FeyjãoThiago Bruno/ TB Studios
Publicado 27/10/2024 05:00
Rio - Amigo de longa data de Regina Casé, Feyjão mudou de vida através da música. Natural de Campo Grande, na Zona Oeste do Rio, o músico relata que começou a trabalhar cedo e teve diversos empregos antes de se consolidar como cantor e compositor. Em entrevista exclusiva ao Meia Hora, o artista dá detalhes de como foi fazer o samba-enredo da Unidos da Tijuca, em parceria com Anitta, Estevão Ciavatta, Miguel PG, Fred Camacho e Diego Nicolau, trabalho no sitcom "Tô Nessa", na TV Globo, e planos futuros. Confira a entrevista!
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 Você é um dos autores do samba-enredo da Unidos da Tijuca. Como foi essa parceria com a Anitta e outros compositores?
O processo de criação foi todo feito a distância com a Anitta e com os outros compositores presencialmente. A gente se reunia na casa do Estevão e da Regina Casé, onde escrevíamos o samba juntos. A gente conseguiu chegar nesse resultado que ficou muito legal, mesmo passando por esse processo moderno e inusitado. E o que inspirou essa parceria foi por conta do Fred Camacho, que me procurou perguntando se eu conhecia a Anitta, disse que sim e ele me fez um convite para escrever o samba-enredo da Unidos da Tijuca. Eu, que nunca tinha feito samba-enredo, de cara topei. Ele me falou para tentarmos fazer com a Anitta, porque ela é filha de Logun-Edé, e seria o enredo desse ano da Unidos da Tijuca. Eu servi meio que de 'ponte' e conectei o Estevão, que também é filho de Logun-Edé e amigo da artista. Então, era mais uma força para ela se sentir à vontade. E a gente, junto com a Regina, ligamos de chamada de vídeo, para fazer esse primeiro convite. Ela (Anitta) contou que já tinha ouvido falar que o enredo era do orixá dela. Alguém já tinha a convidado, mas não se sentiu à vontade. Mas com a gente, que ela super conhecia, topou em fazer e calhou esse desafio.

- O que você espera da escola de samba Unidos da Tijuca para o carnaval de 2025 com seu samba-enredo na agremiação?
Espero que em 2025 tenhamos um Carnaval lindo. A gente já pode ver alguns protótipos de fantasia e esqueleto de carros alegóricos que estão sendo construídos lindamente. O enredo está incrível, o orixá tem as cores da escola, que são lindas, o amarelo ouro e o azul pavão. A agremiação está prometendo construir um carnaval histórico e a gente pode ter uma grande surpresa na Avenida. A volta da Unidos da Tijuca para estar ali entre as primeiras e quem sabe a primeira colocada do Carnaval. Acho que a escola, como diz no âmbito de samba-enredo, 'vem nas cabeças'.

- A Unidos da Tijuca vai levar para a Sapucaí o enredo "Logun-Edé – Santo Menino que Velho Respeita". O que você achou da escolha?
Achei a escolha perfeita da escola de conectar com esse tema. Falar do orixá que tem as cores da bandeira do pavilhão da escola e que tem uma história de culto completamente brasileira. Um orixá que atravessou da África para o Brasil, mas é cultuado no Brasil, conecta a escola de volta com um tema Afro. O Carnaval e o Candomblé são a mesma coisa, e acho que isso conecta a escola com as suas raízes, a ancestralidade dos seus fundadores e componentes, sendo um tema muito assertivo. Fico muito feliz de ter contribuído.
 Você é um homem de fé?
Sou um homem de muita fé desde sempre. Fui criado na casa da minha avó, com um terreiro de Candomblé nos fundos, porque a minha tia mais velha é mãe de santo. Então, cresci praticamente dentro de um terreiro. Depois de ter ficado distante, quando adulto, me reconectei e estou cada vez mais próximo da minha religião. Acredito que a fé realmente move montanhas, acredito muito no poder de fazer o bem e o quanto isso reflete na vida da gente. Então, eu sou um mensageiro de bem e um homem de fé.

Você faz parte da banda do sitcom 'To Nessa'. Como tem sido essa experiência profissional?
Na verdade, eu fui responsável pela produção musical do programa 'To nessa', além de só tocar. Eu dividia a produção musical com o parceiro Nani Palmeira e foi incrível dublar com ele. Então, não só faço parte do elenco quanto usei a banda ali, ao vivo, para fazer a sonoplastia do programa inteiro. Todas as coisas que acontecem, as reações, tudo é feito com um som ao vivo. Está sendo uma experiência incrível e vale a pena conferir.

Você e a Regina são amigos de longa data. Como é a relação de vocês?
Minha relação com a Regina é uma coisa meio transcendental. Parece que a gente tem 'um sangue'. Eu passo Natal com eles, Ano Novo com eles, principalmente quando minha mãe faltou. E ela tem muito essa figura maternal, uma pessoa que quer ensinar, mostrar caminho. A Regina mudou completamente o rumo da minha vida profissional e está ali como uma das pessoas mais importantes da minha vida.

Como se sente sendo considerado praticamente um "filho" de Regina Casé?
A gente é amigo desde 2008, quando Douglas Silva me apresentou a Regina, então, somos sim amigos de longa data. Mas essa relação se intensificou muito nos últimos oito anos e eu, realmente, me sinto parte da família dela. Isso é engrandecedor com relação a tudo que ela me proporciona conhecer, tanto de ensinamento que vem dali.
 Quais são os planos para o futuro com a música?
Eu tenho planos de gravar um disco com músicas inéditas, com novas canções que estou compondo para isso. Tenho um projeto de gravar o meu show. Um baile com um repertório muito eclético e eu nunca registrei isso em áudio ou vídeo. Então esse é o meu projeto para o final do ano. E para o ano que vem, um disco de novas canções que estou produzindo. 

Teria alguém que te inspire como cantor?
Eu tenho várias inspirações. Mas o cantor que me inspira é o Luiz Melodia, que tem uma imagem parecida com a que eu tenho, fisicamente falando. Um homem que vem do samba, mas não ficou rotulado como um cantor de samba. Tem muitas coisas nele que me inspiram desde a voz até a melodia, canções e letras, e o lugar que ele ocupou na carreira. Além dele, tem o Seu Jorge, Djavan e Gilberto Gil, sendo minhas inspirações maiores.

Como sua relação com a música começou? Quando deu aquele estalo de que você queria ser cantor?
Minha relação com a música começa com 14 anos. No primeiro ano do ensino médio, conheci um amigo que levava um cavaquinho para escola. Ele fazia aula e levava. Eu ficava pedindo para me ensinar o que tinha aprendido e ele virou meu professor. Quando viu que eu levava jeito, começou a me dar aula de verdade na casa dele. Eu ia toda sexta-feira com a minha bicicletinha ter uma aula com ele. Foi quando comecei a me desenvolver sozinho, a ter um grupinho de samba com meus amigos no bairro. E, depois de muitos anos, eu me vi como cantor quando eu quis começar e compor e mostrar minhas canções, vi que precisaria começar a aprimorar e tocar e a cantar.

Teve muitas outras profissões antes de brilhar como cantor? Quais? E quais lembranças e aprendizados você tem desta época?
Eu fui cobrador da van do meu bairro ganhava 20 centavos em cada passagem por dia, trabalhando aos finais de semana, porque durante a semana eu estudava, minha mãe sempre priorizou meus estudos. Depois eu fui office boy de uma indústria plástica em Campo Grande. Ao mesmo tempo que eu era office boy, as pessoas queriam tirar foto comigo na rua porque eu trabalhava com música aos finais de semana, e o grupo era meio famoso no meu bairro. Depois eu fui militar do exército, fiz o curso de oficial da reserva, fiz CPOR (Centro de Preparação de Oficiais da Reserva do Rio de Janeiro). Sou pedagogo, e tive um projeto cultural educacional, que se chamava 'EducaSamba', onde eu juntava minha vivência de samba e minha vontade de educar, e tinha um musical contando a história dos surgimentos dos carnavais, fazendo um link entre os sambas-enredos, com conteúdo didáticos como manifestações culturais, religiosas e personalidades históricas. Os meus aprendizados dessas vivências todas, tão diferentes da outra, é que quanto mais conhecimento, quanto mais abrangência de conhecimento você tenha, só vai te ajudar para qualquer coisa que você fizer na vida. E hoje eu uso tudo isso na construção da minha música e no jeito de comunicá-la, e de entender as pessoas em ambientes tão diferentes.
*Reportagem da estagiária Mariana Amaral, sob supervisão de Isabelle Rosa
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