Publicado 12/06/2022 15:24 | Atualizado 13/06/2022 17:11
Rio - De fevereiro a abril deste ano, a Maternidade Municipal Dr. Mário Niajar, em São Gonçalo, Região Metropolitana do Rio, registrou 39 óbitos fetais, incluindo gestações em que ocorrem abortos e casos que já chegam à unidade de saúde com óbito. O dado foi obtido após uma inspeção, realizada na sexta-feira (10), pela Frente Parlamentar de Combate à Violência Obstétrica e Mortalidade Materna da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj).
A fiscalização também revelou que a unidade de saúde conta com número insuficiente de enfermeiros, que precisam dar conta de um número grande de leitos e a defasagem salarial da equipe de enfermagem. A unidade de saúde é alvo de queixas que chegaram ao mandato da deputada estadual Mônica Francisco, presidente da frente parlamentar.
"São situações que impactam a qualidade do atendimento. Nós já sabemos sobre quais corpos incidem as estatísticas. Mulheres negras são as maiores vítimas de mortalidade materna e violência obstétrica, configurando, na verdade, racismo obstétrico. O meu mandato já recebeu muitas queixas sobre descaso e demora no atendimento prestado por esta maternidade. Não podemos naturalizar essa situação. Viemos aqui para buscar diálogo e compreendermos melhor o que acontece aqui", disse Mônica Francisco.
Referência no atendimento para gestantes, puérperas e casos de emergência ginecológica no município de São Gonçalo, o centro obstétrico da unidade conta com apenas uma enfermeira obstétrica, responsável por 13 leitos obstétricos, e uma enfermeira líder, que se divide em duas salas de cirurgia, sala de parto e auxilia a enfermeira obstétrica nos outros leitos.
Os leitos do centro obstétrico não são camas para parto. Isso faz com que as gestantes sejam transferidas para a sala de parto, já em estágio avançado do processo, em cadeira de rodas ou andando. Na sala de parto, elas têm apenas uma opção de posição para parir: deitadas e com as pernas na perneira. Isso pode configurar uma violência obstétrica, uma vez que muitas mulheres têm dificuldades para dar à luz nessa posição. A maternidade não conta com tecnologias não invasivas para alívio da dor do parto nem recursos para um parto humanizado.
Na Unidade Intermediária Neonatal, há oito leitos sob a responsabilidade de uma enfermeira e 4 técnicos de enfermagem. Há apenas um leito na Unidade Semi Intensiva, um espaço de curta permanência. A sala de parto tem leitos separados por cortinas, oferecendo pouca privacidade às gestantes.
Presidente da Comissão de Trabalho, Legislação Social e Seguridade Social da Alerj, a defasagem salarial da equipe de saúde também chamou a atenção de Mônica Francisco. Existem técnicos de enfermagem na unidade que recebem R$1000, menos de um salário mínimo, para trabalhar 24 horas por semana. Enfermeiros com a mesma carga horária recebem R$ 1.400, valor abaixo do piso estadual de cerca de R$ 2.700.
Maternidade não tem ambulância
Segundo o relato de uma médica, um dos problemas que a unidade enfrenta diz respeito à dificuldade para transferir pacientes para outras unidades de saúde, como o Hospital Estadual Azevedo Lima, onde quatro gestantes morreram nos primeiros quatro meses deste ano. Em maio, o mandato de Mônica Francisco promoveu uma inspeção na unidade estadual localizada em Niterói. A demora no envio da ambulância para buscar a gestante na maternidade municipal de São Gonçalo leva muitas delas a se deslocarem de ônibus configurando uma violência.
A Mário Niajar também não conta com ambulância, segundo relatos de funcionários. Uma das médicas da unidade contou que acompanhou à pé uma paciente do pré-natal de alto risco de um posto de saúde próximo até a maternidade porque não havia ambulância para buscá-la.
Durante a visita, duas mulheres, uma delas gestante com dores, contaram que aguardavam mais de uma hora para fazer ultrassonografia. Outras duas disseram que estavam sendo bem atendidas. Sob nova gestão desde fevereiro, a Maternidade Mário Niajar vem passando por amplas reformas, que têm apresentado avanços visíveis na qualidade do espaço físico. Nove enfermarias já foram restauradas e outras cinco passarão por obras, assim como a fachada da maternidade e os consultórios médicos.
A visita ao hospital foi acompanhada por uma representante da Associação Brasileira de Obstetrizes e Enfermeiros Obstetras (Abenfo), além de enfermeiras obstetras dos mandatos de Mônica Francisco e da deputada estadual Enfermeira Rejane, que também integra a Frente Parlamentar de Combate à Violência Obstétrica e Mortalidade Materna da Alerj.
A frente foi instalada ontem com o objetivo de reforçar as ações de enfrentamento da morte materna e da violência obstétrica, um grave problema de saúde pública no Brasil, com reflexos no Estado do Rio, onde os registros mais que dobraram durante a pandemia. A criação do grupo atende a um apelo da sociedade civil e de entidades que lutam pelos direitos das mulheres e contra o racismo institucional.
O que diz a Prefeitura
No final de maio, a prefeitura publicou algumas informações sobre a maternidade pública. Segundo o órgão, todos os partos de baixo risco da rede pública de saúde de São Gonçalo são realizados na Maternidade Mário Niajar, que funciona todos os dias, durante 24 horas e não há necessidade de marcação prévia. Ainda segundo a prefeitura, a unidade realizou nos primeiros três meses deste ano, 1.132 partos, sendo 647 normais e 485 cesarianas. No ano passado, foram 4.532: sendo 2.477 normais e 2.055 cesarianas. Não foi disponibilizado neste relatório o número de mortes fetais registrado no período de fevereiro a abril.
Procurada, a Secretaria de Saúde de São Gonçalo informou que de fevereiro a abril deste ano foram confirmadas 21 mortes na Maternidade Municipal Mário Niajar, sendo 19 intra-uterinas, ou seja, as mães deram entrada na unidade de saúde com bebês já mortos durante a gestação. "Destacamos que desses dois óbitos que não foram intra-uterinos, um nasceu com menos de 22 semanas e 400 gramas e o outro com 600 gramas prematuro com infecções. Os dois não viveram nem por uma hora. As informações oficiais constam no Sistema de Informação de Mortalidade (SIM) da Divisão de Informações de Análises de Dados Vitais da secretaria", disse em nota.
A Semsa disse ainda que apenas dois bebês nasceram e morreram minutos depois na unidade de saúde e que suas mães também tinham histórico de complicações pertinentes ao estado gestacional.
Confira a nota na íntegra:
"A Semsa informa que de fevereiro a abril deste ano foram confirmadas 21 mortes na Maternidade Municipal Mário Niajar, sendo 19 intra-uterinas, ou seja, as mães deram entrada na unidade de saúde com bebês já mortos durante a gestação. Destacamos que desses dois óbitos que não foram intra-uterinos, um nasceu com menos de 22 semanas e 400 gramas e o outro com 600 gramas prematuro com infecções. Os dois não viveram nem por uma hora. As informações oficiais constam no Sistema de Informação de Mortalidade (SIM) da Divisão de Informações de Análises de Dados Vitais da Semsa.
As mães chegam à unidade, que é porta aberta para as emergências obstétricas durante os sete dias da semana, 24 horas por dia; com reclamação de dores abdominais, ou com sangramentos ou ainda por não estarem sentindo os bebês e fazem uma ultrassonografia. Com a constatação da morte do bebê, elas são submetidas à retirada do feto na unidade e a declaração de óbito é emitida onde a morte foi registrada.
No entanto, apenas dois bebês nasceram e morreram minutos depois na unidade de saúde. Suas mães também tinham histórico de complicações pertinentes ao estado gestacional.
A unidade passa por obras de adequações e adaptações nas enfermarias para melhor atender a população, dar mais conforto, mais dignidade e mais humanização no atendimento. "As reformas estão sendo feitas uma de cada vez para não alterar o fluxo de pacientes que se internam na unidade de saúde diariamente. Referência na cidade para as emergências obstétricas e para o nascimento dos bebês de baixo e médio riscos, a maternidade realiza uma média de 400 partos por mês – cesárea, normal e humanizado. Este ano, os dois centros cirúrgicos passaram a funcionar.
"A Semsa informa que de fevereiro a abril deste ano foram confirmadas 21 mortes na Maternidade Municipal Mário Niajar, sendo 19 intra-uterinas, ou seja, as mães deram entrada na unidade de saúde com bebês já mortos durante a gestação. Destacamos que desses dois óbitos que não foram intra-uterinos, um nasceu com menos de 22 semanas e 400 gramas e o outro com 600 gramas prematuro com infecções. Os dois não viveram nem por uma hora. As informações oficiais constam no Sistema de Informação de Mortalidade (SIM) da Divisão de Informações de Análises de Dados Vitais da Semsa.
As mães chegam à unidade, que é porta aberta para as emergências obstétricas durante os sete dias da semana, 24 horas por dia; com reclamação de dores abdominais, ou com sangramentos ou ainda por não estarem sentindo os bebês e fazem uma ultrassonografia. Com a constatação da morte do bebê, elas são submetidas à retirada do feto na unidade e a declaração de óbito é emitida onde a morte foi registrada.
No entanto, apenas dois bebês nasceram e morreram minutos depois na unidade de saúde. Suas mães também tinham histórico de complicações pertinentes ao estado gestacional.
A unidade passa por obras de adequações e adaptações nas enfermarias para melhor atender a população, dar mais conforto, mais dignidade e mais humanização no atendimento. "As reformas estão sendo feitas uma de cada vez para não alterar o fluxo de pacientes que se internam na unidade de saúde diariamente. Referência na cidade para as emergências obstétricas e para o nascimento dos bebês de baixo e médio riscos, a maternidade realiza uma média de 400 partos por mês – cesárea, normal e humanizado. Este ano, os dois centros cirúrgicos passaram a funcionar.
Assim como a estrutura física da unidade passa por mudanças, o corpo de profissionais também passará por reestruturação para melhor atender a população. Vale ressaltar que a maternidade, que atende as gestantes de baixo e médio riscos, mantém ambulância fixa para as possíveis transferências."
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