Publicado 02/12/2023 06:00 | Atualizado 02/12/2023 12:09
Rio - Diogo Nogueira, de 42 anos, se aprofundou na história do samba como forma de resgatar suas raízes. O resultado de dois anos de trabalho está disponível em "Sagrado", lançado nesta sexta-feira em todas as plataformas digitais, um dia antes do dia nacional do samba, celebrado neste sábado. O artista acredita que o momento ideal para mostrar esse trabalho ao público foi definido pelo "movimento espiritual".
"Acho que tudo tem um movimento espiritual na minha vida. As coisas têm que acontecer do jeito que elas precisam acontecer e no tempo delas. E a minha religião fala muito em tempo, é o tempo quem comanda. Então, a gente vem trabalhando esse álbum há dois anos e tem uma ansiedade para eu lançar, para poder mostrar para as pessoas, muito grande. As coisas foram mudando, as datas de lançamento foram mudando", afirma o artista, que quase fechou uma proposta com uma multinacional, mas no fim decidiu seguir sua carreira de forma independente como faz há seis anos. "O tempo foi exato para cair o dia do lançamento perto do Dia Nacional do Samba. Senhor, muito obrigado. Axé", agradece.
Com oito faixas, o álbum traz o que é sagrado para Diogo, como as rodas de samba, o Flamengo, as memórias de infância e a religião. "Trabalhar esse disco foi gostoso. Trabalhei com muito amor, fazendo pesquisa e repertório, fazendo pesquisa para entender qual nome seria sobre esse trabalho que eu podia mostrar para as pessoas. E sempre, em toda a pesquisa que a gente fazia, sempre caía nas matrizes africanas, nas rodas de umbigada, sempre caía nas rodas de samba da religião africana. Sempre, em todos os momentos. E a gente trouxe um repertório que tem o povo, tem as rodas, tem a família, tem tudo aquilo que é sagrado, não só pra mim, mas pro povo brasileiro. Mesmo passando dificuldade, ele consegue dar um jeito de fazer sua festa, de fazer o seu samba, de fazer suas coisas".
E por falar em festa, não dá para pensar em um dia de sol sem churrasco, cervejinha, amigos e um bom samba. É exatamente esse papel aglutinador do ritmo que Diogo traz na canção "A Boa do Samba (Coisa Boa), parceria de Junior Dom, Daniel de Oliveira e Alexandre Chacrinha. "A minha família toda é de muitas festas. Meu pai é festeiro, minha mãe adora festas, então as festas lá em casa duravam dias. Herdei isso também. Adoro fazer festa, me juntei com uma pessoa (a atriz Paolla Oliveira, sua namorada) que ama festa também, ficou perfeito. Quando a gente se junta para fazer uma festa, vira uma festa de verdade. Sou um cara muito agregador".
Questionado se gosta de ir à rodas de samba, Nogueira admite. "Gostaria de frequentar mais, porque depois que você vira a celebridade fica difícil de ir. Mas amo. Há pouco tempo fui no samba do Trabalhador, para matar um pouco dessa saudade. Não fui para cantar. Fomos eu e Paolla para gente realmente se divertir e cair no samba, de verdade", relembra.
João Nogueira presente
Faixa inédita de "Sagrado", "Meu Samba Anda Por Aí" traz a voz João Nogueira, pai de Diogo, em rara gravação caseira, feita nos anos 70. O sambista morreu em junho de 2000, aos 58 anos, devido a um infarto. "Essa música digo que foi uma coisa muito espiritual. Acho que foi mandada por ele", acredita o Diogo, que 'achou' uma mensagem antiga de João Martins com a canção, quando estava em reunião de escolha de repertório com seus produtores. "Quando a gente começou a ouvir, foi emocionante, todo mundo na mesa começou a chorar. E essa música do álbum era a única garantida porque não tinha escolhido nenhuma música. Ela traz uma emoção, ainda mais quando você escuta a voz do meu pai, muito presente... Acho que ela fecha esse primeiro volume com chave de ouro. É uma forma de agradecimento por tudo que o meu pai e minha família construíram durante esses anos de história, de família Nogueira".
À Moda Antiga
Os amores duradouros também são abordados no disco. O cantor admite que é um homem "à moda antiga", título de uma das canções deste trabalho. "Totalmente. Adoro entregar flores, bombom, chocolates, joias, cantar...", enumera ele, que tem Paolla Oliveira como fonte de inspiração para compor. "Flor de Caña', por exemplo, foi em homenagem à amada. Os dois estão juntos desde 2021.
"Tem mais música. Eu terminei uma música com o Moacyr Luz. E foi justamente uma música que eu comecei a fazer no pé do ouvido da Paolla", comenta o sambista, sem dar mais detalhes sobre a obra. "Isso é para um outro trabalho, né? Eu já terminei esse trabalho, estou entregando esse trabalho. Mas já estou pensando no próximo. Provavelmente, vai ser um disco totalmente autoral", adianta.
Intolerância Religiosa
A canção "Ciência da Paz" cita casos de intolerância e racismo contra as religiões brasileiras de matrizes afro-indígenas. Candomblecista, Diogo revela se já foi vítima de intolerância e se conhece alguém que já foi vítima de discriminação.
"Conheço várias pessoas. Meu pai de santo já sofreu várias vezes. Eu já sofri, até porque na internet você acaba sofrendo. Agora fisicamente, graças a Deus, ainda não. Mas se você for ver desde o post que eu fiz (no dia 17 de outubro, em que fala sobre sua religião), você vai encontrar ali várias mensagens bizarras".
Ele ainda diz se isso lhe afeta de alguma maneira. "São comentários rasos. As pessoas não tem menor discernimento sobre o que é, cada um tem que ter a sua religião, respeitar a opinião do outro e respeitar a sua opinião. E está tudo certo, a gente não precisa se agredir, se xingar por conta de religião, de cor, de qualquer outra coisa. O importante disso tudo é que as pessoas se revisitaram, olharem para o seu interior, entenderem que não é só o seu que é poderoso", reflete.
Sambistas da nova geração
Referência no samba, Diogo Nogueira acompanha os artistas da nova geração do ritmo. "No samba, eu sou parceiro e amigo do Arlindinho. O Arlindinho é maravilhoso. Gosto muito de dois partideiros, que são o Juninho Thybau, o Mosquito... Tem o Gabrielzinho do Irajá, o Mingo Silva, que eu sou fã. Gosto muito do Baiaco, João Martins, Inácio Rios... Tem uma galera, cara. É só a galera colocar o ouvido. Tem essência e qualidade".
Carnaval 2024
Grande apaixonado por samba-enredo e o Carnaval carioca, o cantor comenta sua relação com as agremiações do grupo especial. "A gente tem a escola do coração, mas a gente é que nem aquela mãe: existe a mãe de sangue e existe a mãe que te acolhe. Então é mais ou menos assim que eu levo a vida no Carnaval. Eu sou apaixonado pela Portela, a história da Portela é uma das mais lindas do Carnaval. A Mangueira vem com a Marrom (Alcione), uma homenagem linda, super merecida. É uma personagem fundamental na minha construção de carreira. Muito importante", comenta ele, que também acompanhou a namorada, Paolla Oliveira, Rainha da Grande Rio, neste ano, na Avenida.
"Tem que ganhar a que fizer o desfile mais lindo na Sapucaí. Isso é o barato da coisa. Existe a disputa, mas eu sou um apaixonado por samba-enredo e carnaval. Eu tenho a minha escola do coração, mas eu tenho as minhas escolas de coração", finaliza, aos risos.
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