MaracanãRicardo Cassiano
Por Thiago Gomide
Publicado 09/07/2020 02:36 | Atualizado 09/07/2020 11:42
Cansei de ver a bola cair na “geral” do Maracanã e a turma se divertir promovendo um jogo paralelo.
A polícia agia, mas era de uma maneira tão sonolenta que dava a sugestão de complacência.
Publicidade
Ainda bem.
Em vários jogos, essa era a melhor cena. A “geral” era a saída, o grito na chuteira, a verdadeira torcida que pagava 1 real para ver e cobrar o jogador.
Publicidade
Com essa ideia de arena, tal qual a Europa, perdemos. Perdemos. Lamento, mas perdemos. Perdemos culturalmente. Perdemos historicamente. Perdemos diferenciação. 
"Vamos profissionalizar". Aham. Geraram a distância. Plastificaram. O canto atual dos torcedores é tão muxoxo que sugere estarmos em um ato ecumênico em latim. 
Publicidade
Veja Maurício em 1989, Jardel em 1994, Renato Gaúcho em 1995, Zico, Claudio Adão, Roberto Dinamite, Túlio, Romário, Edmundo, Ézio, Marinho. Pra quem não estava, dá uma olhadinha na "geral". Na torcida. É outro patamar. 
Em 1985, o Bangu chegou na final do Brasileiro. O Maracanã estava lotado para ver o confronto contra o Coritiba. Pena não ter vencido. Alguns indicam que a vitoriosa campanha deve unicamente ao Castor de Andrade. Nada. Bangu sempre contou com a tradição. Há historiadores que mostram que a luta contra o racismo nasceu naquelas bandas, antes de Ponte Preta e Vasco.
Publicidade
Os times representam bairros e cidades. Foram e, ainda em alguns casos, são locais de encontro. A força simbólica está aí, vivinha.  
Com o passar do tempo, o campeonato carioca virou piada. Escracho. Descredito.
Publicidade
Lembro em 2002 o campeonato caixão. Fluminense, meu Fluminense, venceu. Eu estava no Maracanã. Foi vergonhoso. Ganhamos, mas com um gosto amargo. Meu avô, tricolor super doente, dizia que “a gente não precisava disso”.
Durante muitos anos encaramos o caixa d´Água. O que é isso? Era o presidente da Federação do Rio de Janeiro de Futebol. Torcedor do Americano, não escondia o desejo de ver o clube chegar ao título. 2002 foi insistência. Birutice total.
Publicidade
Quando defendiam que devíamos ser europeus, escrevi que a gente estava enterrando o principal ativo do Rio de Janeiro. Evidentemente ignoraram. Evidentemente defenderam que precisávamos evoluir ( ha-ha-ha).
O término da “geral” já era o caminho para o fim do carioca. É o rompimento com quem faz a bola girar, o povo. É a tolice de acreditar que somos Barcelona x Real Madri. É não entender que somos trem lotado da Pavuna com bandeira do Flamengo, Vasco, Botafogo, Bangu. É não imaginar que futebol é canto de encontro, que crescemos com trocas, que é super possível um tricolor ir para a torcida do América torcer contra o Mengão (no aumentativo, por favor).
Publicidade
Os burocratas do futebol acabaram com a gente. Que coisa!
A quebra total das regras de agora é a caminhada mais rápida do que estávamos vivendo nos últimos anos. Não havia respeito pelo “cariocão”. Não há respeito pelo “cariocão”. É como se fosse um campeonato qualquer. É como se fosse uma obrigação prejudicial.
Publicidade
Vamos ter um campeão carioca 2020. Parabéns. Em 2021, com essa inconsistência, pouco provável que teremos outra oportunidade. Fragilidade jurídica. Fragilidade moral.
Tudo isso para dizer que possivelmente a Globo não vai querer botar um real nesse campeonato. Nenhuma outra emissora vai investir na transmissão de Botafogo x Volta Redonda ou Flamengo x Americano. Não dá audiência. Melhor investir só nos clássicos. Com o preço do ingresso lá nas alturas, é impossível ir aos estádios, que não se pagam. Sem torcida, sem show, sem emoção. 
Publicidade
É bonitinho ver jogo no Fla ou Flu TV, mas tem que dar 8 meses para ver se vai ter gás, pensando em atrair patrocinadores, melhorar a transmissão e afins. Os pequenos não resistem, não têm base de sócios, não têm estrutura. Tchau, Volta Redonda ou Bonsucesso, Rezende ou Cabofriense.  
“É um atraso esse campeonato. Tem que acabar mesmo”, alguns me dizem.
Publicidade
Na praça em frente de casa, os meninos e meninas vestem camisa do Liverpool, Paris Saint Germain e Barcelona.
É, meu amigo, mas, futebol por futebol, é melhor torcer por europeu.
Aquilo que nunca seremos.