O Iraque continua sob tensão por uma crise política que deixou o país sem governo desde as legislativas de outubro de 2021 AFP
Publicado 30/08/2022 14:16
Bagdá - Apoiadores de Moqtada Sadr deixaram nesta terça-feira, 30, a Zona Verde de Bagdá depois que o líder xiita pediu o fim dos confrontos com o exército, que deixaram 30 mortos e centenas de feridos na segunda-feira. O violento embate foi protagonizado pelos seguidores de Sadr e facções xiitas apoiadas pelo Irã. Considerada a região mais segura da capital, o Centro de Bagdá virou uma praça de guerra, com troca de tiros em barricadas dos dois lados.
Nesta terça-feira, momentos depois do discurso de Sadr ser transmitido ao vivo pela TV, seus apoiadores começaram a abandonar a Zona Verde. Minutos depois, o exército levantou o toque de recolher que havia decretado em todo o país.
Sadr, um pregador com milhões de seguidores que liderou uma milícia contra os ocupantes após a invasão do Iraque liderada pelos Estados Unidos em março de 2003, deu a seus seguidores "60 minutos" para se retirarem, ameaçando "desautorizar" aqueles que ficassem.
"Peço desculpas ao povo iraquiano, o único afetado pelos acontecimentos", disse Sadr a repórteres de sua base na cidade iraquiana de Nayaf (centro).
Ao menos 30 de seus seguidores morreram nos confrontos e 570 ficaram feridos, segundo fontes médicas. Um balanço interior apontava para 23 mortos.
O Iraque continua sob tensão por uma crise política que deixou o país sem governo, sem primeiro-ministro e sem presidente desde as legislativas de outubro de 2021.
Na segunda-feira, a tensão aumentou bruscamente quando os partidários de Sadr invadiram o Palácio da República dentro da Zona Verde, após o anúncio de seu líder de que deixaria a política.
Durante a noite, houve disparos contra a Zona Verde, que abriga estabelecimentos do governo e missões diplomáticas. Os protestos começaram quando Sadr anunciou inesperadamente sua "retirada definitiva" da política.
Os confrontos continuaram nesta terça entre os apoiadores de Sadr contra o exército e os homens das Unidades de Mobilização Popular (Hashed al Shabi), ex-paramilitares apoiados pelo Irã, que depois se integraram às forças iraquianas.
A Missão da ONU de Assistência no Iraque (Unami) classificou os fatos como "uma escalada extremamente perigosa" e pediu a todas as partes que "se abstenham de atos que possam levar a uma cadeia implacável de eventos".
Nesta terça-feira aconteceu na cidade sagrada xiita de Najaf um funeral para alguns dos manifestantes mortos em Bagdá, que contou com uma multidão. Segundo testemunhas, os apoiadores de Sadr e de um grupo xiita rival, o Marco de Coordenação, pró-iraniano, trocaram disparos em Bagdá.
O Marco de Coordenação condenou um "ataque às instituições estatais" e pediu aos sadristas que comecem um diálogo. O primeiro-ministro interino Mustafa al-Kadhemi, por sua vez, disse que "as forças militares, de segurança e os homens armados" estão proibidos de abrir fogo contra os manifestantes.
Os Estados Unidos também pediram calma em meio aos relatos "preocupantes" sobre a situação, enquanto a França pediu "às partes que exerçam moderação máxima".
Pouco depois de Sadr anunciar sua renúncia na segunda-feira, seus apoiadores invadiram o Palácio da República em Bagdá, onde geralmente acontecem as reuniões do gabinete.
Sadr, um homem-chave na cena política do país devastado pela guerra, embora nunca tenha participado diretamente do governo, pediu no fim de semana a "todos os partidos", incluindo o seu, que renunciassem aos seus cargos no governo para ajudar a resolver a crise política.
Nas eleições legislativas de outubro de 2021, o bloco de Sadr ficou inicialmente com 73 cadeiras (de 329), mas por não conseguir formar uma maioria, fez seus deputados renunciarem em junho, alegando querer "reformar" o sistema e acabar com a corrupção.
A renúncia fez o Marco de Coordenação se tornar o principal partido político. Antes de seu anúncio na segunda-feira, Sadr, um líder muito influente e imprevisível, aumentou a pressão nas últimas semanas e há um mês seus apoiadores acampam em frente ao Parlamento, bloqueando brevemente o acesso ao máximo órgão judicial do país.
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