Publicado 13/02/2023 09:00
Vice-presidente de Projetos Especiais do GRES Estação Primeira de Mangueira e presidente da Fundação João Goulart, Rafaela Bastos atuou por 23 anos como passista pela escola de samba. Atualmente é responsável pela marca da agremiação. Conhecida pela sua luta em prol do povo sambista, foi uma das organizadoras do projeto Carnaval de Dados, da prefeitura, e em 2016 recebeu a Medalha Rui Barbosa por estudo sobre a objetificação das passistas. Em entrevista a O DIA, ela fala sobre a importância das escolas para as mulheres. "Eu vejo que impulsionam, dão auto-estima. É uma força que faz com que elas consigam olhar para além das dificuldades", declara.
O DIA: O que significa ser passista da sua escola de samba?
Rafaela: Eu sempre digo que uma vez passista, sempre passista. Fiquei na Mangueira por 23 anos. Isso é de grande valor para mim, me constrói enquanto ser humano. Eu sou instruída por esse conhecimento, por essa vivência. Ser passista me transformou em uma outra mulher, em uma outra pessoa.
Qual é a importância das escolas para as comunidades do entorno?
Costumo dizer que uma quadra de escola de samba é um polo de políticas públicas para a comunidade. Ela tem a capacidade de influenciar tanto no social como no econômico. É um lugar onde as pessoas se sentem seguras, e frequentam para se divertir ou se sentirem amparadas: as celebrações vão de festas de 15 anos até velórios. Tem toda uma relação de pertencimento. Além disso, sempre há microempreendimentos para atender os eventos que acontecem na quadra ao longo do ano.
E no caso específico das mulheres? Há uma relação especial?
Eu vejo que as escolas impulsionam as mulheres, dão autoestima. É uma força que faz com que consigam olhar para além das dificuldades. Isso é muito importante, pois elas passam a se enxergar a partir da beleza e da capacidade intelectual. E tem ainda a relação econômica: as comunidades têm demanda de negócios, e as mulheres aproveitam para empreender. O resultado é a economia girando a todo vapor: o morador não precisa sair para ir à manicure, ao cabeleireiro, para comprar roupas… tem tudo lá. É uma potência gigante.
De que forma o Carnaval rege o calendário do Rio?
O Carnaval tem um processo de desenvolvimento bem longo. Colocar um desfile na rua leva meses. Há o envolvimento de vários eventos: a criação de um enredo, as feijoadas, as escolhas do samba, o sincretismo religioso, etc. Tem toda uma mistura de celebrações que são absorvidas pelas quadras, desde festas para os orixás até festa junina. Eu digo que é um calendário bem carioca por ter essa relação com outras celebrações. As quadras das escolas são democráticas, e não se restringem só a quem gosta de Carnaval.
Como as escolas de samba podem trabalhar a própria sustentabilidade?
A escola é uma associação recreativa, o negócio dela é o desfile, mas por ter uma função social nas comunidades, seu escopo acaba sendo ampliado. No caso da Mangueira, temos investido na gestão da marca. Buscamos olhar para além do desfile — inclusive estamos com o empreendimento do Bar da Mangueira, uma novidade que reforça nossa imagem. Queremos fortalecer a história da escola e manter vivos o nosso simbolismo e nossa tradição por muitos e muitos anos.
Como você relaciona o seu trabalho na Mangueira com o da Fundação João Goulart?
Eu digo que o Carnaval está relacionado à gestão de riscos. O artista passando pela Sapucaí tem que se preocupar com olhares de todas as direções, assim como quem está na gestão pública. Eu aprendi a lidar com isso justamente com o samba. Ambos têm que seguir uma orientação reta baseada em estratégias e com foco na população. E sempre há um grande aprendizado quando o serviço é entregue para o povo.
Qual a importância de ter uma fundação pública cujo propósito é melhorar a gestão?
Basicamente, quando se tem uma fundação que investe no alto desempenho, o fruto tende a ser políticas públicas de melhor qualidade. Os servidores passam a ser líderes muito mais eficientes para a sociedade. Isso garante resultados mais positivos para toda a população.
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