É uma apresentação tão cheia de vida que tenho a impressão de que a gente canta sorrindo. Especialmente quando já identificamos a música logo nos primeiros acordesArte: Kiko
Publicado 02/04/2023 09:00
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Antes mesmo de subir o bondinho do Pão de Açúcar na sexta-feira retrasada para o show de Gilberto Gil, eu me lembrava da primeira vez que havia estado no Morro da Urca para as famosas noites que embalam o ponto turístico desde a década de 80. Foi em 2008, época dos meus 30 anos, e até hoje me recordo do que vestia na ocasião: calça jeans e uma blusa em um tom cereja que eu adorava. Naquela noite, quem cantava era Lulu Santos, que já acreditava em "gente fina, elegante e sincera". E eu também!
Aliás, sempre apostei "no amor numa boa" e tenho a convicção de que herdei da minha mãe essa herança de ter fé no afeto. Assim, não foi difícil imaginar que ela também poderia estar ali, na plateia de Gil, na sexta retrasada, em um público que mesclava todas as idades. Os tons grisalhos dos cabelos de homens e mulheres sintonizavam perfeitamente com o prateado dos globos, típicos de boates, que pendiam do teto.
Inclusive, o céu do anfiteatro me dava a sensação de ser estrelado. Olhar para o alto era encantador e, mais ainda para o palco, desde que Gil entrou e me confirmou que, de perto, ele é ainda mais gigante e simples do que eu via pela tevê ou internet. Sim, é possível ser grande e não ser esnobe. E Gil faz isso lindamente.
Desta vez, aos 45 anos, eu vestia uma calça pantalona vermelha e uma blusa branca de malha com pequenas guitarrinhas pretas, que achei bem temáticas para a ocasião. Aos 30 anos, na época do show do Lulu Santos, talvez eu achasse ridículo escrever sobre esses detalhes. Aliás, naquele tempo, eu pouco falava sobre mim.
O fato é que ainda faltava mais de uma hora para o início do espetáculo quando já fiquei a postos, em pé, num local que daria uma boa visão para o show. E ali permaneci até o fim, quando Margareth Menezes, convidada da noite, encerrou o evento com o anfitrião. Confesso que a minha vontade era acompanhar os passos empolgantes de Nara Gil, filha do cantor e integrante da sua banda. Mas não dava para transformar a plateia numa pista de dança particular.
A abertura do show, aliás, foi perfeita para o meu coração canceriano e nostálgico, com uma canção em forma de prece ao 'Tempo Rei': "Ensinai-me, ó, pai, o que eu ainda não sei..." E foi lindo perceber que Gil transcende qualquer época: aos 80 anos, ele canta, dança e mostra que não é preciso se colocar num pedestal para ser imortal. É uma apresentação tão cheia de vida que tenho a impressão de que a gente canta sorrindo. Especialmente quando já identificamos a música logo nos primeiros acordes.
Gil, aliás, é o artista que chama a plateia a todo instante. Talvez por isso eu tenha sentido vontade de me sentar ao seu lado, prosear sobre a vida e de ouvir sobre como ele viveu a História do país. Em casa, a sós com o meu sorriso, eu revi as fotos e repassei a noite anterior na memória. E entendi finalmente por que o teto do anfiteatro parecia estrelado: 'Há de surgir/ Uma estrela no céu/ Cada vez que ocê sorrir..."
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