Publicado 01/09/2023 10:37
"Vi uma cabeça decepada e muitas outras atrocidades", conta o ucraniano Ivan Ishchenko, que desertou no ano passado depois de um mês no front, embora tenha sido forçado a pagar uma fortuna em subornos e sofrido infâmia.
Assim como ele, outros homens inicialmente determinados a combater a invasão russa preferiram fugir da violência da guerra, usando as redes de corrupção que corroem o país.
"Eu costumava pensar que era um super-herói, mas quando você vê a guerra pessoalmente, percebe que não tem nada a ver com ela", disse à AFP o homem de 30 anos. Para deixar a guerra, ele pagou 5.000 dólares (24.606 reais na cotação atual) em subornos.
Um carro com placa do governo deixou-o em uma floresta perto da Hungria, onde cruzou a fronteira de forma clandestina através de um buraco em uma cerca.
Por causa da guerra, os ucranianos com idades entre 18 e 60 anos não têm o direito de sair do território, exceto com autorização especial.
Os desertores são punidos com até 12 anos de prisão e aqueles que se opõem ao serviço militar podem ser condenados a cinco anos de prisão. Ishchenko agora está forçado ao exílio. Circula pela Europa e atualmente está em Dresden, no leste da Alemanha.
Embora a invasão russa tenha unido a nação, alguns preferem partir. Desde o início da guerra, 13.600 pessoas que tentavam deixar o país clandestinamente foram detidas, segundo o porta-voz da guarda de fronteira, Andri Demshenko.
Outras 6.100 foram detidas com documentos falsificados, o que dá uma ideia da magnitude do fenômeno, embora a AFP não tenha obtido das autoridades globais estatísticas sobre todos aqueles que conseguiram evitar os combates.
O presidente ucraniano, Volodimir Zelensky, abordou publicamente o problema no início de agosto, demitiu todos os oficiais de recrutamento regionais e 200 centros foram revistados. Ele denunciou a corrupção na administração dos recrutas, qualificando-a de "traição".
Este tipo de solução não é nova e a corrupção é endêmica na Ucrânia há décadas.
"Todo mundo conhece alguém que pode ajudar", confirma à AFP outro exilado, que se apresenta como Ivan e prefere não revelar o sobrenome.
Ele foi dispensado em maio graças a um atestado médico falso, pelo qual pagou 5 mil dólares. "Sei que é errado", confessa o jovem de 24 anos.
Os ucranianos que se recusam a lutar enfrentam a culpa quando encontram compatriotas no oeste europeu. É o caso de Yevgen Kuruch, que muitas vezes se encontra em situações embaraçosas ao volante do seu táxi em Varsóvia.
"Disseram-me 'os nossos maridos estão lutando no front e vocês, covardes, estão escondidos!'", contou o oficial da reserva de 38 anos, que estava na Polônia quando a guerra começou e se recusou a voltar ao seu país.
Um homem da sua idade não passa despercebido entre o milhão de ucranianos acolhidos na Polônia. Metade dos refugiados são crianças e mais de 75% dos adultos são mulheres separadas dos seus cônjuges, recrutados para a guerra. Ele entende que se trata de uma questão "dolorosa" e "conflitante".
"Sei que tenho que defender o meu país, mas a minha família precisa de mim e tenho o dever de cuidar dela", afirma.
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