Restrição ao aborto no sul dos EUA lota clínicas na Flórida

Várias mulheres de estados conservadores viajam pelo país em busca do procedimento

Veto ao aborto nos estados do sul dos EUA lota clínicas na FlóridaCHANDAN KHANNA / AFP
Publicado 16/08/2022 12:50
A médica D. nunca teve tanto trabalho com agora. A clínica de abortos onde atua, em Jacksonville (Flórida), está tomada por pacientes de estados que restringiram amplamente a interrupção voluntária da gravidez após uma polêmica decisão da Suprema Corte americana.

"Antes, em dia típico havia 25 pacientes, agora atendo cerca de 45. Há muita procura", lamenta esta médica que prefere manter o anonimato por medo de ameaças de militantes antiaborto. Apesar de reduzir o prazo para o procedimento de 24 a 15 semanas, a Flórida é agora o estado onde ficou mais fácil interromper uma gestação no sudeste dos Estados Unidos.

A seu redor, outros estados de maioria conservadora como Luisiana, Mississípi, Alabama e Geórgia proibiram quase por completo a prática ou reduziram seu prazo para seis semanas, depois que a Suprema Corte revogou em 24 de junho o direito ao aborto em nível federal.

Esta decisão tem levado muitas mulheres a procurar clínicas na Flórida, entre elas, o centro onde trabalha D., que é de propriedade da ONG Planned Parenthood, uma dos maiores prestadoras de serviços reprodutivos do país. "Estamos em uma situação desesperadora. Eu a chamaria de emergência de saúde pública", disse Laura Goodhue, diretora-executiva da aliança de afiliados desta organização na Flórida.

A Planned Parenthood se viu obrigada a abrir suas portas nos finais de semana e a ampliar sua jornada de trabalho até 12 horas em algumas clínicas, diante do aumento de pacientes, em sua maioria da Geórgia, Alabama e Texas. Também será preciso contratar novos médicos. Muitos destes profissionais viajam à Flórida vários dias por semana de estados onde não podem mais trabalhar, explica Goodhue.

Muitos obstáculos
As pacientes de outros estados precisam se ausentar vários dias do trabalho, já que a nova lei da Flórida exige que a mulher faça duas consultas com pelo menos 24 horas de intervalo entre elas antes de realizar um aborto. Também devem encontrar um jeito de viajar e se hospedar em outro estado e, em alguns casos, procurar alguém que cuide de seus filhos. A série de obstáculos se soma à redução do prazo legal para abortar na Flórida.

"Infelizmente, se fizermos uma ecografia e virmos que já tem mais de 15 semanas, não podemos ajudá-las e temos que encaminhá-las a outros estados. E isso prolonga ainda mais sua jornada para conseguir um atendimento de saúde essencial", explica a médica D. 
Cerca de 450 km ao sul de Jacksonville, na clínica da Planned Parenthood em West Palm Beach, Jasmine (pseudônimo) está prestes a se submeter a um aborto cirúrgico. Ela tem 23 anos e engravidou quando rompeu o preservativo do rapaz com quem ela saía há três meses. A pílula do dia seguinte que comprou pela internet chegou tarde demais.

Ela pensou muito antes de decidir, mas preferiu abortar para terminar seus estudos. "É o melhor para mim, ainda que seja uma decisão difícil", garante. "O erro de uma noite não precisa mudar minha vida para sempre", justificou. Jasmine mora na Flórida e não pode nem imaginar a experiência vivida por quem viaja de outro estado para o procedimento. Mas ainda assim, sofreu as incertezas e o stress gerados pela decisão da Suprema Corte. "Na Flórida, temos até 15 semanas, e isso poderia ter mudado a qualquer momento, como nos demais estados. Foram muitas lágrimas e muito nervosismo", lembra.
Leia mais

Você pode gostar

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor.

Publicidade

Últimas notícias

Restrição ao aborto no sul dos EUA lota clínicas na Flórida | Mundo e Ciência | O Dia [an error occurred while processing the directive] [an error occurred while processing the directive] [an error occurred while processing the directive]

Restrição ao aborto no sul dos EUA lota clínicas na Flórida

Várias mulheres de estados conservadores viajam pelo país em busca do procedimento

Veto ao aborto nos estados do sul dos EUA lota clínicas na FlóridaCHANDAN KHANNA / AFP
Publicado 16/08/2022 12:50
A médica D. nunca teve tanto trabalho com agora. A clínica de abortos onde atua, em Jacksonville (Flórida), está tomada por pacientes de estados que restringiram amplamente a interrupção voluntária da gravidez após uma polêmica decisão da Suprema Corte americana.

"Antes, em dia típico havia 25 pacientes, agora atendo cerca de 45. Há muita procura", lamenta esta médica que prefere manter o anonimato por medo de ameaças de militantes antiaborto. Apesar de reduzir o prazo para o procedimento de 24 a 15 semanas, a Flórida é agora o estado onde ficou mais fácil interromper uma gestação no sudeste dos Estados Unidos.

A seu redor, outros estados de maioria conservadora como Luisiana, Mississípi, Alabama e Geórgia proibiram quase por completo a prática ou reduziram seu prazo para seis semanas, depois que a Suprema Corte revogou em 24 de junho o direito ao aborto em nível federal.

Esta decisão tem levado muitas mulheres a procurar clínicas na Flórida, entre elas, o centro onde trabalha D., que é de propriedade da ONG Planned Parenthood, uma dos maiores prestadoras de serviços reprodutivos do país. "Estamos em uma situação desesperadora. Eu a chamaria de emergência de saúde pública", disse Laura Goodhue, diretora-executiva da aliança de afiliados desta organização na Flórida.

A Planned Parenthood se viu obrigada a abrir suas portas nos finais de semana e a ampliar sua jornada de trabalho até 12 horas em algumas clínicas, diante do aumento de pacientes, em sua maioria da Geórgia, Alabama e Texas. Também será preciso contratar novos médicos. Muitos destes profissionais viajam à Flórida vários dias por semana de estados onde não podem mais trabalhar, explica Goodhue.

Muitos obstáculos
As pacientes de outros estados precisam se ausentar vários dias do trabalho, já que a nova lei da Flórida exige que a mulher faça duas consultas com pelo menos 24 horas de intervalo entre elas antes de realizar um aborto. Também devem encontrar um jeito de viajar e se hospedar em outro estado e, em alguns casos, procurar alguém que cuide de seus filhos. A série de obstáculos se soma à redução do prazo legal para abortar na Flórida.

"Infelizmente, se fizermos uma ecografia e virmos que já tem mais de 15 semanas, não podemos ajudá-las e temos que encaminhá-las a outros estados. E isso prolonga ainda mais sua jornada para conseguir um atendimento de saúde essencial", explica a médica D. 
Cerca de 450 km ao sul de Jacksonville, na clínica da Planned Parenthood em West Palm Beach, Jasmine (pseudônimo) está prestes a se submeter a um aborto cirúrgico. Ela tem 23 anos e engravidou quando rompeu o preservativo do rapaz com quem ela saía há três meses. A pílula do dia seguinte que comprou pela internet chegou tarde demais.

Ela pensou muito antes de decidir, mas preferiu abortar para terminar seus estudos. "É o melhor para mim, ainda que seja uma decisão difícil", garante. "O erro de uma noite não precisa mudar minha vida para sempre", justificou. Jasmine mora na Flórida e não pode nem imaginar a experiência vivida por quem viaja de outro estado para o procedimento. Mas ainda assim, sofreu as incertezas e o stress gerados pela decisão da Suprema Corte. "Na Flórida, temos até 15 semanas, e isso poderia ter mudado a qualquer momento, como nos demais estados. Foram muitas lágrimas e muito nervosismo", lembra.
Leia mais

Você pode gostar

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor.

Publicidade

Últimas notícias