Publicado 12/04/2022 12:56 | Atualizado 12/04/2022 12:57
A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) reconheceu o vínculo de emprego entre um motorista de aplicativo e a Uber. Para a maioria do colegiado, estão presentes, no caso, os elementos que caracterizam a relação de emprego: a prestação de trabalho por pessoa humana, com pessoalidade, onerosidade, não eventualidade e subordinação.
Na reclamação trabalhista, o motorista, de Queimados, na Região Metropolitana do Rio, disse que trabalhara para a plataforma digital durante dois meses, após comprar um veículo enquadrado nos padrões da Uber. Segundo seu relato, ele atuava de segunda a sábado, totalizando 13 horas diárias e 78 semanais, sempre monitorado de forma online pelo aplicativo. No terceiro mês, foi desligado imotivadamente.
A Uber, em sua defesa, sustentou que não houve nenhum acordo para pagamento de comissões sobre o valor das viagens. Para a empresa, na realidade, quem a contratou foi o motorista, que, em contraprestação ao uso da plataforma digital, concordara em pagar o valor correspondente a 20% ou 25% de cada viagem. Por fim, alegou que o motorista assumira todos os riscos do negócio.
O Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (RJ) negou o vínculo de emprego, por entender que a Uber é uma empresa de tecnologia, e não de transporte. De acordo com a decisão, o motorista tinha plena liberdade de definir os dias e os horários de trabalho e descanso e a quantidade de corridas, não recebia ordens e fazia, por contra própria, a manutenção de seu veículo.
O relator do recurso de revista do motorista, ministro Mauricio Godinho Delgado, observou que a solução do caso exige o exame e a reflexão sobre as novas e complexas fórmulas de contratação da prestação laborativa, distintas do sistema tradicional, e que se desenvolvem por meio de plataformas e aplicativos digitais, softwares e produtos semelhantes, “todos cuidadosamente instituídos, preservados e geridos por sofisticadas (e, às vezes, gigantescas) empresas multinacionais e, até mesmo, nacionais”.
O relator do recurso de revista do motorista, ministro Mauricio Godinho Delgado, observou que a solução do caso exige o exame e a reflexão sobre as novas e complexas fórmulas de contratação da prestação laborativa, distintas do sistema tradicional, e que se desenvolvem por meio de plataformas e aplicativos digitais, softwares e produtos semelhantes, “todos cuidadosamente instituídos, preservados e geridos por sofisticadas (e, às vezes, gigantescas) empresas multinacionais e, até mesmo, nacionais”.
Embora essa nova estrutura facilite a prestação de serviços, o ministro pondera que a lógica de seu funcionamento tem sido apreendida por grandes corporações como oportunidade para reduzir suas estruturas e o custo do trabalho. A seu ver, a discussão deve ter como ponto de partida a função civilizatória do direito do trabalho.
Godinho Delgado lembrou que não há legislação que regule a questão de motoristas de aplicativo, visando assegurar direitos a essa categoria que já alcançava cerca de um milhão de profissionais no Brasil, antes da pandemia. “Cabe, portanto, ao magistrado fazer o enquadramento das normas no fato”, destacou.
Godinho Delgado lembrou que não há legislação que regule a questão de motoristas de aplicativo, visando assegurar direitos a essa categoria que já alcançava cerca de um milhão de profissionais no Brasil, antes da pandemia. “Cabe, portanto, ao magistrado fazer o enquadramento das normas no fato”, destacou.
Elementos da relação de trabalho
Nesse sentido, o ministro assinalou que a relação empregatícia ocorre quando estão reunidos seus cinco elementos fático-jurídicos constitutivos: prestação de trabalho por pessoa física a outrem, com pessoalidade, não eventualidade, onerosidade e sob subordinação. Todos eles, a seu ver, estão fortemente comprovados no caso.
Em relação à pessoalidade, os elementos demonstram que o motorista se inscrevera na Uber mediante cadastro individual, com a apresentação de dados pessoais e bancários, e era submetido a um sistema de avaliação individualizada, a partir das notas atribuídas pela clientela.
A onerosidade, por sua vez, decorre do repasse de 70% a 80% do valor pago pelos passageiros. Essa percentagem elevada se justificaria pelo fato de o motorista ter de arcar com todos os custos do transporte (manutenção do veículo, gasolina, provedor de internet, celular, etc.).
No entender do relator, a não eventualidade também ficou comprovada: embora a relação tenha perdurado por menos de dois meses, durante esse período, o serviço foi prestado permanentemente todos os dias, com controle da plataforma sobre o tempo à sua disposição. Finalmente, sobre a subordinação, o ministro considera que o monitoramento tecnológico, ou “subordinação algorítmica”, talvez seja superior a outras situações trabalhistas tradicionais.
Ficou vencido, no julgamento, o ministro Agra Belmonte, para quem a questão envolve um fenômeno mundial e um novo modelo de relação de trabalho com muitas questões ainda não decididas pela legislação brasileiro. O ministro entende que, para decidir pelo reconhecimento do vínculo, seria necessário o reexame de fatos e provas, procedimento vedado pela Súmula 126 do TST.
Com o reconhecimento de vínculo, a Turma determinou o retorno dos autos à 66ª Vara do Trabalho do Rio de Janeiro (RJ), para o prosseguimento da análise dos demais pedidos.
Nesse sentido, o ministro assinalou que a relação empregatícia ocorre quando estão reunidos seus cinco elementos fático-jurídicos constitutivos: prestação de trabalho por pessoa física a outrem, com pessoalidade, não eventualidade, onerosidade e sob subordinação. Todos eles, a seu ver, estão fortemente comprovados no caso.
Em relação à pessoalidade, os elementos demonstram que o motorista se inscrevera na Uber mediante cadastro individual, com a apresentação de dados pessoais e bancários, e era submetido a um sistema de avaliação individualizada, a partir das notas atribuídas pela clientela.
A onerosidade, por sua vez, decorre do repasse de 70% a 80% do valor pago pelos passageiros. Essa percentagem elevada se justificaria pelo fato de o motorista ter de arcar com todos os custos do transporte (manutenção do veículo, gasolina, provedor de internet, celular, etc.).
No entender do relator, a não eventualidade também ficou comprovada: embora a relação tenha perdurado por menos de dois meses, durante esse período, o serviço foi prestado permanentemente todos os dias, com controle da plataforma sobre o tempo à sua disposição. Finalmente, sobre a subordinação, o ministro considera que o monitoramento tecnológico, ou “subordinação algorítmica”, talvez seja superior a outras situações trabalhistas tradicionais.
Ficou vencido, no julgamento, o ministro Agra Belmonte, para quem a questão envolve um fenômeno mundial e um novo modelo de relação de trabalho com muitas questões ainda não decididas pela legislação brasileiro. O ministro entende que, para decidir pelo reconhecimento do vínculo, seria necessário o reexame de fatos e provas, procedimento vedado pela Súmula 126 do TST.
Com o reconhecimento de vínculo, a Turma determinou o retorno dos autos à 66ª Vara do Trabalho do Rio de Janeiro (RJ), para o prosseguimento da análise dos demais pedidos.
Uber
A Uber esclarece que vai recorrer da decisão, que além de não ser unânime representa entendimento isolado e contrário a todos os cinco processos que já haviam sido julgados, de forma unânime, pelo próprio Tribunal - o mais recente deles em novembro.
Como destacou o ministro Belmonte em seu voto na quarta-feira passada, 6, as provas reunidas no processo demonstram a inexistência do vínculo de emprego entre o motorista e a Uber. No processo, o próprio motorista reconheceu, em depoimento à Justiça, que não recebeu nenhum tipo de ordem, nem teve nenhum tipo de supervisão, nos 57 dias em que usou o aplicativo da Uber até sua conta ser desativada por violação aos Termos de Uso da plataforma - aos quais todos aderem no momento do cadastro.
Belmonte destacou que essas provas foram detalhadamente analisadas pelo Tribunal Regional do Trabalho do Rio de Janeiro, que, fundamentado nelas, negou a existência de vínculo tanto na primeira como na segunda instância, considerando que o motorista "possuía plena autonomia para definir os dias e horários de trabalho e descanso" e que "não recebia ordens nem precisava prestar relatórios de seu trabalho".
Citando as novas possibilidades de trabalho trazidas pela tecnologia, Belmonte lembrou que desde a chegada da empresa ao Brasil diversas pessoas que já tinham emprego passaram a usar o aplicativo para ter uma ocupação alternativa. "Era muito comum, em se tratando de Uber, que muita gente alugasse carro de fim de semana para poder trabalhar dessa maneira", afirmou. Entre os exemplos citados pelo ministro estão porteiros que usam o aplicativo para complementar a renda dirigindo carros emprestados.
Nos primeiros votos do julgamento, iniciado em 2020, os ministros Mauricio Godinho e Alberto Bresciani aparentemente descartaram as provas do processo e se basearam exclusivamente em concepções ideológicas sobre o modelo de funcionamento da Uber e sobre a atividade exercida pelos motoristas parceiros no Brasil.
Na última sessão, em dezembro de 2021, os ministros fizeram exposição citando temas relacionados ao constitucionalismo humanista, a filmes cinematográficos sobre a digitalização da sociedade e à reestruturação do sistema capitalista, porém pouco espaço foi dedicado ao caso concreto. Os ministros também citaram decisões judiciais de outros países - algumas das quais foram inclusive revogadas - na contramão de entendimento já expressado no próprio TST de que decisões estrangeiras não devem influenciar o Judiciário brasileiro por serem criadas em "ordens jurídicas absolutamente distintas".
Na sessão de quarta-feira passada, 6, até mesmo o ministro Mauricio Godinho destacou que não há legislação no país regulamentando o novo modelo de trabalho por meio de plataformas.
Como destacou o ministro Belmonte em seu voto na quarta-feira passada, 6, as provas reunidas no processo demonstram a inexistência do vínculo de emprego entre o motorista e a Uber. No processo, o próprio motorista reconheceu, em depoimento à Justiça, que não recebeu nenhum tipo de ordem, nem teve nenhum tipo de supervisão, nos 57 dias em que usou o aplicativo da Uber até sua conta ser desativada por violação aos Termos de Uso da plataforma - aos quais todos aderem no momento do cadastro.
Belmonte destacou que essas provas foram detalhadamente analisadas pelo Tribunal Regional do Trabalho do Rio de Janeiro, que, fundamentado nelas, negou a existência de vínculo tanto na primeira como na segunda instância, considerando que o motorista "possuía plena autonomia para definir os dias e horários de trabalho e descanso" e que "não recebia ordens nem precisava prestar relatórios de seu trabalho".
Citando as novas possibilidades de trabalho trazidas pela tecnologia, Belmonte lembrou que desde a chegada da empresa ao Brasil diversas pessoas que já tinham emprego passaram a usar o aplicativo para ter uma ocupação alternativa. "Era muito comum, em se tratando de Uber, que muita gente alugasse carro de fim de semana para poder trabalhar dessa maneira", afirmou. Entre os exemplos citados pelo ministro estão porteiros que usam o aplicativo para complementar a renda dirigindo carros emprestados.
Nos primeiros votos do julgamento, iniciado em 2020, os ministros Mauricio Godinho e Alberto Bresciani aparentemente descartaram as provas do processo e se basearam exclusivamente em concepções ideológicas sobre o modelo de funcionamento da Uber e sobre a atividade exercida pelos motoristas parceiros no Brasil.
Na última sessão, em dezembro de 2021, os ministros fizeram exposição citando temas relacionados ao constitucionalismo humanista, a filmes cinematográficos sobre a digitalização da sociedade e à reestruturação do sistema capitalista, porém pouco espaço foi dedicado ao caso concreto. Os ministros também citaram decisões judiciais de outros países - algumas das quais foram inclusive revogadas - na contramão de entendimento já expressado no próprio TST de que decisões estrangeiras não devem influenciar o Judiciário brasileiro por serem criadas em "ordens jurídicas absolutamente distintas".
Na sessão de quarta-feira passada, 6, até mesmo o ministro Mauricio Godinho destacou que não há legislação no país regulamentando o novo modelo de trabalho por meio de plataformas.
Em todo o país, já são mais de 1,8 mil decisões de Tribunais Regionais e Varas do Trabalho reconhecendo não haver relação de emprego com a plataforma.
Os motoristas parceiros não são empregados e nem prestam serviço à Uber: eles são profissionais independentes que contratam a tecnologia de intermediação digital oferecida pela empresa por meio do aplicativo. Os motoristas escolhem livremente os dias e horários de uso do aplicativo, se aceitam ou não viagens e, mesmo depois disso, ainda existe a possibilidade de cancelamento. Não existem metas a serem cumpridas, não se exige número mínimo de viagens, não existe chefe para supervisionar o serviço, não há obrigação de exclusividade na contratação da empresa e não existe determinação de cumprimento de jornada mínima.
Segundo a empresa, o próprio TST já afastou em cinco julgamentos a existência de vínculo de emprego entre a Uber e os parceiros.
Segundo a empresa, o próprio TST já afastou em cinco julgamentos a existência de vínculo de emprego entre a Uber e os parceiros.
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