Ex-governador do Rio, Wilson WitzelLuciano Belford
Por ESTADÃO CONTEÚDO
Publicado 08/05/2021 13:18 | Atualizado 08/05/2021 13:52
Rio - O 'Banco do Crime', o esquema de lavagem de dinheiro usado pelo Primeiro Comando da Capital (PCC) para movimentar o dinheiro do tráfico de drogas, é investigado pela Polícia Federal (PF) sob a suspeita de movimentar recursos desviados de hospitais de campanha para a covid-19 no Rio, na gestão do governador cassado Wilson Witzel. Essa é uma das principais revelações da Operação Tempestade, deflagrada pela PF nesta semana.
Um dos doleiros acusados - Wilson Decaria Junior, o 'Tio' - é ainda o elo entre a apuração da PF e a Operação Sharks. De acordo com os investigadores, são dois os principais esquemas de lavagem de dinheiro do PCC. Um deles envolve uma doleira identificada pelos criminosos como "Veia".
Publicidade
O outro é o esquema detectado pela Operação Tempestade, que usava pelo menos duas empresas como bancos: o "Banco Neman" e a Bidu Cobranças, Investimentos, Transportes e Participações.
Segundo relatório da PF assinado pelos delegados Rodrigo de Campos Costa e Adriano Mendes Barbosa, da Delegacia Regional de Combate ao Crime Organizado, os investigados criaram estrutura própria para o "branqueamento de capitais por meio do uso de empresas fictícias e de laranjas conscientes", emitindo notas fiscais frias para justificar a prestação de serviços inexistentes.
Publicidade
O empresário Dalton Baptista Neman é apontado como o líder do esquema criminoso - que incluiria ainda seu filho. A ação contaria ainda com a participação de Decaria Júnior.
Neman e Decaria foram identificados pela PF na Operação Laços de Família, em 2016, que apurou o envolvimento do ex-presidente do Paraguai Horácio Cartes com o contrabando de cigarros para o Brasil.
Publicidade
Neman manteria contato com outras divisões da organização criminosa, como o chamado Núcleo Canadense. É aqui que surgiram as suspeitas da PF de ligações entre o "Banco do Crime" e os desvios dos recursos pata o combate à covid-19.
De acordo com a PF, o advogado e lobista Roberto Bertholdo seria a peça que uniria os dois esquemas. Ele é investigado por suposto envolvimento em desvio de recursos de hospitais de campanha para a covid-19 no Rio. A PF chegou a pedir à Justiça a prisão temporária de Bertholdo, mas ela foi negada pela 6.ª Vara da Justiça Federal de São Paulo.
Publicidade
De acordo com a o relatório da PF, Bertholdo "ficou conhecido como o homem que grampeou Sérgio Moro". Os federais destacaram os contatos políticos do advogado, cujo escritório fica em Brasília, no MDB e no PP.
Durante as investigações, os federais encontraram R$ 700 mil transferidos da conta do escritório de Bertholdo para a empresa Bidu Importação e Exportação Eirelli, dos Nemans. Bertholdo seria representante do Iabas (Instituto de Atenção Básica e Avançada da Saúde), que foi contratado pelo governo do Rio para construir os hospitais de campanha.
Publicidade
Em pelos menos uma oportunidade, os federais registraram o transporte de dinheiro de São Paulo para o Rio. Era 3 de fevereiro de 2020, quando os federais flagraram um intermediário recebendo dinheiro dos Nemans em um hangar do aeroporto de Jacarepaguá, no Rio.
Em uma conta bancária ligada a Bertholdo, os federais afirmaram terem encontrado nove depósitos feitos pelo Iabas no valor de R$ 6,5 milhões e quatro outros feitos por Bertholdo à Bidu, no valor de R$ 2,4 milhões. Ao todo, Roberto Bertholdo teria movimentado por meio de uma empresa r$ 77 milhões.
Publicidade
Já os Nemans teriam movimentado cerca de R$ 220 milhões. "Há indícios fortíssimos que levam à possibilidade de que os valores transportados pelos Nemans, fisicamente, possam ter como destino o pagamento de propina a membros do governo daquele Estado (Rio)".
O Núcleo Canadense usaria o banco do crime para "se beneficiar de recursos públicos, em tese, oriundos de fraudes em licitações e contratos superfaturados". De acordo ainda com os delegados da PF, os "clientes dos Nemans" já foram investigados na Operação Prato Feito (um ex-prefeito), que apurou o desvio de merenda escolar em São Paulo, e na Operação Zelotes, sobre fraudes no Conselho de Administração de Recursos Fiscais (Carf).
Publicidade
"A desfaçatez do grupo é tamanha que criou uma instituição financeira, o Banco Neman, com um único objetivo: lavagem de ativos ilícitos de qualquer atividade criminosa", escreveram os delegados. Durante a Operação Tempestade, a PF cumpriu cinco mandados de prisão, quatro preventivas e uma temporária - os delegados haviam pedido cinco preventivas e seis temporárias. A PF não revelou os nomes dos presos.
Os agentes fizeram 22 buscas em endereços de São Paulo, Tietê (SP), Guarujá (SP), Rio e Brasília. Entre os alvos vasculhados estavam residências, empresas e dois escritórios de advocacia. O Coaf identificou movimentações atípicas de R$ 699 milhões, "que hoje estão integrados no mercado econômico, como se lícitos fossem, cujos beneficiários são criminosos tanto do colarinho branco como de facções criminosas, incluindo o PCC".
Leia mais