O chef Marcelo Barcellos, do restaurante BarsaVantuil Costa
Publicado 10/01/2022 09:00
Erguido em Benfica, na Zona Norte do Rio, após a demolição do antigo Mercado Municipal para a construção da Perimetral — derrubada no governo anterior de Eduardo Paes — o Centro de Abastecimento do Estado da Guanabara completa 60 anos em 2022. Nesta entrevista a O DIA, o chef Marcelo Barcellos, dono do restaurante Barsa, fala sobre a decisão pioneira de se instalar no Cadeg, numa época em que a circulação no local ainda se dava majoritariamente de madrugada, e sobre as mudanças pelas quais o centro comercial vem passando atualmente: "O mercado teve que entender que estava recebendo um público que não aceitava qualquer coisa".
O DIA: Como o senhor vê a importância do Cadeg para os cariocas?
MARCELO: O Cadeg faz parte da memória afetiva do Rio: é a presença do colono, com toda a imigração. Temos portugueses, espanhóis, italianos, africanos, além da migração interna. No mercado, vemos a ligação da cidade com o interior, já que os produtos em geral vêm de lá. Essa mistura é muito brasileira. No Cadeg, você volta no tempo, vendo os carregadores, os mercantes: é a nossa cultura batendo à porta.
O que deu o estalo para abrir o restaurante no mercado?
Nos 10 anos em que trabalhei com eventos privados, frequentei o Cadeg para buscar os bons insumos direto do intermediário. Nesse período, percebi que ele estava ficando menos forte. Mas ao ver motoristas descendo do carro, comprando duas garrafas de vinho Pêra Manca, gastando R$ 10 mil e indo embora, pensava: por que essa pessoa não pode parar e almoçar lá?
Qual foi o seu objetivo ao abrir o Barsa? Aliás, o nome tem alguma relação com a enciclopédia?
Quando pensei em abrir o Barsa, meu pensamento foi: o que representaria o mercado? Eu queria servir a comida de colono, que mexesse com a memória. Quero perder para a avó, mas se faço com que o cliente se lembre dela, então esse é o melhor elogio. Por isso a escolha de fazer um cardápio com pratos como bacalhau, cordeiro, feijoada, encontrados em toda a região mediterrânea. A escolha do nome é tanto uma brincadeira com meu sobrenome, como com Bar S/A — mas também tem a ver com a enciclopédia. Foi um casal português com origem catalã que percebeu a falta de informações sobre a história brasileira e decidiu bancar o projeto. Essa mistura tem tudo a ver com o conceito de colono que eu queria.
Lançar um restaurante que abria as portas quando as lojas estavam fechadas não foi um passo arriscado?
No início, era antagônico: as pessoas iam para conhecer o Barsa, mas não conseguiam fazer compras. Com isso, outros comerciantes viram a demanda e começaram a abrir. Os donos de lojas de bebidas viram os clientes, e ficaram abertos também, e assim foi – virou uma opção para parte da população. Menos de 10% das vendas eram durante o dia; hoje, são praticamente 80%. A autoestima do mercado aumentou. Logo depois, passei a abrir aos domingos, para os comerciantes aproveitarem o restaurante.
Como foi a reação à chegada do Barsa?
Eu já conhecia alguns comerciantes – meus fornecedores, que me ajudaram a abrir as portas e a conhecer os outros. Na inauguração, a diretoria fez uma mesa grande e estava jogando porrinha, apostando quando o Barsa quebraria. A primeira reação foi de desdém, mas depois, a turma passou a ver que suas lojas ganharam valor. Quando fui para lá, bati na tecla de mudar o nome para Mercado Municipal do Rio. O Cadeg comprou essa ideia: ao se tornar um representante do comércio, ele entrou no circuito cultural e turístico.
Falta alguma coisa para impulsionar as atividades no Cadeg?
O mercado foi evoluindo muito ao longo do tempo. Antigamente, era como uma feira livre: no tempo ruim, chovia lá dentro, porque não tinha cobertura. Atualmente, a área dos galpões está coberta com energia solar; é o maior projeto urbano do Brasil. O mercado está se aprimorando, fazendo um trabalho de captação de água de chuva. Além disso, o primeiro caminhão de lixo elétrico é do Cadeg, e temos uma área de reciclagem. O mercado teve que entender que estava recebendo um público que não aceitava qualquer coisa.
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