Circuito tem sua primeira placa de patrimônio instalada onde morou Lélia GonzalezDivulgação/João Victor Ramirez
Publicado 30/09/2023 17:01 | Atualizado 30/09/2023 17:53
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Rio - A Prefeitura do Rio e o Projeto Negro Muro lançaram, neste sábado (30), a iniciativa que irá identificar locais relacionados à cultura da população negra com placas de Patrimônio Cultural. O "Circuito da Igualdade Racial" teve a primeira placa de patrimônio instalada onde morou a autora, antropóloga, filósofa e política Lélia Gonzalez.
"Um grito preso na garganta, uma inquietação pelo apagamento histórico racista que o povo preto no Brasil passa até hoje". É com essas palavras que o produtor artístico e cultural Pedro Rajão define seu projeto Negro Muro, que deixa impressos, grafites e pinturas pela cidade para retratar personalidades negras da cultura carioca. Esta proposta fez surgir o Circuito da Igualdade Racial, uma iniciativa de Rajão com a Secretaria Municipal de Cultura, com a Coordenadoria Executiva de Promoção da Igualdade Racial (Cepir), e com o Instituto Rio Patrimônio e Humanidade (IRPH).

Além da casa de Lélia d’Almeida Gonzalez, outras três placas já estão confirmadas: Maestro Anacleto de Medeiros, em Paquetá; o Granes Quilombo, em Acari, e a casa de Lima Barreto, em Todos os Santos.

As placas de identificação de bens e locais de relevância começaram a ser instaladas pela Prefeitura do Rio em 1992, mas, em 2010, os Circuitos do Patrimônio Cultural Carioca deixaram de ser focados em arquitetura e passaram a abranger temas mais amplos, ligados à cultura carioca. Já são 31 circuitos com bens culturais espalhados por toda a cidade.
Ao DIA, a advogada Suellen Rocha, ativista e sobrevivente da violência doméstica, contou que esteve no evento como convidada e classificou a homenagem à Lélia Gonzalez como maravilhosa. "Um dos momentos importantes [do circuito] foi a neta da Lélia Gonzalez falar da militância de sua avó e da ausências dela na unidade familiar para dedicar-se a militância e a luta em combate ao racismo e ao sexismo", contou a advogada, que continuou:
"[Esse projeto] representa uma visibilidade para uma militante que tornou a vida uma causa, isso exposto até por familiares diante da ausências dela no núcleo familiar em razão da luta. Isso é a divulgação da história de quem nos antecedeu para o fortalecimento da luta em prol de igualdade para mulheres pretas e em combater o racismo".
A gestora social Carla Emydio contou que o evento promoveu o encontro de diversas gerações de amigos e parentes da autora. "Gostei muito de ver o encontro de gerações, todos citando os aprendizados que tiveram a partir da convivência com ela. Deu vontade de ter tido esse presente, mas de uma certa forma ainda temos, através de seus livros e registros de tudo que ela deixou", afirmou.
Quem foi Lélia Gonzalez
Autora dos livros "Lugar de Negro", publicado em 1982, e "Festas Populares no Brasil", lançado em 1987, Lélia Gonzalez teve participação em um dos momentos mais importantes da história da população negra no Brasil. Ao lado de outros militantes, fundou em 1978, na cidade de São Paulo, o Movimento Negro Unificado contra a Discriminação Racial (MNU). Em seu manifesto, o movimento denunciava o mito da democracia racial, reivindicava o fim da violência e da discriminação sofrida pelos negros cotidianamente, além de exigir políticas públicas em benefício da comunidade afro-brasileira.
Lélia também foi ativista contra o sexismo e abordou em outras de suas obras temas como o feminismo e a situação das mulheres negras.

Sobre o Negro Muro

O Negro Muro são ocupações permanentes para resgatar histórias ou tornar o dia a dia mais leve, segundo acrescenta Pedro Rajão. Desde 2018, o produtor vasculha a memória negra brasileira para trazer à tona alguns dos nomes de maior representatividade, mapeando a memória negra na cidade do Rio, por meio de murais que demarcam a relação de personalidades históricas com o território onde viveram ou tiveram alguma relação de afeto. Já são 52 muros pintados pelo Rio, todos pelas mãos do artista e muralista Cazé.

O primeiro foi Felacut, no Grajaú. Martinho da Vila foi pintado em Vila Isabel, que não é só de Noel. O maior é o da Dona Ruth de Souza, vizinho ao Teatro Municipal, na Cinelândia. Atrás dela vem Pixinguinha, no Museu da Imagem e do Som (MIS), na Lapa. O circuito também contempla imóveis tombados, dois murais no interior do Muhcab (Gamboa), o estádio de São Januário, a quadra do Império Serrano (Madureira), da Caprichosos de Pilares e do GRES Pau Ferro, no Irajá. O projeto também pintou os muros das casas onde residiram o sambista Candeia, em Oswaldo Cruz, e João Cândido, o Almirante Negro, líder da revolta da Chibata (1910), em São João de Meriti.

Veja o Circuito da Igualdade racial

Lélia Gonzalez (1935 - 1994)

Ladeira de Santa Teresa 106, Santa Teresa

Intelectual de suma importância para o pensamento feminista negro brasileiro e latino-americano, Lélia Gonzalez deixou um legado de luta e produção acadêmica cada vez mais influentes no Brasil.

Maestro Anacleto de Medeiros (1866-1907)

Rua Príncipe Regente 44, Paquetá

Nascido e falecido na Ilha de Paquetá, Anacleto foi um dos compositores mais expressivos da música brasileira. Foi regente da banda do Corpo de Bombeiros e é autor dos clássicos "Santinha", "Três Estrelinhas" e "Não Me Olhes Assim".

Granes Quilombo (1975)

Rua Ouseley 810, Acari

Espaço consagrado pela resistência e celebração do samba e da ancestralidade africana no Rio de Janeiro.

Lima Barreto (1881 - 1922)

Rua Major Mascarenhas 26, Todos os Santos

Sua relação com o bairro de Todos os Santos é evidente em sua produção textual. Romancista, cronista, jornalista e contista, o intelectual negro carioca definiu sua própria obra como "militante".
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