra relatar uma violência. E, nesse caso, a gente está falando de um conjunto de atos inadequados e violentos que aconteceram sem consentimento e reciprocidade e que, infelizmente, mulheres do mundo inteiro vivenciam diariamente. Mas é importante deixar claro que o que houve foi um crime de importunação sexual. Fui vítima de importunação sexual".
"Fico me perguntando o tempo todo por que não reagi na hora, por que não denunciei imediatamente, por que fiquei paralisada. Me culpei muito pela falta de reação imediata, e essas dúvidas ficaram me assombrando. Me lembrava de todas as mulheres que já tinha acolhido em situação de violência. Mas o fato é que não estamos preparadas o suficiente para enfrentar uma situação assim nem quando é com a gente. Eu me senti vulnerável", afirmou.
Assédio iniciou durante transição de governo
Anielle relatou que não havia encontrado Silvio Almeida pessoalmente até 2022, quando os dois foram nomeados ministros do governo Lula. Até o momento, ela conhecia apenas a trajetória acadêmica do advogado e professor. 
Segundo a ministra, as "atitudes inconvenientes" começaram em dezembro de 2022. Ao longo dos meses as investidas por parte de Almeida foram aumentando até chegar à importunação sexual. "Por um tempo, quis acreditar que estava enganada, que não era real, até entender e cair a ficha sobre o que estava acontecendo. Fiquei sem dormir várias noites", contou.
"Ninguém se sente à vontade ficando em silêncio em uma situação assim. Mas eu não queria a minha vida exposta e atravessada mais uma vez pela violência. Sou muito mais do que isso e me orgulho da minha trajetória. Só queria que aquilo parasse de acontecer", afirmou.
'Vítimas têm de falar na hora em que elas se sentirem confortáveis'
Quando o caso veio à tona, Anielle contou que se sentiu mais vulnerável ainda. Com toda a repercussão, a ministra defendeu que ela, enquanto vítima, iria falar sobre os acontecimentos apenas quando se sentisse confortável.
"Sei que vivemos nesse mundo de internet, em que tudo é muito rápido e todo mundo quer saber de tudo, mas nenhuma vítima, de qualquer tipo de violência que seja, tem a obrigação de se expor, falar quando as pessoas querem que ela fale. As vítimas têm de falar na hora em que elas se sentirem confortáveis. Vou repetir isso quantas vezes for necessário: vítima é vítima. Você fala quando se sente apta e acolhida a falar", afirmou.
Embora já consiga falar abertamente sobre o caso, Anielle ainda não se sente totalmente confortável e prefere manter os detalhes para si: "Apesar da dor, da violência e da decepção, falei todo o necessário nas instâncias devidas, conforme me comprometi a fazer. Publicamente não quero entrar em detalhes, para preservar as investigações em curso e também porque não quero repetir, repetir e repetir a violência. Traumas não são entretenimento".
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