Publicado 08/10/2024 14:17
Brasília - Post nas redes sociais menciona que o presidente da Rússia, Vladimir Putin, que virá ao Brasil em novembro para reunião do G20, teria que ser preso ao pisar no território brasileiro pois, caso contrário, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) estaria desrespeitando a Constituição. O assunto é complexo, mas, de qualquer forma, a eventual prisão de uma autoridade na situação de Putin não seria de responsabilidade do presidente da República.
PublicidadeConteúdo analisado: Publicação afirma que Lula planeja trazer Vladimir Putin para reunião do G20 em novembro. "Urgente: Lula planeja trazer Putin ao Brasil em novembro para reunião do G20! Devido às sanções, Putin teria que ser preso ao pisar no território brasileiro. Se Lula não fizer isso, ele irá desrespeitar constituição brasileira e colocar o Brasil em uma crise". O post é acompanhado de trecho de uma análise do jornalista Lourival Sant’Ana na CNN.
Onde foi publicado: X.
Contextualizando: Vladimir Putin, presidente da Rússia, deve ser convidado a vir para o Brasil para participar da reunião da cúpula do G20, um encontro anual entre chefes de Estado e de Governo dos países membros do grupo, que tem como objetivo aprovar acordos e discutir caminhos para lidar com desafios globais.
A vinda de Putin, no entanto, não seria uma visita normal. Em março de 2023, o Tribunal Penal Internacional (TPI) emitiu um mandado de prisão para o presidente russo, devido a alegações de crimes de guerra relacionados à deportação de crianças ucranianas durante o conflito da Rússia com a Ucrânia.
Como o Brasil ratificou os termos do acordo internacional que criou o Estatuto de Roma, tratado que criou o Tribunal Penal Internacional, o país tem a obrigação de cooperar com o TPI, inclusive no cumprimento de mandados de prisão.
Questionada sobre a possibilidade de Lula "prender" o presidente russo, a Assessoria Especial do Presidente da República disse que o mandatário brasileiro já tratou do tema publicamente, como durante uma visita à Alemanha em dezembro do ano passado, e explicou que "não é competência dele decidir pela prisão", sendo a definição de responsabilidade da Justiça.
Ao Comprova, a presidente da Comissão de Relações Internacionais da seccional do Distrito Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/DF), Clarita Maia, explicou que Putin poderia sim ser preso no Brasil, mas que há uma série de fatores a influenciar na execução dessa prisão.
Entre eles estão a imunidade diplomática, já que chefes de Estado geralmente gozam de imunidades sob o direito internacional consuetudinário, o que pode criar um conflito jurídico; e de considerações diplomáticas e políticas, que permite que o Brasil possa decidir não prender o presidente russo por razões políticas ou diplomáticas, para evitar tensões internacionais.
Além disso, Maia acrescentou que a ordem de prisão poderia ser cumprida especificamente através do Poder Judiciário, com autorização de um juiz federal ou outro órgão competente, ou pela Polícia Federal.
"As autoridades diplomáticas brasileiras também poderiam se envolver, dependendo de como a prisão se desenrolasse, já que envolvem a presença de um chefe de Estado estrangeiro", acrescentou a advogada.
A eventual prisão também dependeria de uma série de fatores, como uma notificação por parte do TPI, coordenação entre o Ministério da Justiça (MJ), Polícia Federal (PF) e outras autoridades responsáveis pela prisão, e ainda a logística de detenção e transporte, já que Putin teria que ser levado sob custódia até Haia, na Holanda, onde o TPI está sediado.
"Isso envolveria coordenação internacional, possivelmente com o uso de aviões sob escolta militar ou policial", acrescenta Maia.
A reportagem também entrou em contato com o jornalista Lourival Sant’Anna para saber se a fala utilizada pela postagem estava completa ou se foi manipulada. O jornalista confirmou que, apesar da publicação utilizar apenas um recorte, o trecho da fala está na íntegra e que a análise está completa no Youtube.
Consequências
Onde foi publicado: X.
Contextualizando: Vladimir Putin, presidente da Rússia, deve ser convidado a vir para o Brasil para participar da reunião da cúpula do G20, um encontro anual entre chefes de Estado e de Governo dos países membros do grupo, que tem como objetivo aprovar acordos e discutir caminhos para lidar com desafios globais.
A vinda de Putin, no entanto, não seria uma visita normal. Em março de 2023, o Tribunal Penal Internacional (TPI) emitiu um mandado de prisão para o presidente russo, devido a alegações de crimes de guerra relacionados à deportação de crianças ucranianas durante o conflito da Rússia com a Ucrânia.
Como o Brasil ratificou os termos do acordo internacional que criou o Estatuto de Roma, tratado que criou o Tribunal Penal Internacional, o país tem a obrigação de cooperar com o TPI, inclusive no cumprimento de mandados de prisão.
Questionada sobre a possibilidade de Lula "prender" o presidente russo, a Assessoria Especial do Presidente da República disse que o mandatário brasileiro já tratou do tema publicamente, como durante uma visita à Alemanha em dezembro do ano passado, e explicou que "não é competência dele decidir pela prisão", sendo a definição de responsabilidade da Justiça.
Ao Comprova, a presidente da Comissão de Relações Internacionais da seccional do Distrito Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/DF), Clarita Maia, explicou que Putin poderia sim ser preso no Brasil, mas que há uma série de fatores a influenciar na execução dessa prisão.
Entre eles estão a imunidade diplomática, já que chefes de Estado geralmente gozam de imunidades sob o direito internacional consuetudinário, o que pode criar um conflito jurídico; e de considerações diplomáticas e políticas, que permite que o Brasil possa decidir não prender o presidente russo por razões políticas ou diplomáticas, para evitar tensões internacionais.
Além disso, Maia acrescentou que a ordem de prisão poderia ser cumprida especificamente através do Poder Judiciário, com autorização de um juiz federal ou outro órgão competente, ou pela Polícia Federal.
"As autoridades diplomáticas brasileiras também poderiam se envolver, dependendo de como a prisão se desenrolasse, já que envolvem a presença de um chefe de Estado estrangeiro", acrescentou a advogada.
A eventual prisão também dependeria de uma série de fatores, como uma notificação por parte do TPI, coordenação entre o Ministério da Justiça (MJ), Polícia Federal (PF) e outras autoridades responsáveis pela prisão, e ainda a logística de detenção e transporte, já que Putin teria que ser levado sob custódia até Haia, na Holanda, onde o TPI está sediado.
"Isso envolveria coordenação internacional, possivelmente com o uso de aviões sob escolta militar ou policial", acrescenta Maia.
A reportagem também entrou em contato com o jornalista Lourival Sant’Anna para saber se a fala utilizada pela postagem estava completa ou se foi manipulada. O jornalista confirmou que, apesar da publicação utilizar apenas um recorte, o trecho da fala está na íntegra e que a análise está completa no Youtube.
Consequências
Caso Putin decida vir ao Brasil e o país não realize a prisão, haveria consequências políticas, como explica Alexandre Coelho, professor de Relações Internacionais na Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESP-SP) e doutor em Relações Internacionais pelo Instituto de Relações Internacionais da Universidade de São Paulo (IRI-USP).
"O país poderá enfrentar consequências diplomáticas e jurídicas, como a perda de credibilidade no cenário internacional e possíveis sanções políticas", afirma. "Além disso, o Brasil poderia ser acusado de violar suas obrigações internacionais perante o TPI, comprometendo sua reputação como defensor dos direitos humanos e do Estado de Direito", explica.
Por outro lado, a prisão também teria consequências. "A relação entre o Brasil e a Rússia, membros dos BRICS, é estratégica. A prisão de Putin poderia comprometer alianças políticas, econômicas e comerciais dentro desse grupo, minando a cooperação multilateral", afirma.
"Além disso, a Rússia, como uma grande potência nuclear e um dos atores principais no cenário internacional, possui considerável influência. O Brasil, ao optar por cumprir o mandado do TPI, arriscaria alienar outros países que também questionam a legitimidade do tratado, como China e Índia", pontuou Coelho.
"Politicamente, o presidente brasileiro enfrentaria um dilema entre respeitar suas obrigações internacionais e manter uma política externa equilibrada, que historicamente busca evitar antagonismos desnecessários com grandes potências", acrescentou.
Lula e Putin
"O país poderá enfrentar consequências diplomáticas e jurídicas, como a perda de credibilidade no cenário internacional e possíveis sanções políticas", afirma. "Além disso, o Brasil poderia ser acusado de violar suas obrigações internacionais perante o TPI, comprometendo sua reputação como defensor dos direitos humanos e do Estado de Direito", explica.
Por outro lado, a prisão também teria consequências. "A relação entre o Brasil e a Rússia, membros dos BRICS, é estratégica. A prisão de Putin poderia comprometer alianças políticas, econômicas e comerciais dentro desse grupo, minando a cooperação multilateral", afirma.
"Além disso, a Rússia, como uma grande potência nuclear e um dos atores principais no cenário internacional, possui considerável influência. O Brasil, ao optar por cumprir o mandado do TPI, arriscaria alienar outros países que também questionam a legitimidade do tratado, como China e Índia", pontuou Coelho.
"Politicamente, o presidente brasileiro enfrentaria um dilema entre respeitar suas obrigações internacionais e manter uma política externa equilibrada, que historicamente busca evitar antagonismos desnecessários com grandes potências", acrescentou.
Lula e Putin
Vale contextualizar que o presidente Lula declarou em 9 de setembro de 2023, em entrevista ao canal indiano Firstpost, durante reunião do G20 em Nova Delhi, que Putin não seria preso se vier ao Brasil: "A gente gosta de tratar bem as pessoas. Então, acredito que o Putin pode ir facilmente ao Brasil. Eu posso te dizer que, se eu sou o presidente do Brasil e se ele vem para o Brasil, não tem porque ele ser preso". A declaração foi noticiada por veículos como Folha de S.Paulo, Veja, CNN, e UOL.
No entanto, após a repercussão negativa da fala, o presidente brasileiro voltou atrás, e no dia 11 daquele mês disse que quem decidiria a prisão é a Justiça.
Na ocasião, Lula mencionou ainda que desconhecia a existência do TPI: "Eu não sei se o tribunal, não sei se a Justiça brasileira, vai prender. Isso quem decide é a Justiça, não é o governo [brasileiro], nem o Parlamento (…) Eu inclusive quero muito estudar essa questão deste Tribunal Penal [Internacional], porque os Estados Unidos não são signatários dele, a Rússia não é signatária dele também. Então, eu quero saber por que o Brasil é signatário de um tribunal que os EUA não aceitam. Por que somos inferiores e temos que aceitar uma coisa? Eu não estou dizendo que vou sair de um tribunal. Eu só quero saber, e só me apareceu agora, eu nem sabia da existência desse tribunal".
Fontes consultadas: Clarita Maia, presidente da Comissão de Relações Internacionais da OAB/DF; a Assessoria Especial da Presidência da República (Secom); Alexandre Coelho, professor da FESP-SP; e o jornalista Lourival Sant’Anna.
Por que o Comprova contextualizou este assunto: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, saúde, mudanças climáticas e eleições. Quando detecta nesse monitoramento um tema que está sendo descontextualizado, o Comprova coloca o assunto em contexto. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.
Para se aprofundar mais: O presidente Lula e Putin já foram alvos de desinformação, a exemplo do uso de um vídeo em que o presidente Russo teria criticado Lula após um encontro com o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky. O comprova mostrou que era conteúdo falso. O Estadão Verifica também constatou que era falso o conteúdo que dizia que Putin iria intervir nas eleições de 2022 no Brasil.
No entanto, após a repercussão negativa da fala, o presidente brasileiro voltou atrás, e no dia 11 daquele mês disse que quem decidiria a prisão é a Justiça.
Na ocasião, Lula mencionou ainda que desconhecia a existência do TPI: "Eu não sei se o tribunal, não sei se a Justiça brasileira, vai prender. Isso quem decide é a Justiça, não é o governo [brasileiro], nem o Parlamento (…) Eu inclusive quero muito estudar essa questão deste Tribunal Penal [Internacional], porque os Estados Unidos não são signatários dele, a Rússia não é signatária dele também. Então, eu quero saber por que o Brasil é signatário de um tribunal que os EUA não aceitam. Por que somos inferiores e temos que aceitar uma coisa? Eu não estou dizendo que vou sair de um tribunal. Eu só quero saber, e só me apareceu agora, eu nem sabia da existência desse tribunal".
Fontes consultadas: Clarita Maia, presidente da Comissão de Relações Internacionais da OAB/DF; a Assessoria Especial da Presidência da República (Secom); Alexandre Coelho, professor da FESP-SP; e o jornalista Lourival Sant’Anna.
Por que o Comprova contextualizou este assunto: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, saúde, mudanças climáticas e eleições. Quando detecta nesse monitoramento um tema que está sendo descontextualizado, o Comprova coloca o assunto em contexto. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.
Para se aprofundar mais: O presidente Lula e Putin já foram alvos de desinformação, a exemplo do uso de um vídeo em que o presidente Russo teria criticado Lula após um encontro com o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky. O comprova mostrou que era conteúdo falso. O Estadão Verifica também constatou que era falso o conteúdo que dizia que Putin iria intervir nas eleições de 2022 no Brasil.
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