KakayDivulgação
Publicado 30/03/2023 06:00
Publicidade
Já havia prometido a mim mesmo não falar mais do tal senador Sérgio Moro. Fui um dos primeiros a enfrentá-lo, quando ele era o juiz todo poderoso que instrumentalizava o Judiciário coordenando um grupo de procuradores com objetivos políticos. Corri o país mostrando aquilo que, anos depois, o Supremo Tribunal sacramentou: ele corrompeu o sistema de Justiça para eleger o ex-presidente Bolsonaro.
E, quando aceitou o Ministério da Justiça, como prêmio pela patente corrupção, em novembro de 2018, eu vaticinei que ele teria um fim melancólico. Em pouco tempo, deixou o governo bolsonarista sem que tenha sequer conseguido aprovar o seu Pacote Anticrime. Saiu sem deixar um único legado no ministério.

Embora tenha sido eleito senador, é um político que não tem o respeito nem do Legislativo e muito menos do Judiciário. Ocupa o cargo em uma instituição, o Senado Federal, que tentou desmoralizar com a criminalização da política. É olhado com desdém e desprezo. Com muita dificuldade de se expressar, juntamente com sua baixíssima densidade intelectual, todas as vezes em que ocupar a tribuna, será questionado pelos seus pares sobre o papelão que desempenhou enquanto juiz e ministro.

Nesta semana, o presidente Lula deu uma sobrevida ao moribundo senador ao citá-lo duas vezes. É natural que o presidente o tenha como seu adversário, afinal, foi o então juiz que o prendeu por 580 dias de maneira ilegal, inconstitucional e imoral. O objetivo único era tirá-lo da disputa presidencial e eleger o projeto fascista do Bolsonaro. É admirável a capacidade de reação do Lula ao sair da prisão e se eleger Presidente da República pela terceira vez. Certamente, não podemos nos esquecer de que o principal responsável pela eleição do fascismo no Brasil deve ser exposto, diuturnamente, a todas as consequências das suas ações.

É absolutamente correto que tenhamos dúvidas e reticências a qualquer ato que envolva esse senador. É interessante notar que ele se fez de indignado e politizou a discussão. Logo ele, que se elegeu na onda da não política e do desprezo ao Parlamento. É um direito dele, urge enfrentá-lo. Como indigente intelectual que é, não será tão difícil.

No episódio, o brilhante ministro Flávio Dino deu o tom exato do que ocorreu: a Polícia Federal fez um excelente trabalho de investigação independente e, ao que tudo indica, preservou a vida desse adversário político do governo. É assim que deve ser. Sem perseguir e sem proteger. Mas o caso pode sim ser questionado, nunca a atuação da Polícia Federal. Desde a afetação da competência federal, em processo que parece ser da justiça comum estadual, a participação da juíza ligada ao senador bem como o levantamento do sigilo logo após a deflagração da operação.
Enfim, não é impróprio, numa República democrática, que os procedimentos, mesmo os do Judiciário, ou no caso principalmente, devam ser analisados com lupa. Afinal, foi de lá, da Justiça Federal de Curitiba, que se arquitetou o maior golpe contra a Democracia recente. As peças ainda estão no tabuleiro e o presidente Lula tem autoridade para participar do jogo democrático.

O que não podemos fazer é o jogo bolsonarista de enfraquecer a Polícia Federal. Ao contrário, o trabalho técnico, científico e independente realizado por ela tem que ser exaltado e reconhecido como, aliás, fez o ministro da Justiça. Afinal, é essa polícia que irá analisar os documentos e áudios entregues pelo advogado Tacla Duran. Moro disse que “palavra de bandido não pode ser levada em consideração “, isso depois de se fiar apenas em delações coagidas para ser o herói da Operação Lava Jato.
Em um ponto, tendo a concordar com ele, pela primeira vez: a palavra dele não pode mesmo ser levada a sério. Mas os arquivos contendo imagens de um crime devem ser levados muito a sério e pela equipe profissional e competente da Polícia Federal.

Tudo que vem desse ex-juiz deve ser analisado com o devido cuidado. Dentro das regras constitucionais, é óbvio, dando a ele o benefício da presunção de inocência - contra o qual ele tanto lutou até ser derrotado por nós -, mas reconhecendo que esse cidadão não enxerga limites na luta pelo poder. Usou o poder Judiciário se auto promovendo um juiz de jurisdição nacional, tudo para atingir interesses inconfessáveis.
É ridículo o argumento de que suas decisões foram confirmadas pela segunda instância. O que vale é que foram anuladas pela Suprema Corte! Em última e definitiva instância. É como se, em um jogo de futebol, o primeiro tempo terminasse um a zero para determinado time, mas, no final do jogo, o placar virasse para 4 a 1. E os inconsoláveis torcedores continuassem bradando: nós ganhamos no primeiro tempo, esquecendo que perderam no final.

Frisando que devemos acompanhar com o rigor democrático todo esse episódio, não me furto de fazer alusão àquilo que parece ter sido a origem da discussão: a proibição de visitas íntimas. Lembro-me de que, nos anos '980, não existia visita íntima nos presídios de Brasília. Como membro da Comissão de Direitos Humanos, desenvolvi um árduo trabalho para introduzir esse direito no sistema penitenciário. Depois de longa negociação, a Secretaria de Segurança concordou em construir os quartos para esse fim e negociamos 45 minutos para os casais. No início, eu pleiteava uma hora e meia, e o secretário, o coronel Broxado, propunha 15 minutos. Fechamos em 45.
No dia do anúncio do programa, em frente à imprensa, o coronel anunciou que estava inaugurando os quartos e que os detentos teriam 15 minutos para a visita íntima. Imediatamente protestei, e disse que o combinado eram 45 minutos. O Coronel não se fez de rogado e fechou questão, “15 minutos é mais do que suficiente”. E eu respondi, na frente de todos, “talvez para o senhor, Coronel Broxado”. Saímos de lá com os 45 minutos garantidos. Ou seja, devemos estar sempre atentos e vigilantes.

Recorrendo a Augusto dos Anjos, no poema Versos Íntimos: “Toma um fósforo. Acende teu cigarro! O beijo, amigo, é a véspera do escarro. A mão que afaga é a mesma que apedreja. Se a alguém causa inda pena a tua chaga, apedreja essa mão vil que te afaga, escarra nessa boca que te beija!”

Antônio Carlos de Almeida Castro, Kakay
Publicidade
Leia mais