O filho de Nora Cortiñas desapareceu em 1977Madres de Plaza de Mayo/Divulgação
Publicado 30/05/2024 21:13
Nora Cortiñas, integrante histórica das Mães da Praça de Maio, que desafiou a ditadura argentina e acompanhou as principais lutas pelos direitos humanos, morreu aos 94 anos, nesta quinta-feira, 30, informou, em nota, a organização Avós da Praça de Maio.

"Com dor profunda, nos despedimos da nossa irmã de luta, Nora Cortiñas, referência indiscutível do movimento pelos direitos humanos na Argentina", diz o documento divulgado pelo Avós na plataforma X.

Norita, como todos a conheciam, somou-se a um grupo de mulheres que se conheceram implorando às autoridades da ditadura militar (1976-1983) para saber o destino de seus filhos, arrancados de seus lares ou levados presos por forças de segurança.

Seu filho Gustavo estava prestes a completar 25 anos, era militante da Juventude Peronista (JP) em um bairro pobre de Buenos Aires e trabalhava no instituto de estatísticas Indec, quando foi sequestrado por um grupo militar. Ele é um dos 30 mil desaparecidos que, segundo organizações de defesa dos direitos humanos, a ditadura deixou na Argentina.
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Assim, esta mulher pequena e enérgica nascida em 22 de março de 1930, mãe de dois filhos e psicóloga social de profissão, começou a trabalhar na que se tornaria mundialmente conhecida como a organização Mães da Praça de Maio, sendo uma das principais defensoras do movimento.

"Na minha casa, em 15 de abril de 1977, passou um tsunami, afetou todos nós", disse em 2019, ao apresentar sua biografia, "Norita, la madre de todas las batallas".

Exceto pelas viagens para divulgar sua luta pelo mundo, por mais de quatro décadas Norita nunca faltou às marchas das quintas-feiras ao redor da Pirâmide da Praça de Maio.

"Cada coisa que [nós,] as Mães [da Praça de Maio] fazemos é coletiva. Começamos indo à praça uma a uma, mas depois isto se transformou em um movimento coletivo. Vamos todas as quintas-feiras à praça, não faltamos", explicava.
Isso não impediu que em 1986, já na democracia, ela fosse uma das impulsionadoras da divisão da organização humanitária e se transformasse em uma das faces visíveis do Mães da Praça de Maio-Linha Fundadora, que enfrentou duramente o setor mais radicalizado, liderado por Hebe de Bonafini, falecida em 2022.

Também foi uma opositora ferrenha do governo do atual presidente, Javier Milei, que questionou o número de desaparecidos e relativizou o terrorismo de Estado cometido pela ditadura.

"A muitos políticos, à Igreja, aos militares, ao campo dos que têm história vivida de cumplicidades, não agrada nossa reivindicação", resumia esta mulher, crítica de todos os governos.

Em 2018, quando eclodiu na Argentina a luta feminista com a reivindicação pela legalização do aborto e contra a violência de gênero, Norita se somou a esta reivindicação e passou a adicionar o lenço verde, símbolo do movimento, a seu vestuário.

Mas sempre voltava ao seu filho desaparecido: "Vocês nos veem sorrir, vamos a mobilizações com a alegria da luta, mas sentimos falta dos nossos filhos todos os dias".
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