Publicado 18/07/2022 07:00
Rio - Foi no bairro do Pilar, em Duque de Caxias, Baixada Fluminense do Rio, que o policial militar Luís Fernando Rodrigues dos Santos, de 42 anos, cresceu. Com uma infância marcada por dificuldade financeira, Luís encontrou refúgio nos livros que seu tio, sociólogo, dava de presente. Há 16 anos na corporação, o terceiro-sargento passou a escrever como uma forma de escape e, também, para influenciar os jovens da periferia à literatura ao invés das armas. Hoje, ele tem três livros escritos, sendo dois deles publicados.
Quando criança, Luís frequentava a casa de um tio, que tinha uma boa condição financeira, para comer e ler. "Ele incentivava a gente a comprar livros porque dizia que o conhecimento podia mudar a realidade. Foi então que comecei a desenvolver o hábito de ler", contou Luís, que usava a biblioteca de sua escola, Centro Integrado de Educação Pública (Ciep), para ler todos os livros que queria.
Na época, seu pai trabalhava com indústria e, por mexer com determinado produto, acabou desenvolvendo uma doença no pulmão, o que impossibilitou sua continuidade no emprego. "Ele foi proibido de trabalhar e ficou muito tempo sem receber e minha mãe não trabalhava. Foi um período muito difícil para a gente. Depois, com um tempo, quando ele conseguiu os direitos dele, ela fez um concurso para merendeira do estado e passou", disse Luís. "A gente passava muito aperto na infância, muito mesmo. Eu costumava ir para o Ciep e passar horas na biblioteca porque tinha acesso a todos os tipos de livros", completou.
Luís começou a trabalhar muito novo, dentro do seu próprio bairro. Com a falta de água na região, ele abastecia recipientes e baldes e levava para as pessoas. Depois, trabalhou em uma empresa de ônibus por um tempo. "Meu tio sempre quis que eu fizesse concurso. Eu via muitos policiais, prestava atenção em como eles viviam e passei a me interessar. Fiz amizade com alguns, que me apoiaram a realizar a prova. Comecei a estudar e passei", explicou.
Em seu primeiro livro de ficção chamado "O Protegido", de 2020, Luís fala sobre o mundo pós-apocalíptico e como será a Terra após o juízo final. Além disso, ele também aborda as consequências de atos impensados e fala sobre a lei do retorno. "Eu falo neste livro sobre o que a gente faz e tudo que pode vir decorrente das escolhas que tomamos. Nele eu tento mostrar que nunca é tarde para se arrepender", explicou. O policial sentiu a necessidade de criar histórias para que outras pessoas se interessassem a ler, assim como ele, ficção. "A história ainda não terminou, é uma trilogia. Há pouco tempo terminei a segunda edição, que já está com a editora para revisão", completou.
Não é só a ficção que Luís gosta, mas o romance também. Seu segundo livro publicado, em 2021, se chama "Eloá" e fala sobre a importância de ter as pessoas certas na hora que a vida aperta. "Este livro é sobre você ter pessoas ao seu lado que estão dispostas a enfrentar problemas com você. Fala do amor verdadeiro e é uma história cheia de adrenalina", declarou Luís, que usou o cotidiano de policial como inspiração para escrever o romance.
O escritor contou que, por ver muita coisa durante sua rotina na rua, como mortes e desgraças, a escrita é algo que ele consegue se desligar. "Ser policial é muito complicado. Quando eu comecei a escrever, foi uma forma de tirar um pouco o pensamento do trabalho. Nós ficamos 24 horas embaixo de tensão, com riscos de ir na rua e poder ser reconhecido, sofrer tentativa de assalto e reagir. É difícil", disse. "Eu recebo muito apoio dos meus colegas de trabalho. Eles estão sempre me incentivando a continuar. Já fiz até tarde de autógrafos no batalhão para os meus amigos", concluiu.
Para Luís, 80% da segurança pública é educação e é por isso que ele escreve. "A segurança pública está atrelada a educação, assim como a saúde a saneamento básico. Estou há 16 anos na polícia e já presenciei muitos confrontos. Vejo traficantes perderem a vida, policiais e até inocentes. A criminalidade nunca cessa, só oscila", explicou. "Na verdade, a educação pode resolver esse problema da criminalidade. A gente precisa educar os nossos filhos, porque dando exemplo em casa, eles não vão fazer na rua. Se eu conseguir atingir esses jovens, ajudar eles com um hábito de leitura, já fico feliz", completou.
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