Publicado 08/10/2022 06:00
Neste sábado, 8 de outubro, é comemorado o Dia do Nordestino. Entretanto, para muitos, a data não tem sido motivo de comemoração após o aumento no número de ataques que nordestinos vem sofrendo desde a confirmação do segundo turno para as eleições presidenciais.
Na última segunda, 3, a central da organização não-governamental de proteção dos Direitos Humanos, Safernet Brasil, recebeu cerca de 14 denúncias de xenofobia por hora. Ao todo, foram 348 registros no dia após o primeiro turno das eleições. O número quase supera o total de reclamações registrado nos primeiros seis meses do ano passado (358). No domingo, dia do pleito, foram registradas 10 denúncias.
Para o professor de Ciência Política da UFF, Marcus Ianoni, o fato do candidato petista ter sido amplamente vitorioso no Nordeste levantou questões xenofóbicas contra a região. Lula obteve 67% dos votos válidos nas cidades do Nordeste e ganhou em todos os estados da região conquistando uma vantagem de 10,96% dos votos em relação ao atual Presidente.
"Todas as regiões têm especificidades e o Nordeste não é diferente. Uma delas é o nível de pobreza e miséria em algumas áreas. Há um ataque dos bolsonaristas e do próprio presidente Bolsonaro à expressão democrática do voto nordestino, procurando desqualificar a capacidade da escolha política desses eleitores em função deles serem, supostamente, pobres, miseráveis e ignorantes. Trata-se de uma disputa política acirrada e lamentavelmente levanta um preconceito de xenofobia" comentou.
Em sua live da última quarta-feira, 5, Bolsonaro chegou a associar a votação de seu oponente ao analfabetismo e culpou o PT por índices negativos na região. "Lula venceu em 9 dos 10 estados com maior taxa de analfabetismo. Você sabe quais são esses estados? No nosso Nordeste", declarou.
Para o cientista político Guilherme Carvalhido, Bolsonaro, diretamente, não incita ataques xenofóbicos. "Acontece ao redor do presidente, com grupos que o apoiam. Mas diretamente o presidente não instiga isso. Ele pode dar comunicação nesse sentido, mas apontá-lo como xenofóbico não! Porque não há ações nesse aspecto", afirma.
Carvalhido relembra que a xenofobia em relação à região não é algo originário da atual disputa política. "Na estrutura de classe brasileira regional, os mais ricos tendem a culpar os mais pobres pela condição nacional, o que é inadequado! Porque conduz a uma estrutura de classe que não representa o que as pessoas pensam de fato. E isso já acontece há muito tempo", comenta.
Em 2010, após a eleição de Dilma Rousseff com grande parte dos votos do Nordeste, um caso viralizou e ficou famoso nas redes sociais. Uma estudante de direito postou a seguinte frase no Twitter: "Faça um favor a SP: mate um nordestino afogado".
Lier Pires Ferreira, Prof. Titular do Ibmec-RJ, comenta que as redes sociais ainda são vistas como um território livre para todo tipo de expressão preconceituosa ou criminosa. "Embora isso não seja exatamente uma verdade, é fato que muito do que se posta nas redes sociais está sob o manto da anonimidade. Dessa forma, muitos se sentem livres, para, nas redes sociais, expressar rancores, sentimentos e preconceitos profundos, irredentos, que, na vida social comum, presencial, identificada, não têm coragem de expressar. A identificabilidade é, de fato, um freio para a externalização dos preconceitos, do lado perverso, sombrio, que muitos ostentam. Por isso, as redes sociais são um risco potencial para a explosão da xenofobia e outras formas cruéis e criminosas de preconceito, como a LGBTQIA+fobia, o racismo, o machismo etc", explica.
O professor ainda alerta que muitas pessoas, de forma consciente ou não, deixam de filtrar as informações que recebem de amigos, grupos de relacionamento, influenciadores e outros que, em diferentes escalas, atuam nas redes sociais. "Por vezes, temos a impressão de que aquilo que vem pelas redes cola como chiclete. Assim, por serem espaços de formação de opinião, relativamente livres, com baixa regulamentação, de difícil persecução e de forma muitas vezes anônima, inclusive pela presença de perfis falsos, as redes sociais podem, sim, influenciar fortemente o aumento da xenofobia", declara.
Lembrando que xenofobia é crime, previsto no artigo 140 do Código Penal. Incitar discriminação a nordestinos ou a pessoas de qualquer outra região, pode resultar em reclusão de 1 a 3 anos, mais multa. Se o crime for praticado na internet, se torna qualificado e a pena varia de 2 a 5 anos de reclusão, mais multa. As denúncias do crime cometido nas redes, podem ser feitas no site denuncie.org.br, a plataforma da Safernet que atua em parceria com o Ministério Público Federal. O Disque 100, também recebe denúncias de violação dos Direitos Humanos.
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