Livro ’Herança e Testamento’ foi lançado no Brasil em outubro de 2022Divulgação
Publicado 31/03/2023 15:57
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Rio - “Herança e Testamento” é o primeiro livro da autora norueguesa Vigdis Hjorth a ser traduzido no Brasil. A obra, que chegou ao país em outubro do ano passado pela editora HarperCollins, tem como protagonista Bergljot, uma mulher de meia-idade que passou por um grande trauma na infância.

Quando os pais de Bergljot, que já estão na casa dos 80 anos, decidem, ainda em vida, resolver as questões da herança e fazer um testamento para dividir os bens entre seus quatro filhos, Bergljot precisa reviver o trauma que lhe foi infligido e lidar com o apagamento de sua história pela família.

Logo de início, tudo que o leitor sabe é que Bergljot passou por um grande trauma aos 5 anos de idade e, há cerca de 23 anos, decidiu que seria melhor para sua saúde mental cortar qualquer tipo de relacionamento com os pais e os irmãos. Ela é apenas relativamente bem sucedida nisso, já que sua mãe e uma das irmãs ainda tentam entrar em contato com ela de tempos em tempos.

Certo dia, Bergljot recebe um email da mãe afirmando que a herança será dividida igualmente entre os quatro irmãos. Bergliot se dá por satisfeita, já que pensava que seria deserdada por conta de seu afastamento. Pouco depois, com a morte do pai, vem à tona o fato de que na verdade os pais de Bergljot passaram para o nome das duas filhas mais novas, Astrid e Asa, dois chalés muito queridos por toda a família. O irmão mais velho, Bard, e Bergljot receberiam apenas uma compensação irrisória pelos chalés e o restante da herança seria dividido igualmente entre os quatro.

Quando Bard se revolta com a injustiça da situação, Bergljot, que não queria se meter em disputas pela herança, acaba tomando partido do irmão e se vê dragada de volta aos seus traumas.

Vigdis Hjorth faz um trabalho magistral ao retratar como é difícil para a protagonista repetir inúmeras vezes o que aconteceu com ela e ser sempre silenciada ou ter sua dor diminuída, sendo considerada até mesmo egoísta por não querer retomar o convívio familiar. A narrativa não é linear, o que promove muitos saltos e retrocessos na história, que é cíclica, mostrando o tempo todo a angústia da protagonista que não tem voz.

Apesar de certamente já imaginar desde as primeiras páginas o que aconteceu com Bergljot dos 5 aos 7 anos de idade, o leitor só tem essa confirmação da metade para o final do livro. Estamos o tempo todo na mente de uma protagonista traumatizada, que vai tateando a própria história pelas beiradas, até não ser mais possível se calar e deixar de nomear e de identificar o que aconteceu.

Vigdis Hjorth confirma que o livro tem similaridades com a sua vida, mas garante que não é inspirado nela e que não se trata de uma biografia. É um romance, de acordo com a autora. Fato é que após o lançamento de “Herança e Testamento”, uma das irmãs de Vigdis lançou um livro em resposta à obra.

O livro é certeiro ao mostrar que pessoas que viveram uma mesma situação ou que conviveram em um mesmo espaço e tempo têm pontos de vistas diferentes sobre determinado acontecimento comum e que esses diferentes olhares podem ser genuínos ou ter o objetivo de esconder algo. Além disso, ele escancara o descrédito com que vítimas geralmente são tratadas ao contar sua história. 
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