Rio - Uma casa fechada, com pouca luminosidade e pichações com o nome do casal. Assim era o cativeiro onde uma jovem de 23 anos (que prefere não se identificar) foi torturada pelo marido, um policial militar, durante os 17 primeiros dias de setembro, no bairro Paulicéia, em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense. As duras agressões, tanto físicas quanto psicológicas, eram cometidas por ciúmes e, entre as barbaridades cometidas pelo sargento da PM, de 43 anos, está uma tatuagem na costela da vítima com o nome dele, que ela foi obrigada a fazer.
O policial, lotado no 16º Batalhão (Olaria), foi preso no último dia 23, seis dias após torturar a vítima por quase 20 horas com o intuito de saber sobre relacionamentos anteriores dela. A prisão foi realizada pela Delegacia de Atendimento à Mulher (Deam) de Duque de Caxias. Segundo a Polícia Civil, a especializada da cidade até agora é a que mais registrou crimes contra a mulher em 2019 no estado do Rio.
Um triste recorde
A jovem está entre as milhares de mulheres no Rio que sofrem com violência cometida por conta do gênero. Em 2019, a Deam-Caxias foi a que mais teve registros no estado. Até o dia 25 de setembro, já havia 3.030 casos, uma média assustadora de 11,3 por dia. De acordo com o levantamento feito pelo Instituto de Segurança Pública (ISP), em 2018, 41.344 mulheres registraram terem sido vítimas de lesão corporal no estado. A cada 24 horas, quatro mulheres são agredidas e ameaçadas por um homem, e doze são estupradas. O ISP ainda apurou que 56% dos crimes contra o gênero feminino são cometidos por seus companheiros ou ex-companheiros.
A delegada Fernanda Fernandes, titular da Deam de Caxias, afirma que é primordial que a vítima registre as primeiras agressões, até mesmo as psicológicas, para que sua vida seja preservada. "A maioria das vítimas de feminicídio não procurou a delegacia antes. A vítima precisa registrar para conseguir uma medida protetiva. Muitos homens acham que elas são posse".
Dopada
Essa jovem escapou da morte. Ela e o sargento formaram um casal por sete anos, cinco deles morando juntos. Sofrendo um relacionamento abusivo, como descreveu a vítima, ela decidiu dar um basta em tudo e chegou a se mudar para o Espírito Santo, em janeiro deste ano. Após sete meses de separação, ela acreditou que era possível uma reconciliação e resolveu aceitar um convite para sair com o ex-marido, em 1º de agosto. Durante o encontro, ela teria sido sedada pelo policial militar e, quando acordou, já estava na casa onde haviam morado juntos.
"A dor que você está sentindo, eu estou sentindo em dobro. Não acha que está sendo punida com pouco, não? O que eu estou sentindo é pior". Essas eram as palavras que a vítima disse que escutava enquanto era torturada, estando sob efeito de remédios controlados que era obrigada a tomar. O agressor, que xingava e depreciava a vítima, justificava seu crime dizendo que sofreu durante o tempo em que estiveram separados.
"Ele estava calmo quando chegou para conversar comigo, então aceitei entrar no carro e saímos para conversar. Eu falei que estava com sede e ele me deu uma garrafa d'água. Logo depois, senti tontura e apaguei. Quando acordei, estava na garagem da casa, eu no banco da frente e ele atrás. Dali, eu já não voltei mais para a casa da minha família", relembrou a vítima.
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