Luarlindo Ernesto, repórter do Jornal O DIA.Arquivo O DIA
Publicado 01/10/2022 06:00
Nunca, jamais em tempo algum, vou confessar, novamente, que vi um disco voador, ou OVNI, como queiram. E, tem alguém aí que confessaria? Já pensaram nas consequências de uma declaração deste tipo ? Mas, entre cerveja, sardinhas, e mictório, tudo pode acontecer.
Foi pensando em um querido amigo, que já passou para outro plano no início de 2010, que resolvi escrever algo. Ele, um eterno instável em comportamento - eu sempre gozava ele, dizendo que era mais instável do que o trânsito da Avenida Brasil - tinha confiança aqui, no velho amigo. O cara tinha medicamentos para dormir, para acordar, para se manter durante a jornada de trabalho.
Vez por outra, trocava as bolas e os medicamentos. Ih, então era um problema de estabilidade emocional. E lá vinha ele, com um vidrinho de Rivotril nas mãos: "Ô Luar, pingue meia gota na minha boca. A coisa tá feia!". "Ô Januário, como eu vou conseguir separar a metade da gota? Com a tesoura? Você vai escolher qual metade quer que pingue ?".
Brincadeiras à parte, ele era viúvo, sem filhos, morava com uma irmã - acho que meia complicada, também - e buscava o meu ombro amigo sempre que precisava. Januário, em noite de quase esbórnia, segurando uma garrafinha com água mineral - deixou de beber cerveja e Cuba Libre depois de flagrar a namorada com um desconhecido, conforme me explicou - entre dentes, disse bem baixinho: "Vi um disco voador quando cheguei em Maricá". E explicou detalhes: "Eu estacionei o carro e, no meio da escuridão da noite, uma luz ofuscante me chamou atenção no céu".
Januário tinha uma pequena casa perto da lagoa, naquele município vizinho. Era lá que buscava refúgio quando estava se sentindo forte da mente. "Fiquei com medo e pensei que estivesse entrando em crise. Foram uns dez segundos de medo e a luz desapareceu. Bolas, voltei para o Rio, correndo !", explicou, olhando para os lados, tentando confirmar que não fora ouvido por mais ninguém.

Estávamos no Beco da Sardinha, ali, no Centro, na Rua Miguel Couto. Noite de uma sexta feira, local abarrotado de gente. Já estávamos chamando a atenção porque, enquanto eu bebia cerveja e comia umas
sardinhas fritas na hora, Januário comia os petiscos bebendo água mineral. Eu, particularmente, acho que não combina. Aliás, outros frequentadores do local, pelo que deixavam parecer, também. Só que, enquanto eu não dava bola, outros achavam, pelo menos, diferente.
Dava para sentir no ar...Cheguei a pensar em falar, bem alto, que ele estava com bebida alcoólica na garrafinha que parecia conter água. Eu mesmo já havia visto este golpe, muitos anos atrás. Um vizinho, cuja
mulher detestava que ele bebesse, ficava no bar, lendo jornal e com uma garrafinha, teoricamente, com água, sobre a mesa. Mas o líquido era gin-tônica. Vou deixar isso de lado. É uma outra história.

Então, entre água mineral e cerveja, nada mais indicado do que procurarmos o banheiro. Quer dizer, encarar a fila do mictório. Cada um mais necessitado do que o outro, entendem? Januário, que não queria parar de falar, quase em tom baixo, ainda explicava o tamanho e aparência do OVNI que surgiu em Maricá.
Eu, desesperado para entrar no banheiro, tentando enrolar as mentes - dele e da minha - acabei falando o que não devia: "Ô Januário, não esquenta com isso não. Eu também já vi disco voador e nem liguei para isso". - E ainda fui mais além: "Depois dessa visão, sempre ando preparado para fotografar a aparição".
Menti sobre a visão. Não vi nada de disco voador. Caramba! Todos, acho eu, que estavam na fila olharam em minha direção. Então, alguém gritou: "Chama o disco voador. Lá deve ter mictórios pra todo mundo !". 

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