Programa Auxílio BrasilMarcello Casal Jr/Agência Brasil
Publicado 19/06/2022 12:15
Brasília - Os municípios de todo o país contabilizam uma demanda reprimida de 2,78 milhões de famílias para ter acesso ao Auxílio Brasil. Os dados foram divulgados neste domingo, 19, pelo Estadão com base em mapeamento da Confederação Nacional de Municípios (CNM).
"Pelos dados da CNM, entre março e abril, a demanda reprimida subiu em velocidade que se aproxima dos dados apurados antes da migração do programa Bolsa Família, extinto no ano passado, para o Auxílio Brasil, que era de 3,1 milhões de famílias. De um mês para o outro, houve um aumento real de mais de 1,480 milhão de famílias à espera do benefício."
Sendo assim, a fila praticamente dobra de tamanho em apenas um mês, um crescimento de 116%. Salta de 1,307 milhões de famílias (2,1 milhões de pessoas) para 2,788 milhões de famílias (5,3 milhões de pessoas), faltando pouco mais de 401 mil famílias para se atingir o patamar anterior à transição dos programas.
A velocidade do crescimento da demanda reprimida vem surpreendendo e preocupando os prefeitos, que na ponta sentem as cobranças da população na esteira do aumento da pobreza nas suas localidades. É nos municípios que as famílias fazem o cadastramento ao programa no Centro de Referência da Assistência Social (Cras) para ter acesso à rede de proteção social do país.
Enquanto as prefeituras alertam para a necessidade de reforçar o programa, especialistas defendem uma grande mobilização para enfrentar o aumento da fome. Eles apontam falhas no desenho dos benefícios do Auxílio Brasil e chamam atenção para a necessidade de direcionar recursos ao Alimenta Brasil, programa de aquisição de alimentos de agricultores familiares e doação para famílias em situação de insegurança alimentar.

Com a falta de exposição de dados pelo Ministério da Cidadania, responsável pela gestão do Auxílio Brasil, a CNM resolveu seguir com um acompanhamento próprio da situação nos 5.570 municípios.
O presidente da CNM, Paulo Ziulkoski, atribui a ausência de dados amplos à conjuntura eleitoral. “Dentro do possível eles vão escondendo, mas nós na ponta podemos levantar e mostrar”, diz. “E vai piorar ainda mais até a eleição”, prevê. Segundo ele, o quadro preocupa porque a fila, que tinha diminuído no início do ano, já voltou ao patamar anterior. O problema acaba estourando nas prefeituras, reclama o presidente da entidade, que reúne prefeituras de todo o País. De acordo com Ziulkoski, as escolas municipais acabam se transformando em refúgio para as crianças que chegam com fome e precisam de reforço alimentar antes de começar as aulas.

Disparada na fila

O estudo aponta que a previsão orçamentária para o Auxílio Brasil deste ano não é mais suficiente para zerar essa fila. O orçamento previsto é de R$ 89 bilhões.

Em 2021, dados disponibilizados por meio de consulta pública e coletados pela CNM, mostravam mais de 25 milhões de famílias registradas no Cadastro Único, o correspondente a cerca de 75 milhões de pessoas. Já em 2022, o número cresce e passa dos 33 milhões de famílias ou 83 milhões de pessoas. É um pouco mais de 38% da população brasileira (de 215 milhões de habitantes em 2021) procurando os programas oficiais de assistência social.

Falhas
As falhas de desenho do programa têm contribuído para acentuar os problemas. Entre elas, a decisão de garantir um benefício mínimo de R$ 400 por mês para cada família. Essa regra tem feito com que um beneficiário que mora sozinho acabe recebendo o mesmo valor que uma mãe com dois filhos pequenos. Esse modelo funciona, na prática, como um incentivo para pessoas que moram juntas se cadastrem como se morassem separadas, recebendo R$ 800. Esse quadro pode acabar deixando de fora do programa famílias que mais precisam.

"Além do desenho nada equitativo, o piso de R$ 400 gera incentivos para que pessoas que moram juntas se cadastrem separadamente. É uma espécie de desmembramento de famílias, que prejudica enormemente a qualidade dos dados do Cadastro Único e, com isso, sua capacidade de direcionar as políticas públicas à população mais vulnerável", diz Leticia Bartholo, socióloga e especialista em políticas públicas e gestão governamental. É ex-secretária nacional adjunta de Renda de Cidadania.
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