A decisão do ministro Ricardo Lewandowsk suspende os despejos e as reintegrações de posse enquanto durar o estado de calamidade pública no Rio de JaneiroFreepik
Por Cristiane Campos
Publicado 06/01/2021 18:25
Uma decisão recente do ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), está dando o que falar no mercado de locação. Isto porque ele restabeleceu dispositivos da Lei Estadual No 9.020/20, que suspende os despejos e as reintegrações de posse enquanto durar o estado de calamidade pública por conta da Covid-19. A medida vale apenas para o estado do Rio.

Especialistas ouvidos pela coluna afirmam que a decisão pode trazer uma série de consequências para o setor, entre elas mais inadimplência, invasão e até o aumento dos aluguéis. O advogado André Luiz Junqueira considera a decisão injusta. Para ele, o mais adequado é que o próprio juiz da causa, quando julga o despejo, avalie se é o momento ou não dessa medida. "É uma medida enérgica, mas que os locadores dependem dela. O locador não é obrigado a alugar o imóvel de graça. Por mais que se entenda que estamos em um estado de calamidade, que é uma questão de saúde, essa decisão do ministro Lewandowski é mais um golpe mortal no segmento imobiliário. O mercado ainda busca se estabilizar e esta decisão não ajuda", avalia Junqueira.

O advogado Leandro Sender complementa que a medida traz uma série de nuances que vão impactar muito o judiciário carioca, fazendo surgir uma série de questionamentos. Um deles é a sua aplicação em caráter amplo, ou seja, sem a análise do caso concreto, o que poderá trazer maior proteção aos devedores. Ele lembra que, muitas vezes, o proprietário depende dessa renda para sua subsistência e a impossibilidade de despejar o inquilino poderá gerar grave crise em seu orçamento familiar. “Além disso, nos vemos diante de uma alta sem precedentes do IGP-M (Índice Geral de Preços – Mercado), indicador que corrige a maioria dos contratos de locação, fato este que poderá culminar no aumento de casos de inadimplemento de aluguéis que, embasados nesta decisão, desde que comprovados os requisitos para sua aplicação, os inquilinos não poderão ser despejados”, lembra o especialista. Vale lembrar que o IGP-M fechou em 23,14% em 2020, registrando a maior alta desde 2002.

Sender ainda faz uma reflexão: “Por ser o STF e, apesar de ser uma decisão embasada por Lei Estadual, será que existirão pedidos realizados por locatários de outros estados objetivando aplicar por analogia essa impossibilidade de despejo? Só resta esperar para saber quais serão as consequências dessa decisão e os impactos que serão gerados na jurisprudência do Rio de Janeiro”, observa.
Imobiliárias demonstram preocupação
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Do lado das imobiliárias, a decisão também é preocupante. André Moreira, diretor da Martinelli Imóveis, afirma que a medida compromete muito o mercado de locação, podendo prejudicar vários proprietários que só têm um imóvel como fonte de renda. “E como ficam essas pessoas que também têm seus compromissos? É uma decisão que só favorece o inquilino”, ressalta Moreira.

Para Edison Parente, vice-presidente Comercial da Administradora Renascença, a situação demonstra mais uma intervenção do Estado nas relações privadas, o que pode causar insegurança. “Na tentativa de proteger o mais fraco, a decisão prejudica cerca de 76% de proprietários que têm apenas um imóvel e que dependem dessa renda para arcar com o pagamento de escolas, saúde, prestações de carro ou até do próprio imóvel alugado, enfim, com as suas despesas. O inquilino pode deixar de pagar o aluguel e não terá sanção, mas o proprietário não pode deixar de quitar os seus compromissos”, enfatiza.

Na avaliação de Parente, o cenário traz algumas situações: alguns locatários podem aproveitar para atrasar o aluguel porque sabem que não podem ser despejados. “Além disso, a decisão é um passe livre para a indústria da invasão, que acontece muito nas zonas Norte e Oeste. E ainda causa insegurança ao proprietário, que pode optar por não alugar, preferindo vender ou deixar o imóvel vazio. No passado, era muito comum encontrar vários imóveis vazios devido a estas intervenções do Estado. E o que acontecia? Faltavam imóveis no mercado e aí o preço subia. É a lei da oferta e da procura. Podemos ter agora uma situação parecida”, alerta.
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