Publicado 03/03/2022 06:00
A guerra é sempre uma demonstração do colapso do diálogo, do afastamento da força do Direito e da evidência de que a barbárie venceu a nossa porção civilizatória. E resulta em injustiças, mortes, fome e isolamento. A guerra, qualquer guerra, mata o que ainda existe de humano em cada um de nós. Basta ver a multidão de famélicos e desesperados andando como zumbis à procura de um lugar seguro.
Os refugiados são o retrato da falência da humanidade. Só nesse início do combate, quase um milhão de
ucranianos já se refugiaram. Triste. Humilhante.
ucranianos já se refugiaram. Triste. Humilhante.
Em um conflito brutal, como o que estamos vivendo, várias faces podem ser ressaltadas. E devem ser: a prepotência do Putin, ao julgar que a Ucrânia não resistiria a uma pressão militar; a arrogância da OTAN, entendendo que lidava com um país que permitiria ver seu poder regional ser diluído; a visão estreita e militarista dos EUA, que pretendeu tratar a Rússia como um quintal, assim como tratou, à época, Cuba. Naquele tempo, existia a União Soviética, que impunha respeito. Hoje, a Rússia é uma pálida representação do que já foi. Mas ainda tem força nuclear, mesmo não sendo mais uma superpotência.
E não precisamos de várias potências para destruir o mundo; basta uma. São muitos erros em um território que respira história. O russo que ataca a Ucrânia está lutando com um russo ucraniano que tem o sangue dele. Complexo. Algo me deixa perplexo, dentre as perplexidades óbvias: o racismo que a sociedade, a
imprensa e o mundo estão se deixando revelar. Chocante. Essa explicitação do preconceito talvez explique o motivo da falência da diplomacia e do diálogo. Como conversar com a elite hostil, covarde e cruel? Como conviver com esses pulhas, que se sentem superiores e supremacistas? Como tentar entender esse povo que despreza o que de humano ainda resta nas pessoas?
imprensa e o mundo estão se deixando revelar. Chocante. Essa explicitação do preconceito talvez explique o motivo da falência da diplomacia e do diálogo. Como conversar com a elite hostil, covarde e cruel? Como conviver com esses pulhas, que se sentem superiores e supremacistas? Como tentar entender esse povo que despreza o que de humano ainda resta nas pessoas?
A imprensa mundial tem nos apresentado um show de horrores. A revelação de uma discriminação que nunca se imaginou ser possível nas grandes redes de comunicação. Com a cobertura ao vivo do conflito na Ucrânia, não foi possível esconder essa vergonha histórica.
Circula nas redes sociais, em um vídeo, fragmentos de uma crueldade que demonstra o estado de podridão a que chegamos. Tão cruel quanto a morte nos ataques insanos e assassinos do Putin à população civil na Ucrânia são as demonstrações claras do racismo. Mortes diferentes, mas são mortes.
Um repórter, louro, fala da perplexidade de ver “um povo relativamente civilizado e europeu” ser atacado e ressalta “aqui não é o Iraque ou o Afeganistão”!! E ainda confessa, ao vivo, que tem que “escolher as palavras”. Um outro demonstra a perturbação pois os refugiados, em fuga, “são europeus e tem olhos azuis e peles claras sendo mortas, crianças, pelos mísseis do Putin”.
E, ainda, a explicitação da barbárie nas palavras de um bandido disfarçado de jornalista: “Não estamos falando de sírios fugindo das bombas, falamos de europeus fugindo com seus carros que se parecem com os nossos”. Outro fascistinha afirmando, com indignação nazista, sobre o massacre cruel da população ucraniana: “Não é um país do terceiro mundo, ISSO É A EUROPA”. E um idiota completa: “Estamos no século XXI e estamos na Europa com mísseis apontados para nós como se estivéssemos no Iraque ou no Afeganistão. Vocês podem imaginar?”.
Realmente não é possível imaginar tamanha ignorância. Mas talvez isso nos leve a compreender o porquê da morte do diálogo, da falência do humanismo e da derrota da diplomacia. E estamos, o mundo, nas mãos de um idiota que se elegeu fazendo piada e atacando a política, pregando a não política, e que agora virou herói mundial por ter optado em não fugir - no que estava certo - e resolver o conflito sentado numa mesa,
fazendo a política que a extrema direita tudo fez para derrotar.
fazendo a política que a extrema direita tudo fez para derrotar.
Que momento trágico. O recorte da vitória desses que, como Bolsonaro, pregam a violência, o armamentismo, a não política e o fim do diálogo. Tristes tempos. Recorrome a Clarice Lispector: “Renda-se, como eu me rendi. Mergulhe no que você não conhece como eu mergulhei. Não se preocupe em entender, viver ultrapassa qualquer entendimento.”
Antônio Carlos de Almeida Castro, Kakay
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