Publicado 29/07/2024 00:00
A ansiedade excessiva nas crianças, associada à insônia e hiperatividade, desponta como uma epidemia silenciosa no mundo. Um estudo recente publicado na Universidade de Michigan, Estados Unidos, mostra que dos pais de 781 crianças avaliados, cerca de 25% deles revelam que seus filhos apresentam dificuldade para iniciar ou manter o sono, além de acreditarem que suas crianças sofrem de ansiedade.

Num primeiro momento, ficamos tentados a imediatamente culpar as novas tecnologias ou lembrarmos com saudosismo de nossa própria infância. Porém, precisamos reconhecer que, na maioria das vezes, as crianças são espelhos do comportamento dos próprios pais e a ansiedade delas é, no fundo, o reflexo de uma dinâmica familiar ansiosa.

Sabemos que hoje, em média, cerca de 10% da população brasileira adulta tem o diagnóstico de transtorno ansioso, o que representa quase 20 milhões de pessoas, segundo a OMS. Certamente, muitas delas possuem filhos, que reproduzem a ansiedade dos pais, o que repercute em insônia, comportamentos excessivamente agitados, transtornos alimentares, de conduta e dificuldade para prestar atenção.

Notem que consideramos apenas o diagnóstico de ansiedade dos pais para ilustrar essa reflexão. Mas temos crianças cujos progenitores são dependentes químicos, possuem um transtorno grave de humor, de personalidade ou quadros de psicose. Temos, ainda, o impacto das novas tecnologias. Por exemplo: a Academia Americana de Pediatria recomenda que crianças abaixo de 18 meses evitem exposição a telas e aquelas de 18 a 24 tenham no máximo uma hora por dia. E quando nos referimos à tela, falamos do celular, da TV, do computador e do tablet.

Há também outros desafios importantes, como, por exemplo, a exposição a conteúdos inadequados para a idade da criança. Por isso, é importante que os pais entendam como funcionam os dispositivos de controle para conteúdo dos celulares e das plataformas digitais. Outro ponto importante se refere ao horário destinado a esse tipo de interação. Quanto mais próximo do horário de dormir, maior o impacto no sono.

Dentre os diversos fatores que podem contribuir para a ansiedade na infância, vale a pena ainda explorarmos o tema da “criança produtiva e futura empreendedora”. Se a pressão pelo sucesso já é, muitas vezes, cansativa na vida adulta, imagine na infância. Muitas vezes encontramos crianças com agendas dignas de um executivo de multinacional.

Por fim, em muitos casos, a ajuda de um profissional especialista é necessária, ainda que a causa da ansiedade não seja estritamente de natureza biológica. Na maioria dos casos de ansiedade e insônia na infância, mudanças de comportamento orientadas por um psicólogo especialista nessa faixa etária já serão suficientes. Além do tratamento dos próprios pais, claro.
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* Ricardo Patitucci é psiquiatra e diretor-técnico da Clínica da Gávea
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