Lembrando-nos de Shakespeare: "Chorar sobre as desgraças passadas é a maneira mais segura de atrair outras". Arte: Paulo Márcio
Publicado 10/10/2024 00:00
“A loucura é vizinha da mais cruel sensatez.”
Clarice Lispector
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O Brasil naturalizou a bizarrice. Ou o país não se leva a sério, ou nós, que temos a pretensão de pensá-lo, ficamos sentados à beira do caminho. Uma eleição municipal tem importância transcendental. É nas cidades que são traçadas as diretrizes que garantem o dia a dia do cidadão. A definição da política do município é que, de certa forma, delimita o cotidiano das pessoas.
As eleições de São Paulo capital são definidoras de um certo pensamento do que ocorre no coração financeiro do Brasil. Para nós, não paulistanos, é muito claro que o sangue brasileiro mais Brasil corre nas veias nordestinas, do Norte, desse povo sofrido e sem empáfia. Nas últimas eleições para Presidente, o Nordeste salvou o Brasil do fascismo. Deu vontade de gravar no peito uma daquelas frases que se lê quando
chegamos nas praias de águas quentes daquela região. Só não o fiz para não parecer arrogante.
Claro que o método bolsonarista de fazer política empobreceu intelectualmente o brasileiro como um todo. É a não política como regra. O gosto da mentira como estratégia. A falta de limites, de senso de ridículo e de pudor. 
Se formos nos lembrar da agressividade vulgar do então Presidente Bolsonaro no trato com a pandemia, do desrespeito aos mortos e do covarde desdém com os familiares vivos, nós entenderemos o porquê da postura do Pablo Marçal. Basta recordarmos do Bolsonaro imitando alguém com falta de ar e dizendo que não é coveiro, bem como desdenhando das mulheres dizendo não estuprar uma deputada por ela “ser feia”.
Enfim, há um acúmulo de estultices que a gente projeta para os abusos ridículos desse Pablo Marçal. A cereja do bolo foi a falsificação de um atestado médico grosseiro em que, de maneira solerte e covarde, supostamente demonstraria ser o Boulos um “cheirador de cocaína”. Uma postura evidente de quem se sente acima da lei e que, na linha do seu mestre Bolsonaro, considera o Poder Judiciário um poder de
fachada.
Já escrevi e tenho refletido sobre o risco para a estabilidade democrática do excesso de poderes nas mãos do Judiciário. Especialmente da Justiça Eleitoral. Mas tem que haver um respeito às normas constitucionais.
Pablo Marçal abusou de todos os limites. E o fez de maneira deliberada para conseguir atingir os 28.14% que acabou obtendo. Por muito pouco, 55 mil votos, não conseguiu ir para o segundo turno. Se ele não tem freios, cabe ao Tribunal Superior Eleitoral impor. E deixar claro que o Estado democrático de direito só pode existir com o cumprimento das regras básicas da convivência democrática.
Vai ser drástico cassar os direitos políticos dessa figura bizarra, mas o espanto vai durar pouco se ele for cassado. Caso o TSE seja leniente, vamos continuar convivendo com essa escatologia que assombra a todos nós.
Lembrando-nos de Shakespeare: “Chorar sobre as desgraças passadas é a maneira mais segura de atrair outras”.
* Antônio Carlos de Almeida Castro, Kakay
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