Imagem computadorizada do coronavírusReprodução
Publicado 01/07/2024 16:36
Brasília - É enganoso que o governo indiano tenha pedido pena de morte para Soumya Swaminathan, ex-cientista-chefe da OMS, por propagar desinformação contra ivermectina no tratamento de covid-19. Além de a ivermectina ser um remédio contra parasitas e vermes e não ter eficácia comprovada contra o Sars-CoV-2, um vírus, o órgão citado em site cujo texto viralizou não representa o poder público indiano. A Indian Bar Association é uma associação voluntária de advogados e não funciona como uma "OAB indiana", diferentemente do que afirmam os posts enganosos.
Publicidade
Conteúdo investigado: Matéria do site The People’s Voice reproduzida nas redes sociais afirma que a Índia pediu pena de morte para "cientista da OMS que bloqueou o acesso à ivermectina" para tratamento da covid-19.

Onde foi publicado: X, TikTok e Telegram.

Conclusão do Comprova: Post engana ao apontar que a Índia processou e pediu pena de morte para ex-cientista-chefe da Organização Mundial de Saúde (OMS), Soumya Swaminathan, por desincentivar o uso de ivermectina no tratamento da covid-19. O medicamento, que atua contra parasitas e vermes, não tem eficácia comprovada contra o Sars-CoV-2.

O texto do portal The People’s Voice, site conservador que espalhou a desinformação, afirma que o suposto processo foi movido pela Ordem dos Advogados do país. No entanto, a organização citada, Indian Bar Association (IBA), ou Ordem dos Advogados da Índia em português, não tem ligação com o governo do país.

Embora tenha esse nome, a IBA é uma associação voluntária de advogados e não funciona como uma "OAB indiana", como indicam posts. Na Índia, a associação que tem papel similar ao da Ordem dos Advogados do Brasil é o Bar Council of India.

A IBA enviou um aviso legal para a cientista em 26 de maio de 2021, em que acusa Swaminathan, que trabalhou como cientista-chefe da OMS durante a pandemia, de propagar desinformação contra ivermectina, e outro em 14 de setembro de 2022, por "divulgar a narrativa de que as vacinas contra a covid-19 são completamente seguras". Essas notificações, ao contrário do que diz postagem, não equivalem a um processo na Justiça. O conteúdo também foi investigado pelo Estadão Verifica. Ao jornal, a OMS afirmou que não recebeu qualquer processo formal contra a cientista.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até 28 de junho, um post no X com a desinformação tinha sido visualizado mais de 95 mil vezes e recebido 9 mil curtidas. No TikTok, post semelhante foi retirado do ar.

Fontes que consultamos: Buscamos pela publicação completa no site que aparece na captura de tela. A partir do texto, procuramos no site da India Bar Association informações sobre processos e outros documentos emitidos pela organização. Também entramos em contato com a OMS e a IBA, mas não houve resposta até a publicação deste texto.

Organização já fez outras notificações contra a cientista
Durante a pandemia, a IBA se mostrou atuante contra a vacinação e a favor de tratamentos sem eficácia comprovada contra a covid, como a hidroxicloroquina e a ivermectina.

A primeira notificação legal contra Soumya Swaminathan foi em 25 de maio de 2021. No comunicado, a associação acusa a autoridade em saúde de "realização de uma campanha de desinformação contra Ivermectina por supressão deliberada da eficácia do medicamento ivermectina como profilaxia e para tratamento de covid-19, apesar da existência de grandes quantidades de dados clínicos compilados e apresentado por médicos conceituados, altamente qualificados e experientes médicos e cientistas".

O texto se refere a uma postagem no X onde a médica reforça o posicionamento da OMS e compartilha declaração da farmacêutica Merck, responsável pela produção do Stromectol (ivermectina), que alerta para a falta de comprovação científica e dados sobre a segurança do medicamento no tratamento contra a covid. A postagem em questão não está mais disponível.

Na notificação, a IBA cita a Front Line Covid-19 Critical Care Alliance (FLCCC), organização que defende o uso de medicamentos ineficazes, e integrantes da aliança, como os médicos Pierre Kory e Paul E. Marik, que já foram citados em outras checagens do Comprova. O grupo brasileiro Médicos pela Vida também é citado.

Em 13 de junho, menos de um mês depois, os advogados voltaram a emitir notificação legal contra Swaminathan, o diretor-geral da OMS, Dr. Tedros Adhanom Ghebreyesus, e o membro da Direção Geral dos Serviços de Saúde (DGHS) do governo da Índia, Sunil Kumar, em que volta a acusar as autoridades de disseminar desinformação contra a ivermectina.

Pouco depois, em 13 de julho, a India Bar Association apresentou uma queixa formal contra autoridades de saúde e outros divulgadores científicos, entre eles a associação de Bill Gates, por "conspiração e ofensas graves cometidas contra a humanidade na pandemia de covid-19".

O documento pede que os acusados sejam incriminados por "crime contra a humanidade" e que a prisão seja garantida pela Interpol. Os advogados afirmam que Swaminathan, Tedros Adhanom, Bill Gates, Anthony Fauci, Mark Zuckerberg e outros "são culpados de assassinatos em massa e estarão sujeitos à pena de morte" sem direito a fiança.

Por que o Comprova investigou essa publicação: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, saúde, mudanças climáticas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O mesmo conteúdo foi verificado por Estadão Verifica e Boatos.org. O uso da ivermectina contra a covid já foi investigado diversas vezes, como quando o Comprova mostrou que um estudo realizado em Itajaí (SC) não provava a eficácia do medicamento e que um post desinformava ao afirmar que pesquisa havia descoberto relação entre a droga e a covid longa.
Leia mais