Publicado 14/06/2022 06:00
Registro, para não soar paradoxal, que o presente artigo pretende atingir os homens. Portanto, e não poderia ser diferente, é um manexplainingtomen. A ideia de que as representações de gênero são socialmente construídas foi bem sintetizada em frase de Simone de Beauvoir: “Não se nasce mulher, torna-se mulher”. Da mesma forma, não se nasce homem, torna-se homem.
Assim, partindo-se dessa concepção – e centralizando o argumento na dicotomia homem-mulher –, temos na sociedade patriarcal uma desigualdade de tratamento dispensada a esses dois gêneros, privilegiando-se o masculino e inferiorizando-se o feminino.
Essa desvalorização social da mulher persiste de diversas maneiras. Afinal, embora pareça coisa do passado, ainda existe casamento infantil, mutilação genital feminina e restrição de estudo a meninas e mulheres.
A inferiorização ocorre também de formas mais sutis, como aquelas entranhadas na cultura, que são refletidas na linguagem, em ditados populares, em letras de músicas e em muitas situações que colocam as mulheres em desvantagem. Um desses cenários que reforçam que homem e mulher estão em uma relação de dominância e subordinação é designado pela palavra manterrupting, que é quando uma mulher é interrompida por um homem. Essa interferência, além de inconveniente, traz embutida a mensagem de que a fala dela não tem importância.
Outra situação, que guarda alguma semelhança com a anterior, é o mansplaining, que é quando um homem explica o óbvio ou então expõe algum assunto que é dominado por sua interlocutora. Vejamos três exemplos dessa atitude imprópria, que poderia ser chamada de momento do pavão sem noção.
Tasha Stanton, neurocientista e professora da Universityof South Australia, estava em uma conferência da Australian Physiotherapy Association quando recebeu a dica de outro participante para ler um paper que havia sido escrito por ela mesma. Claro que o homem não havia percebido que sua colega de conferência e a escritora do texto sugerido eram a mesma pessoa, tendo ficado visivelmente surpreso quando se deu conta disso.
Exemplo de mansplaining com trança semelhante está no livro 'Os homens explicam tudo para mim', de Rebecca Solnit, que conta que estava em uma festa na casa de alguém importante e, ao conversar com o anfitrião, recebeu dele a indicação de ler o livro que ela própria havia escrito e, mesmo diante da repetida informação de ser Rebecca a autora, ele continuava insistindo na recomendação da leitura.
O terceiro e último caso foi apresentado pela jornalista Natacha Cortéz, no artigo 'Mansplaining ou a (nem sempre) sutil maneira de calar uma mulher', publicado na Revista Marie Claire, retirado do Twitter de @mari_fonseca: “um desconhecido na farmácia já quis me explicar o que era um AVC. Eu sou médica.”
Tanto o manterrupting quanto o mansplaining são formas de silenciamento da mulher – a reforçar a cultura da proeminência masculina – e, portanto, inadequados e, tomara que logo, anacrônicos.
Pedindo licença às mulheres, endereço esta mensagem aos homens praticantes dessas duas modalidades socialmente danosas, na expectativa de contribuir para a reflexão sobre a importância de se ouvir o outro, no caso, as mulheres, sem interromper nem subestimar. Aos demais, minhas escusas por só ter tratado do óbvio.
Essa desvalorização social da mulher persiste de diversas maneiras. Afinal, embora pareça coisa do passado, ainda existe casamento infantil, mutilação genital feminina e restrição de estudo a meninas e mulheres.
A inferiorização ocorre também de formas mais sutis, como aquelas entranhadas na cultura, que são refletidas na linguagem, em ditados populares, em letras de músicas e em muitas situações que colocam as mulheres em desvantagem. Um desses cenários que reforçam que homem e mulher estão em uma relação de dominância e subordinação é designado pela palavra manterrupting, que é quando uma mulher é interrompida por um homem. Essa interferência, além de inconveniente, traz embutida a mensagem de que a fala dela não tem importância.
Outra situação, que guarda alguma semelhança com a anterior, é o mansplaining, que é quando um homem explica o óbvio ou então expõe algum assunto que é dominado por sua interlocutora. Vejamos três exemplos dessa atitude imprópria, que poderia ser chamada de momento do pavão sem noção.
Tasha Stanton, neurocientista e professora da Universityof South Australia, estava em uma conferência da Australian Physiotherapy Association quando recebeu a dica de outro participante para ler um paper que havia sido escrito por ela mesma. Claro que o homem não havia percebido que sua colega de conferência e a escritora do texto sugerido eram a mesma pessoa, tendo ficado visivelmente surpreso quando se deu conta disso.
Exemplo de mansplaining com trança semelhante está no livro 'Os homens explicam tudo para mim', de Rebecca Solnit, que conta que estava em uma festa na casa de alguém importante e, ao conversar com o anfitrião, recebeu dele a indicação de ler o livro que ela própria havia escrito e, mesmo diante da repetida informação de ser Rebecca a autora, ele continuava insistindo na recomendação da leitura.
O terceiro e último caso foi apresentado pela jornalista Natacha Cortéz, no artigo 'Mansplaining ou a (nem sempre) sutil maneira de calar uma mulher', publicado na Revista Marie Claire, retirado do Twitter de @mari_fonseca: “um desconhecido na farmácia já quis me explicar o que era um AVC. Eu sou médica.”
Tanto o manterrupting quanto o mansplaining são formas de silenciamento da mulher – a reforçar a cultura da proeminência masculina – e, portanto, inadequados e, tomara que logo, anacrônicos.
Pedindo licença às mulheres, endereço esta mensagem aos homens praticantes dessas duas modalidades socialmente danosas, na expectativa de contribuir para a reflexão sobre a importância de se ouvir o outro, no caso, as mulheres, sem interromper nem subestimar. Aos demais, minhas escusas por só ter tratado do óbvio.
Wagner Cinelli de Paula Freitas é desembargador do TJRJ e autor dos livros “Sobre ela: uma história de violência” e “Metendo a colher”.
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