Publicado 06/03/2023 09:00
Especialista em relações civis-militares e segurança pública, Luiz Alexandre Souza da Costa é cientista político, mestre em Direito e major da reserva da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro (PMERJ). Dedicado ao tema da segurança, atua como professor de Direito Constitucional e Militar na Uerj e na PMERJ, além de estudar a atuação de militares — seja das Forças Armadas, policiais ou bombeiros — em cargos representativos. Em entrevista a O DIA, Costa reafirma necessidade de a categoria exercer seus direitos. "Os militares individualmente têm que se politizar, afinal, eles também votam, são seres políticos. O que não pode é a politização se tornar antidemocrática".
O DIA: Em 2018, foram eleitos muitos militares para o Congresso. Qual é a sua análise?
Luiz Alexandre: Minha pesquisa foca o período de 2006 a 2018, em que há um aumento de 346% nas candidaturas militares — policiais, bombeiros ou das Forças Armadas. Antes do bolsonarismo, elas cresciam em números, mas não tinham sucesso. Em 2014, de 892, só há quatro eleitos. Em 2018, a história muda: 26 parlamentares se elegeram, entre senadores e deputados federais, em um universo de 1.019 candidatos. Já em 2022, o curioso é que o tamanho da bancada quase não muda, mas há uma grande renovação: apenas nove foram reeleitos — mesmo assim, um número expressivo. Ou seja, a população ainda tem interesse em eleger profissionais de segurança.
Qual foi a principal forma de atuação dos militares na Câmara dos Deputados?
O normal seria esperar uma pauta corporativista no primeiro mandato, diluindo o tom de defensores da classe com o tempo. Mas, no meu entendimento, policiais militares, em vez de se aterem a questões de Segurança Pública, acabaram entrando muito em pautas conservadoras — pró-armamento, por exemplo. Acredito que isso tenha acontecido por se sentirem devedores do bolsonarismo. Sem contar o grande risco de se afastar desse grupo político. Joice Hasselmann e Alexandre Frota, por exemplo, não se reelegeram.
Por que militares, depois de eleitos, não retomam o serviço?
Essa é uma determinação constitucional para evitar que os quartéis se transformem em palanque político. Porém, para os militares com menos de 10 anos de atuação, a norma os coloca entre exercer o direito político e a carreira. Esses são afastados, perdem o emprego e voltam a ser civis só por se candidatarem. Os outros vão para a reserva, com aposentadoria proporcional.
Qual é a sua opinião sobre a "quarentena" para servidores?
Creio que o impedimento de se candidatar durante um período depois de sair do serviço público deve ser voltado para cargos que possam influenciar numa eleição, como juízes ou promotores. E até mesmo delegados, já que um indiciamento é quase uma condenação na corte da opinião pública. Mas um cabo da PM não tem esse poder.
Como evitar que a caserna sirva de trampolim político?
Hoje há um grande problema desse tipo por conta dos vídeos no YouTube. Mesmo assim, já há normas internas das corporações para impedir que agentes atuem nas gravações usando farda ou sua patente. Inclusive, em teoria, os nomes de urna não poderiam incluir designações hierárquicas — como major, general, etc. Os eleitos tampouco poderiam usar a farda durante o mandato, para o público não confundir a corporação como um todo com o pensamento daquele indivíduo. Cabe às instituições terem regras rígidas e o Ministério Público (MP) correr atrás, em caso de omissão do próprio comando.
Como equilibrar o risco de partidarização com a necessidade que as categorias têm de reivindicar melhoras?
O militar não pode ter sindicato, fazer greve e nem se queixar individualmente — e se protestar coletivamente, entra no crime de motim. A única saída para defender seus direitos acaba sendo eleger representantes para pressionar o Poder Executivo. Por isso nunca posso falar que é errado um militar se eleger. Ser militar é uma profissão, não é um sacerdócio. É algo que você faz para botar comida em casa. Os militares individualmente têm que se politizar, afinal, eles também votam, são seres políticos. O que não pode é a politização se tornar antidemocrática.
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