Publicado 06/08/2023 19:26 | Atualizado 06/08/2023 19:28
O calor excepcional do inverno nas montanhas andinas da América do Sul chegou a 37°C, o que levou os cientistas locais a alertarem que o pior ainda está por vir, já que a perturbação climática causada pelo homem e o El Niño causam estragos em toda a região.
A onda de calor na região central dos Andes chilenos está derretendo a neve abaixo de 3 mil metros, o que terá efeitos colaterais para as pessoas que vivem nos vales a jusante e que dependem da água do degelo durante a primavera e o verão.
A terça-feira, 1º de agosto, foi provavelmente o dia de inverno mais quente no norte do Chile em 72 anos, de acordo com Raul Cordero, cientista climático da Universidade de Groningen, que disse que os 37°C registrados na estação Vicuña Los Pimientos, na região de Coquimbo, foram causados por uma combinação de aquecimento global, El Niño e rajadas de vento do leste, conhecidas pelos habitantes locais como vento Terral, que trazem clima quente e seco.
Dezenas de estações de monitoramento meteorológico a mais de mil metros de altitude registraram temperaturas acima de 35ºC no inverno, de acordo com o blog Extreme Temperatures Around The World.
Cordero disse que o calor incomum nessa altitude era uma preocupação. "O principal problema é como as altas temperaturas exacerbam as secas (no leste da Argentina e do Uruguai) e aceleram o derretimento da neve."
A escassez de água já é um problema terrível na capital do Uruguai, Montevidéu, e nos arredores, onde os reservatórios estão secando e a água da torneira não é mais potável.
A América do Sul sofreu um dos períodos mais quentes de janeiro a julho já registrados.
O Chile está entre os países mais afetados, com incêndios no início do ano e agora com secas prolongadas. Cordero disse que Santiago estava sufocando em sua nona onda de calor desde janeiro e que deveria quebrar o recorde anual de dez ondas de calor, estabelecido em 2020.
Marcos Andrade, diretor de física atmosférica da Universidad Mayor de San Andrés, em La Paz, disse que o platô andino na Bolívia e no Peru também registrou um clima "incomum" desde o início do ano.
"Em Puno, do outro lado do Lago Titicaca, o mês de janeiro foi o mais seco desde o início dos registros, há 59 anos. Em maio, tivemos uma tempestade com 20% da precipitação anual habitual", disse ele. "O inverno também foi excepcionalmente quente. Batemos recordes de temperatura em algumas partes do país."
Ele expressou preocupação com a possibilidade de piora à medida que o hemisfério sul se aproxima do verão. "O El Niño geralmente atinge seu pico no final do ano. Acho que ainda não vimos todos os efeitos."
Recordes de calor foram quebrados em várias cidades do Brasil, Argentina e Uruguai. Karla Beltrán, consultora ambiental, disse que este ano Buenos Aires também registrou a temperatura mais alta de sua história, 38,6°C, em 11 de março, enquanto a cidade de Mercedes, no Uruguai, atingiu um novo pico de 40,5°C.
Ela disse que a onda de calor estava de acordo com o último relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, que observou que a parte sul da América do Sul era particularmente vulnerável a episódios de altas temperaturas.
Estudos demonstraram que o norte da América do Sul, incluindo a região amazônica e a costa do Pacífico até o deserto de Atacama, sofrerá ondas de calor mais frequentes e intensas.
"Com a chegada do fenômeno El Niño, espera-se que nos próximos anos essa região sofra um aumento nas já altas temperaturas, tornando necessária a adoção de medidas de adaptação para evitar mortes e desastres maiores", disse ela.
Chico Geleira, professor de climatologia e oceanografia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e vice-diretor do Centro Polar e Climático do Brasil, disse que as tendências são preocupantes. "Sem dúvida, os registros de temperatura máxima no inverno no Chile e, até certo ponto, na América do Sul são atípicos", disse ele.
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