Publicado 14/08/2024 00:00
A virada para a década de 1960 é central para o esporte no Brasil: no futebol, por exemplo, a seleção conquistou pela segunda vez consecutiva a Copa do Mundo, na edição do Chile, em 1962. As vitórias e o desenvolvimento da tecnologia podem induzir à suposição de que a cobertura televisiva foi fraca no início da segunda metade do século XX. No entanto, o sucesso da conjugação entre imagens, oralidade e disputas das diferentes modalidades remete aos primeiros instantes das transmissões no país.

O Dia da TV, comemorado em 10 de agosto, caiu em meio às Olimpíadas de Paris em 2024. Modalidades tão diversas quanto surfe, skate, ginástica artística e o próprio futebol causaram o maravilhamento do público a partir do começo do calendário olímpico. Mesmo diante da digitalização, que estimula a concorrência dos canais tradicionais com as plataformas de streaming, a combinação dos registros visuais com as narrações em tempo real recupera as paixões dos primeiros telespectadores, ainda em 1950.

Os indícios dessa relação apontam para os antecedentes da Grande Resenha Facit – programa para comentários na televisão que reunia à mesa nomes como o do dramaturgo Nelson Rodrigues, do jornalista Armando Nogueira e os dos técnicos João Saldanha e Flávio Costa. Por anos, esses debates da década de 1960, que vieram a público pela TV Rio e pela TV Globo, foram reconhecidos pelo pioneirismo no gênero televisivo. Pesquisas e relatos de profissionais que cobriram o esporte coincidiam nesse sentido.

Estudos recentes indicam, contudo, que já nos anos 1950 havia programas do mesmo tipo: a exemplo da Mesa Redonda da TV Record, que carregava o nome pelo qual as discussões com comentaristas, distribuídos em torno de uma bancada para analisar o esporte, ficaram conhecidas. A presença do gênero televisivo antecede a profusão de troféus alcançados depois da virada para a década de 1960. E a ideia de que os brasileiros gostam apenas de vencer fica, sob perspectiva histórica, pelo menos em xeque.

O contínuo interesse dos espectadores sugere que a maneira como a programação esportiva articula atravessamentos culturais, sociais e políticos também colabora para cativar o público. Muitos dos profissionais que, a partir do começo da televisão no país, cobriram o futebol e as outras modalidades foram candidatos a cargos no Legislativo e no Executivo. É o caso do próprio Saldanha, candidato a vice-prefeito do Rio de Janeiro em 1985. Alguns chegaram a conquistar eventualmente postos nas urnas.

As mesas redondas apenas exemplificam o encanto provocado pelas transmissões em tempo real que envolvem o esporte. Mesmo com tantas transformações, podcasters e streamers igualmente apostam em discussões exibidas ao vivo, combinadas ao replay dos principais lances das competições. Os Jogos Olímpicos indicam que esse fascínio pode ser explicado pelo deslumbramento com as cenas dos feitos épicos protagonizados por atletas, ao som de palavras que circulam pela cultura popular.
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* Helcio Herbert Neto é autor do livro 'Palavras em jogo: Comentário esportivo no Brasil (2024)'. Atualmente, realiza pesquisas sobre cultura popular em âmbito de pós-doutorado no Departamento de Estudos Culturais e Mídia da UFF, instituição pela qual também se tornou mestre em Comunicação. Professor e doutor em História Comparada pela UFRJ, é ainda formado em Filosofia (UERJ) e Jornalismo (UFRJ)
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