Publicado 25/09/2023 06:00 | Atualizado 25/09/2023 08:08
Rio - Artista multipremiado e reconhecido internacionalmente, Hamilton de Holanda, de 47 anos, lançou seu novo álbum, "Samurai", inspirado nas músicas de Djavan, este mês. A história do bandolinista com o alagoano de 74 anos começou na adolescência, quando sua banda, que tocava música popular brasileira na época, tinha a canção "Sina" como hino. Depois de conhecer mais sobre o repertório de Djavan, o músico gravou "Flor de Lis" em um disco de choro do grupo que tinha com o irmão. Mas foi há quase duas décadas que Hamilton recebeu um convite pra lá de especial de seu ídolo.
"Em 2004, aconteceu uma coisa muito emocionante. Morei na França e quando voltei ao Brasil, para o Rio de Janeiro, o Djavan foi um dos primeiros artistas a me convidar para fazer uma gravação, tocar junto. Quando cheguei ao estúdio, ele me ensinou uma música dele, uma que ele fez exclusivamente para eu tocar, gravar. A música nem tinha nome, letra. Se eu pegar a gravação desse disco, que se chama 'Vaidade' (2004), é o bandolim solando, fazendo a melodia inteira e só depois ele vem cantando. Aquilo me deu uma emoção, um cara desse tamanho me dando uma música dele para eu ser o intérprete. Fiquei com o sentimento de gratidão muito grande", recorda o músico, que explica o motivo de sua homenagem a Djavan só acontecer neste momento da carreira.
"No ano passado, fiz um disco autoral, o 'Maxixe Samba Groove', com o qual ganhei o Grammy (Latino), fiz um outro autoral, o 'Flying Chicken', que lancei este ano. Senti que estava amadurecido para fazer esse tipo de música do Djavan, que tem muitos detalhes, tem vários sabores. Tem latino, groove, pop, samba, a música nordestina, sertaneja", destaca.
Ao saber do álbum, o alagoano teve a melhor possível. "Ele topou de primeira participar do álbum, ficou muito agradecido. Falou: 'Ó, pode contar comigo no processo todo, se precisar'. Ofereci as duas canções, 'Luz' e 'Lambada de Serpente', e ele aceitou na hora. Foi super receptivo. Me recebeu na casa dele para gravar no estúdio dele. Só love", recorda. "Não deu pitaco nenhum, não. Só disse: 'Esse disco parece que foi gravado aqui em casa'", completa.
Além do cantor, outros artistas brasileiros e internacionais fazem parte deste projeto, que tem 12 canções, como o cantor Zeca Pagodinho, o uruguaio Jorge Drexler, a cantora Gloria Groove, o pianista cubano Gonzalo Rubalcaba, a saxofonista norte-americana Lakecia Benjamin, a cantora e flautista indiana Varijashree Venugopal e o pianista brasileiro Salomão Soares.
"Talvez o maior desafio tenha sido equilibrar um disco instrumental convidando artistas para manter essa alma intacta do Djavan. Os convidados me ajudaram muito nisso. A Varijashree cantou de uma maneira que levou 'Oceano' para outro lugar. Foi demais a participação dela. O Zeca traz para o Rio de Janeiro o samba do Djavan com aquela malandragem típica do Cacique de Ramos, com aquela divisão rítmica que só ele sabe fazer. O Djavan é como se ele assinasse embaixo. Poxa, gravou, não mudou tom, está cantando nos tons originais... A voz dele está maravilhosa, o tempo só faz a voz dele ficar mais bonita", acredita.
"O Jorge é curioso porque ele é uruguaio e, ao mesmo tempo, a música dele soa muita parecida com a MPB, porque ele gosta muito do Caetano (Veloso), do Djavan, do Gilberto Gil. Ele acabou gravando em português e ficou super charmoso. Faltava uma voz da nova geração e me vem à cabeça a Gloria Groove, que está cantando pra caramba. Quando mostramos o arranjo de 'Samurai', ela colocou pra quebrar. A Lakecia Benjamin que fez a ponte com a gravação original de 'Samurai', porque quem faz a parte instrumental é o Stevie Wonder, e ela já tocou com o Stevie. Tem essa conexão. Ficou um disco multicultural. Foi um processo bem desafiador, mas ao mesmo tempo revelador; de uma música que é brasileira e universal ao mesmo tempo", acrescenta o bandolinista.
Legado na música brasileira e desejos futuros
Bacharel em composição pela Universidade de Brasília, Hamilton tem um grande legado na música brasileira. Já foi indicado 14 vezes ao Grammy Latino, ganhou três estatuetas, incluindo a de melhor álbum instrumental no Grammy Latino de 2022, ganhou o Prêmio da Música Brasileira 12 vezes; entre discos solo, Trio, Quarteto, Quinteto e parcerias, já passou de 40 álbuns; e até criou um novo instrumento a partir de sua maneira de tocar bandolim de 10 cordas.
Entre os feitos deste ano, está uma turnê pelos Estados Unidos, em janeiro e fevereiro, onde tocou, entre outros, no Jazz at Lincoln Center, em Nova York, e no Kennedy Center, em Washington, com o pianista sul-africano Nduduzo Makhathini. Em março, participou do show do Coldplay no Engenhão, na Zona Norte do Rio, no dia 28 de março, ao lado de Milton Nascimento, Seu Jorge, Moreno, Tom e Zeca Veloso, filhos de Caetano Veloso. Em julho, participou de um projeto inédito em Marselha, na França, acompanhado por 100 bandolinistas de todo o mundo.
Questionado se tem mais algo a conquistar na música, Hamilton reflete sobre antigas e novas parcerias. "Sempre falta. Gostaria de tocar de novo com as pessoas que já toquei. Por exemplo, é a terceira vez que eu gravo com o Zeca (Pagodinho) e já quero gravar de novo. Mas, ao mesmo tempo, gostaria de tocar com a orquestra de Berlim, com pessoas de lugares diferentes. Quero tocar e conhecer a galera nova aqui do Brasil mesmo. Estou sempre aberto".
Rodas de samba e choro
Mesmo com uma agenda de shows agitada, Hamilton conta que sempre que é possível tenta curtir uma roda de samba ou choro. "Gosto demais. Gostaria de frequentar mais, mas como viajo muito, frequento menos do que gostaria (risos). Mas quando a galera faz uma roda, eu vou. Isso é o que me alimenta a compor, a trabalhar, são esses encontros. Me lembro de aprender música assim. Meu pai nunca me ensinou música para ser profissional, primeiro ele ensinou pra gente gostar. Ele mostrava pra gente que agregava as pessoas, hoje continua assim. Faço com menos frequência, porque viajo demais. Quando volto ao Rio estou cansado. Às vezes, segunda-feira tem uma roda de samba legal, até mesmo o Renascença, morro de vontade de ficar indo ao Samba do Trabalhador, mas eu chego tão cansado, que descanso. Mas estou sempre aí. Me chama que eu vou nas rodas que eu adoro".
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