Publicado 08/05/2022 09:00 | Atualizado 08/05/2022 12:51
Rio - Certa vez, uma jovem amiga, sem filhos, tinha ficado muito triste porque perdeu o útero após adoecer. Estava se sentindo como se a vida tivesse arrancado o seu direito à escolha de ser mãe. Ainda no hospital, recebeu flores de uma outra amiga com um bilhete: "Para ser mãe, o único órgão necessário é o coração". Isso mudou tudo: ela viu que o desejo de cuidar, de amar, de proteger estava acima das limitações ou dificuldades que a vida às vezes nos impõe. Por isso, para representar todas as mães, escolhemos mulheres que viraram exemplo, passaram por cima dos seus medos e de barreiras diversas para se entregar a esse amor.
'Quero que a Maria tenha orgulho da sua história'
“Eu sempre tive desejo de ser mãe, desde nova me imaginava mãe. Conforme fui me enxergando no mundo, minha orientação sexual, percebi que isso teria que ser planejado. Já tive outras parceiras, mas eu e a Julia estamos juntas há 8 anos, e há uns 4 anos começamos a investir nesse sonho”, conta a ex-jogadora de vôlei, bicampeã olímpica e atualmente comentarista de TV, Fabiana Alvim, de 42 anos, ou Fabi, como os fãs do esporte se acostumaram a chamá-la.
A ex-atleta é casada com Julia de Carvalho, de 36, e elas são mães da pequena Maria Luiza, de 2 anos e 10 meses. Ambas desejavam viver a maternidade, e depois de pesquisar e trocar ideias com amigos que passaram pela experiência, elas optaram pela fertilização in vitro (reprodução humana assistida), um processo que exige, do corpo que vai receber o óvulo fecundado, uma série de cuidados e a utilização de hormônios. Como a Fabi ainda estava no agitado mundo das quadras, e para não correr o risco da medicação acusar algum tipo de falso doping, a decisão foi que a Maria viesse pela barriga de Julia.
“Vi que pouca diferença fazia de quem geraria ou não. No final de 2016, começamos a procurar uma clínica, queria acompanhar todo o processo da Julia, eu queria que fosse próximo da época que eu parasse de jogar, porque atleta tem uma vida muito dinâmica. Quando parei em 2018, a gente acelerou, fizemos a primeira tentativa; na segunda; a Julia engravidou.”
Bons tempos em que uma clínica no Rio de Janeiro já emite um certificado de que as duas mulheres da relação são donas do embrião. Com o documento na mão, Fabi foi registrar a Maria no cartório que tem na própria clínica. Ela conta que a novidade da situação criou um constrangimento, mas nada que não pudesse ser contornado: foi preciso explicar que a certidão de nascimento deveria ser impressa com os nomes das duas mães e dos quatro avós, sem o tradicional ‘maternos’ e ‘paternos’, como é o padrão desses documentos.
“Saí da maternidade com a minha filha registrada com duas mães e sem grandes problemas. Espero que no futuro a gente veja uma normatização do processo para quem quiser ter filhos”, relembra Fabi.
Além da realização como mãe, Julia e Fabi têm a convicção de que precisam preparar a filha para lidar com o estranhamento. Elas possuem uma rede de apoio de mães, onde discutem os medos, anseios e dúvidas que sempre chegam para quem tem filhos, tanto em famílias como a delas quanto nas heteronormativas.
O casal está sempre disposto a explicar, por exemplo, quando perguntam quem é o pai da criança. E a sociedade vai aprendendo... mas o medo de passar por situações desagradáveis existe.
“Queria que ela estudasse em um lugar mais inclusivo, conseguimos um colégio assim, no Jardim Botânico. Tenho certeza de que vou passar por muitos constrangimentos, mas o que me anima é quem quem vier depois, passará por menos constrangimentos. Espero que que isso seja um ciclo que, em algum momento, se encerre. Quero que a Maria seja constestadora, atenta, tenha orgulho da sua história”, finaliza.
‘O máximo, uma super-heroína’
Os filhos sempre acham que as mães são heroínas, mas no caso de Ricardo e seu irmãos, tinha um quê a mais na mamãe Luzia: a farda. De acordo com o Sindicato de Policiais Civis do Rio de Janeiro (Sindpol -RJ), quase duas mil mulheres servem hoje na corporação do nosso estado. Uma delas, Luzia Franco, já está há 35 anos na Civil, vinda de uma pequena vivência da Polícia Militar. Casada com um delegado aposentado e mãe de três filhos, a comissária de polícia se orgulha de ter, naturalmente, inspirado os dois mais velhos a seguirem seus passos. Rafael virou oficial da Polícia do Exército; já Ricardo é capitão da PM e comandante de uma UPP na Zona Norte do Rio.
“Policial tem que ter muita orientação, quase o conhecimento da alma humana. Lidamos com todos os tipos de seres humanos e sempre temos que ter empatia por cada um. E você acaba vendo pessoas em comunidades com histórias lindas”, comenta Luzia, que é formada em Direito.
Ela garante que a escolha dos filhos não foi imposição dela, nem do marido. Tanto que o caçula pretende prestar vestibular para Medicina. Mas a agente não esconde o orgulho de ver que está conseguindo deixar um legado de como ser um bom agente de segurança, com ética, um olhar humanizado e o senso de dever.
“Sempre falo para eles que somos amigos sem cobrança, que temos que ser empáticos e estarmos prontos dia e noite. Ouviu um socorro, já tem que se mexer”, comenta Luzia, uma mulher que bem representa o Sindpol-RJ com o seu espírito pioneiro: ela é a primeira chefe de Cerimonial da Secretaria de Polícia Civil. A primeira. Tão pioneira quanto nos tempos de PM, quando mulheres de farda era tão rarar nas ruas do Rio que as pessoas pediam para tirar fotos.
No meio da alegria e do orgulho da profissão da família, existe o medo a que estão expostos. “Eu rezo o Pai Nosso todas as manhãs. E peço a Deus que cuide dos meus filhos.”
O filho Ricardo tem 33 anos, sendo 15 na Polícia Militar. Sobre ser o único entre os coleguinhas a ter mãe policial, ele lembra com carinho da época da escola, do quanto isso os enchia de orgulho. “Era o máximo, achava minha mãe uma super-heroína, intocável, a mais top”, diz. Os coleguinhas também tinham aquela admiração, queriam conversar com ela, saber um pouco mais daquela mãe “sinistra”, com eles diziam.
Mas para o PM, o principal não era essa aura de especial que a mãe carregava. “Ela é uma referência, desde que eu era muito pequeno, de retidão, de como trabalhar certo. Ela sempre nos mostrou a importância de um trabalho honesto e a importância da sociedade para o policial. Ela sempre trabalhou muito e mostrava que, se dedicando à sociedade, naturalmente se colhe os frutos.
Trabalhando hoje com polícia de proximidade, Ricardo diz que muitas de suas decisões vêm de sua base de criação. “Ela era dura na hora de nos corrigir, mas ao mesmo tempo, muito carinhosa no nosso cuidado. Agradeço muito à minha mãe.”
‘É você que vai ser minha mãe?’
Ao olhar a filha Nathaly, de 21 anos, cursando faculdade de Medicina Veterinária, feliz e amorosa, Gerlane e Sueli pensam: ‘missão cumprida”. Será? Por conta da filha linda que as fez atravessar o país, ok. Mas para elas, também é uma missão falar da relevância da adoção, em todos os tipos de família. E mais: a adoção tardia. Vivendo juntas há quase 16 anos, Gê e Sueli decidiram entrar numa fila de adoção em 2008.
“A princípio, a Sueli frequentava sozinha as reuniões na vara da Infância e Juventude, conversava com psicólogos, assistentes sociais. Eu ficava lá, do lado de fora, ansiosa para saber tudo o que tinha sido falado. Nós tínhamos medo de que, por não sermos um casal ‘tradicional’ fôssemos prejudicadas na hora da adoção. Assim foi parte da nossa gestação”, conta Gerlane dos Santos Cavalcante, de 53 anos.
Um dia, Sueli não aguentou mais a angústia de ver a companheira nessa situação e abriu o jogo com os profissionais da Vara da Infância e Juventude. E ninguém impediu que elas estivessem lado a lado em cada fase a partir dali. Elas se tornaram aptas à adoção, pelo cadastro único, e em menos de uma semana receberam o telefonema de uma assistente social de Natal, no Rio Grande do Norte. A rapidez se deu ao fato de que elas não fizeram exigências como origem, cor. E principalmente: porque queriam uma criança entre 7 e 8 anos – uma idade que no Brasil ainda é muito raro ser opção para casais adotantes. “Quando Deus coloca no nosso caminho, não é por acaso”, acredita Gerlane.
Sueli Nascimento dos Santos , de 58 anos, trabalha no Ministério Público Federal. Gerlane hoje é aposentada, mas na época trabalhava no comércio. Elas não podiam viajar imediatamente para Natal, por questões profissionais, mas a assistente social ofereceu uma situação paliativa que só fez crescer nelas a certeza de que a pequena Nathaly, de 8 anos, viria para completar a família. Ela sugeriu que o casal mantivesse contato com a criança por telefonemas.
“Quando liguei a primeira vez, só ouvi aquela vozinha: ‘É você que vai ser minha mãe?’. Foi muito emocionante”, relata Sueli. Os telefonemas passaram a acontecer com frequência “Ia correndo para casa para poder conversar com ela”, relembra Sueli. Isso numa época em que era bem caros os telefonemas interurbanos. Estava na hora desse laço se estreitar. E as duas abriram mão da viagem de férias, que já estava planejada para Sergipe e Alagoas, e partiram para um destino mais ao Norte: Natal.
Elas passaram alguns dias convivendo com a menina, explicaram o que significava ter uma companheira. E Nathaly se amarrou na ideia de ter duas mães, correndo para abraçar as duas ao mesmo tempo. E é como as chama até hoje: mãe (Sueli) e mãe Gê (Gerlane). Em Natal, elas não conseguiram registrar a menina assim. O documento saiu como se Sueli fosse mãe solo, e pronto. O casal até ia deixar assim, o mais importante, a tão sonhada filha, já existia. Mas a menina achou um desaforo o documento não contar que ela tinha duas mães. Por isso, chegando no Rio, elas procuraram ajuda. E conseguiram incluir o nome da mãe Gê, de fato e de direito. E não terem o mesmo sangue nunca foi problema.
“Nathaly nunca nos discriminou, ela se preocupa com a gente, é uma beleza por dentro, filha espetacular. No processo da adoção, fiz uma poesia sou muito emotiva quando me pediram algo que me relacionasse à maternidade. Expressei meu amor por uma criança que ainda era uma interrogação. Filho, mesmo sendo maiorzinho, não vai deixar de ser filho”, diz Gê.
Sua companheira reforça: “Sempre tive o desejo de inspirar outras pessoas porque só sabe a luta quem já passou por ela. Tem tantas crianças, de todas as idades, precisando de amor, que você esquece que não saiu do seu ventre. Vira tão sua que você esquece que adotou. Filho aprende muito pelo exemplo, então, não podemos ter medo.”
‘A melhor decisão da minha vida’
'Quero que a Maria tenha orgulho da sua história'
“Eu sempre tive desejo de ser mãe, desde nova me imaginava mãe. Conforme fui me enxergando no mundo, minha orientação sexual, percebi que isso teria que ser planejado. Já tive outras parceiras, mas eu e a Julia estamos juntas há 8 anos, e há uns 4 anos começamos a investir nesse sonho”, conta a ex-jogadora de vôlei, bicampeã olímpica e atualmente comentarista de TV, Fabiana Alvim, de 42 anos, ou Fabi, como os fãs do esporte se acostumaram a chamá-la.
A ex-atleta é casada com Julia de Carvalho, de 36, e elas são mães da pequena Maria Luiza, de 2 anos e 10 meses. Ambas desejavam viver a maternidade, e depois de pesquisar e trocar ideias com amigos que passaram pela experiência, elas optaram pela fertilização in vitro (reprodução humana assistida), um processo que exige, do corpo que vai receber o óvulo fecundado, uma série de cuidados e a utilização de hormônios. Como a Fabi ainda estava no agitado mundo das quadras, e para não correr o risco da medicação acusar algum tipo de falso doping, a decisão foi que a Maria viesse pela barriga de Julia.
“Vi que pouca diferença fazia de quem geraria ou não. No final de 2016, começamos a procurar uma clínica, queria acompanhar todo o processo da Julia, eu queria que fosse próximo da época que eu parasse de jogar, porque atleta tem uma vida muito dinâmica. Quando parei em 2018, a gente acelerou, fizemos a primeira tentativa; na segunda; a Julia engravidou.”
Bons tempos em que uma clínica no Rio de Janeiro já emite um certificado de que as duas mulheres da relação são donas do embrião. Com o documento na mão, Fabi foi registrar a Maria no cartório que tem na própria clínica. Ela conta que a novidade da situação criou um constrangimento, mas nada que não pudesse ser contornado: foi preciso explicar que a certidão de nascimento deveria ser impressa com os nomes das duas mães e dos quatro avós, sem o tradicional ‘maternos’ e ‘paternos’, como é o padrão desses documentos.
“Saí da maternidade com a minha filha registrada com duas mães e sem grandes problemas. Espero que no futuro a gente veja uma normatização do processo para quem quiser ter filhos”, relembra Fabi.
Além da realização como mãe, Julia e Fabi têm a convicção de que precisam preparar a filha para lidar com o estranhamento. Elas possuem uma rede de apoio de mães, onde discutem os medos, anseios e dúvidas que sempre chegam para quem tem filhos, tanto em famílias como a delas quanto nas heteronormativas.
O casal está sempre disposto a explicar, por exemplo, quando perguntam quem é o pai da criança. E a sociedade vai aprendendo... mas o medo de passar por situações desagradáveis existe.
“Queria que ela estudasse em um lugar mais inclusivo, conseguimos um colégio assim, no Jardim Botânico. Tenho certeza de que vou passar por muitos constrangimentos, mas o que me anima é quem quem vier depois, passará por menos constrangimentos. Espero que que isso seja um ciclo que, em algum momento, se encerre. Quero que a Maria seja constestadora, atenta, tenha orgulho da sua história”, finaliza.
‘O máximo, uma super-heroína’
Os filhos sempre acham que as mães são heroínas, mas no caso de Ricardo e seu irmãos, tinha um quê a mais na mamãe Luzia: a farda. De acordo com o Sindicato de Policiais Civis do Rio de Janeiro (Sindpol -RJ), quase duas mil mulheres servem hoje na corporação do nosso estado. Uma delas, Luzia Franco, já está há 35 anos na Civil, vinda de uma pequena vivência da Polícia Militar. Casada com um delegado aposentado e mãe de três filhos, a comissária de polícia se orgulha de ter, naturalmente, inspirado os dois mais velhos a seguirem seus passos. Rafael virou oficial da Polícia do Exército; já Ricardo é capitão da PM e comandante de uma UPP na Zona Norte do Rio.
“Policial tem que ter muita orientação, quase o conhecimento da alma humana. Lidamos com todos os tipos de seres humanos e sempre temos que ter empatia por cada um. E você acaba vendo pessoas em comunidades com histórias lindas”, comenta Luzia, que é formada em Direito.
Ela garante que a escolha dos filhos não foi imposição dela, nem do marido. Tanto que o caçula pretende prestar vestibular para Medicina. Mas a agente não esconde o orgulho de ver que está conseguindo deixar um legado de como ser um bom agente de segurança, com ética, um olhar humanizado e o senso de dever.
“Sempre falo para eles que somos amigos sem cobrança, que temos que ser empáticos e estarmos prontos dia e noite. Ouviu um socorro, já tem que se mexer”, comenta Luzia, uma mulher que bem representa o Sindpol-RJ com o seu espírito pioneiro: ela é a primeira chefe de Cerimonial da Secretaria de Polícia Civil. A primeira. Tão pioneira quanto nos tempos de PM, quando mulheres de farda era tão rarar nas ruas do Rio que as pessoas pediam para tirar fotos.
No meio da alegria e do orgulho da profissão da família, existe o medo a que estão expostos. “Eu rezo o Pai Nosso todas as manhãs. E peço a Deus que cuide dos meus filhos.”
O filho Ricardo tem 33 anos, sendo 15 na Polícia Militar. Sobre ser o único entre os coleguinhas a ter mãe policial, ele lembra com carinho da época da escola, do quanto isso os enchia de orgulho. “Era o máximo, achava minha mãe uma super-heroína, intocável, a mais top”, diz. Os coleguinhas também tinham aquela admiração, queriam conversar com ela, saber um pouco mais daquela mãe “sinistra”, com eles diziam.
Mas para o PM, o principal não era essa aura de especial que a mãe carregava. “Ela é uma referência, desde que eu era muito pequeno, de retidão, de como trabalhar certo. Ela sempre nos mostrou a importância de um trabalho honesto e a importância da sociedade para o policial. Ela sempre trabalhou muito e mostrava que, se dedicando à sociedade, naturalmente se colhe os frutos.
Trabalhando hoje com polícia de proximidade, Ricardo diz que muitas de suas decisões vêm de sua base de criação. “Ela era dura na hora de nos corrigir, mas ao mesmo tempo, muito carinhosa no nosso cuidado. Agradeço muito à minha mãe.”
‘É você que vai ser minha mãe?’
Ao olhar a filha Nathaly, de 21 anos, cursando faculdade de Medicina Veterinária, feliz e amorosa, Gerlane e Sueli pensam: ‘missão cumprida”. Será? Por conta da filha linda que as fez atravessar o país, ok. Mas para elas, também é uma missão falar da relevância da adoção, em todos os tipos de família. E mais: a adoção tardia. Vivendo juntas há quase 16 anos, Gê e Sueli decidiram entrar numa fila de adoção em 2008.
“A princípio, a Sueli frequentava sozinha as reuniões na vara da Infância e Juventude, conversava com psicólogos, assistentes sociais. Eu ficava lá, do lado de fora, ansiosa para saber tudo o que tinha sido falado. Nós tínhamos medo de que, por não sermos um casal ‘tradicional’ fôssemos prejudicadas na hora da adoção. Assim foi parte da nossa gestação”, conta Gerlane dos Santos Cavalcante, de 53 anos.
Um dia, Sueli não aguentou mais a angústia de ver a companheira nessa situação e abriu o jogo com os profissionais da Vara da Infância e Juventude. E ninguém impediu que elas estivessem lado a lado em cada fase a partir dali. Elas se tornaram aptas à adoção, pelo cadastro único, e em menos de uma semana receberam o telefonema de uma assistente social de Natal, no Rio Grande do Norte. A rapidez se deu ao fato de que elas não fizeram exigências como origem, cor. E principalmente: porque queriam uma criança entre 7 e 8 anos – uma idade que no Brasil ainda é muito raro ser opção para casais adotantes. “Quando Deus coloca no nosso caminho, não é por acaso”, acredita Gerlane.
Sueli Nascimento dos Santos , de 58 anos, trabalha no Ministério Público Federal. Gerlane hoje é aposentada, mas na época trabalhava no comércio. Elas não podiam viajar imediatamente para Natal, por questões profissionais, mas a assistente social ofereceu uma situação paliativa que só fez crescer nelas a certeza de que a pequena Nathaly, de 8 anos, viria para completar a família. Ela sugeriu que o casal mantivesse contato com a criança por telefonemas.
“Quando liguei a primeira vez, só ouvi aquela vozinha: ‘É você que vai ser minha mãe?’. Foi muito emocionante”, relata Sueli. Os telefonemas passaram a acontecer com frequência “Ia correndo para casa para poder conversar com ela”, relembra Sueli. Isso numa época em que era bem caros os telefonemas interurbanos. Estava na hora desse laço se estreitar. E as duas abriram mão da viagem de férias, que já estava planejada para Sergipe e Alagoas, e partiram para um destino mais ao Norte: Natal.
Elas passaram alguns dias convivendo com a menina, explicaram o que significava ter uma companheira. E Nathaly se amarrou na ideia de ter duas mães, correndo para abraçar as duas ao mesmo tempo. E é como as chama até hoje: mãe (Sueli) e mãe Gê (Gerlane). Em Natal, elas não conseguiram registrar a menina assim. O documento saiu como se Sueli fosse mãe solo, e pronto. O casal até ia deixar assim, o mais importante, a tão sonhada filha, já existia. Mas a menina achou um desaforo o documento não contar que ela tinha duas mães. Por isso, chegando no Rio, elas procuraram ajuda. E conseguiram incluir o nome da mãe Gê, de fato e de direito. E não terem o mesmo sangue nunca foi problema.
“Nathaly nunca nos discriminou, ela se preocupa com a gente, é uma beleza por dentro, filha espetacular. No processo da adoção, fiz uma poesia sou muito emotiva quando me pediram algo que me relacionasse à maternidade. Expressei meu amor por uma criança que ainda era uma interrogação. Filho, mesmo sendo maiorzinho, não vai deixar de ser filho”, diz Gê.
Sua companheira reforça: “Sempre tive o desejo de inspirar outras pessoas porque só sabe a luta quem já passou por ela. Tem tantas crianças, de todas as idades, precisando de amor, que você esquece que não saiu do seu ventre. Vira tão sua que você esquece que adotou. Filho aprende muito pelo exemplo, então, não podemos ter medo.”
‘A melhor decisão da minha vida’
Ela já foi professora de artes, fez restauração de pinturas, morava na comunidade de Manguinhos, onde desenvolveu projetos sociais, trabalha com inteligência artificial e Big Data, possui o Transtorno do Espectro Autista (TEA) e é mãe solo de duas crianças – uma delas, também autista. É muita história para uma mulher de apenas 34 anos, mas essa é a vida de Viviane Nonato. Afinal, ser mãe não é tarefa para amadores, né?
“Ser mãe é difícil, mas não impossível. É a melhor parte de mim, brinco, dou colo, banho, ajudo com as tarefas escolares, são momentos que sei que estou fazendo algo certo. Quero ser a melhor a mãe do mundo, esta foi a melhor decisão da minha vida”, revela Viviane, mãe de Alice, de 8 anos, e de Ítalo, de 6. A menina também foi diagnosticada com TEA.
Por isso, a rotina em casa é bem regrada. Segundo Vivi, sair do padrão pode desestabilizar ela ou a filha. Hoje, ela mora no Grajaú, próximo ao pai das crianças, para facilitar sua vida profissional. Que nem sempre foi fácil, a começar pelas entrevistas de emprego, coisa que toda mulher conhece: “Você tem filhos? Sim? E com quem vão ficar se você trabalhar?” Ou: “Não tem filhos? Por quê? Pretende ter daqui a quantos anos?”.
“Mãe solo é muito discriminada. Hoje, trabalho em uma empresa bem humanizada, com um horário flexível. Mas quando entrei na Oliveira Trust, escondi que era autista, tinha medo da reação deles, porque eu trabalho com programação, com lógica. Mas um dia, conversando com meu chefe, soube que ele tinha Transtorno de Déficit de Atenção, e criei coragem para falar de mim.”
Vivi é desenvolvedora back end e front end, e sempre que precisou da colaboração da equipe, como certa vez em que teve algumas reações por ter esquecido de tomar os medicamentos, foi prontamente acolhida. “É um time empático. Eles me enxergam.”
Na Fiocruz, ela foi militante de projetos sociais. “Era muito pobre, a maior parte do meu dia ficava acessando a internet da Fiocruz. Os pesquisadores me deram muito apoio. O que seria de mim sem tanto apoio?”. Foi na Fiocruz que ela começou a se interessar por tecnologia, mas diz que não foi ‘um salto’: foi um conhecimento progressivo. A veia artística ainda pulsa, e se junta com a maternidade: ela hoje ensina pintura para Alice, que também faz balé.
Tanto Alice quanto Ítalo fazem tratamento com psicopedagoga. Vivi diz que fica atenta para que o menino não reproduza alguns jeitos de Alice, como gritar ou ficar agitada em alguns momentos. “Mas ele já entende o que a Alice tem”, explica.
“Ser mãe é difícil, mas não impossível. É a melhor parte de mim, brinco, dou colo, banho, ajudo com as tarefas escolares, são momentos que sei que estou fazendo algo certo. Quero ser a melhor a mãe do mundo, esta foi a melhor decisão da minha vida”, revela Viviane, mãe de Alice, de 8 anos, e de Ítalo, de 6. A menina também foi diagnosticada com TEA.
Por isso, a rotina em casa é bem regrada. Segundo Vivi, sair do padrão pode desestabilizar ela ou a filha. Hoje, ela mora no Grajaú, próximo ao pai das crianças, para facilitar sua vida profissional. Que nem sempre foi fácil, a começar pelas entrevistas de emprego, coisa que toda mulher conhece: “Você tem filhos? Sim? E com quem vão ficar se você trabalhar?” Ou: “Não tem filhos? Por quê? Pretende ter daqui a quantos anos?”.
“Mãe solo é muito discriminada. Hoje, trabalho em uma empresa bem humanizada, com um horário flexível. Mas quando entrei na Oliveira Trust, escondi que era autista, tinha medo da reação deles, porque eu trabalho com programação, com lógica. Mas um dia, conversando com meu chefe, soube que ele tinha Transtorno de Déficit de Atenção, e criei coragem para falar de mim.”
Vivi é desenvolvedora back end e front end, e sempre que precisou da colaboração da equipe, como certa vez em que teve algumas reações por ter esquecido de tomar os medicamentos, foi prontamente acolhida. “É um time empático. Eles me enxergam.”
Na Fiocruz, ela foi militante de projetos sociais. “Era muito pobre, a maior parte do meu dia ficava acessando a internet da Fiocruz. Os pesquisadores me deram muito apoio. O que seria de mim sem tanto apoio?”. Foi na Fiocruz que ela começou a se interessar por tecnologia, mas diz que não foi ‘um salto’: foi um conhecimento progressivo. A veia artística ainda pulsa, e se junta com a maternidade: ela hoje ensina pintura para Alice, que também faz balé.
Tanto Alice quanto Ítalo fazem tratamento com psicopedagoga. Vivi diz que fica atenta para que o menino não reproduza alguns jeitos de Alice, como gritar ou ficar agitada em alguns momentos. “Mas ele já entende o que a Alice tem”, explica.
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