Cláudio Guerra detalhou sua participação no caso e apontou o local onde os corpos foram incinerados Foto CNV/Divulgação
Publicado 13/06/2023 16:28
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Campos – Considerado um dos casos mais escabrosos do período da ditadura militar no Brasil, o envolvimento da usina de açúcar Cambaíba, em Campos dos Goytacazes (região norte do Estado do Rio de Janeiro) na incineração de corpos de presos políticos e opositores do regime) marca o cenário.
A indústria pertencia ao deputado federal Heli Ribeiro Gomes (falecido) e as investigações concluíram que 12 corpos foram queimados na usina. Embora familiares herdeiros neguem, o ex-delegado do Departamento de Ordem Política e Social (Dops), Cláudio Guerra, que participou da trama cruel, confessou, inclusive detalhando em livro de sua autoria.
Na última semana, Guerra foi condenado pela Justiça Federal de Campos a sete anos de prisão, em regime semiaberto, pelo crime de ocultação de cadáver. Ao prestar depoimento à Comissão Nacional da Verdade (CNV), em 2014, ele disse ter incinerado 12 corpos nos fornos da usina, em 1974; apenas confirmou versão contada no livro “Memórias de uma Guerra Suja”, escrito pelo próprio e lançado em 2011.
Familiares de Heli Ribeiro contestaram, um deles o neto, o policial civil José Bainha, considerando a versão absurda. Em entrevista ao jornal da cidade, Folha da Manhã, Bainha alegou, entre outras coisas, que “os fornos de uma usina não são como fornos domésticos ou de padaria, que podem ser ligados a qualquer momento”.
Na sequência, o policial afirmou que “na moagem não existe ‘calada da noite’, o funcionamento é 24h em turnos de 12h/12h, cada um com 20 funcionários, fora os caminhões de cana que avançam a madrugada; além do mais, os fornos ficavam diante de uma via pública e um vilarejo com 200 casas”.
No entanto, o ex-delegado do Dops foi incisivo nas colocações, chegando a apontar aos investigadores o forno em que incinerou os 12 corpos, assassinados entre 1974 e 1975. Denunciado pelo Ministério Público Federal (MPF), em todos os depoimentos Guerra (89 anos) confirmou a confissão.
Em junho de 2021 a Justiça Federal autorizou a desapropriação das terras da usina, destinando a área ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) para assentar famílias camponesas; na última quinta-feira (08), 49 anos depois dos crimes bárbaros, o ex-delegado foi condenado à prisão.
A sentença reconheceu a imprescritibilidade dos crimes sob apuração, considerados como crimes contra a humanidade (ou de lesa-humanidade), “em atenção à Constituição da República, às normas internacionais de direitos humanos e à jurisprudência sedimentada no âmbito dos sistemas global e interamericano de proteção aos direitos humanos”.
De acordo com o MPF, a denúncia contra Guerra foi apresentada, em julho de 2019, pelo procurador da República Guilherme Garcia Virgílio, em Campos: “O réu foi acusado de destruição e ocultação de cadáveres”. Segundo o procurador, as ações criminosas do ex-delegado do Dops “são graves e não devem ser toleradas em uma sociedade democrática”.
O procurador escreveu ainda que “o comportamento do réu se desviou da legalidade, afastando princípios que devem nortear o exercício da função pública por qualquer agente do Estado, sobretudo daquele no exercício de cargos em forças de segurança pública, a que se impõe o dever de proteção a direitos e garantias constitucionais da população".
De acordo com o MPF, além da prisão, Guerra também terá de pagar uma multa de 308 dias, “calculada com base em um trigésimo do salário-mínimo vigente em 22 de outubro de 2019 (quando a denúncia foi apresentada pelo MPF), totalizando pouco mais de R$ 10 mil”.
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