Drauzio Varella criticou a medida anunciada pelo prefeito Eduardo PaesReprodução / Redes Sociais
Publicado 22/11/2023 08:37 | Atualizado 22/11/2023 14:51
Publicidade
Rio - A medida de internação compulsória de usuários de drogas anunciada pelo prefeito Eduardo Paes, nesta terça-feira (21), foi criticada pelo médico e escritor Drauzio Varella. De acordo com ele, essa proposta "não tem a menor chace de dar certo". A crítica foi feita em entrevista à GloboNews.

Paes determinou que o secretário municipal de saúde, Daniel Soranz, prepare o projeto. De acordo com o prefeito, a medida é necessária para aqueles que não aceitam qualquer tipo de acolhimento e que mesmo abordados em diferentes oportunidades pelas equipes da prefeitura e autoridades policiais, acabam cometendo crimes.

O médico e oncologista disse que é preciso impedir que as crianças que vivem em periferia cheguem ao estágio final do crack. "Esse tipo de solução mágica não tem a menor chance de dar certo. Nós temos que impedir que essas crianças que crescem na periferia cheguem ao estágio final do crack. O crack é o fim da linha. Quando chega nessa situação fica muito difícil, assim como é difícil tratar qualquer doença crônica em estágio avançado”, explicou.

De acordo com Drauzio, as clínicas não são vistas como uma solução porque o usuário continuaria tendo contato com a droga. "Isso dá a ilusão de que se você pega essas pessoas e coloca em uma clínica, ela vai ficar sem contato com a droga e vai conseguir resolver o problema, mas o problema é muito maior do que esse porque nessas clínicas entra drogas, sempre. Uma solução que eu veria é construir cadeias enormes e pegar todo mundo que usa crack e trancar na cadeia, mas isso não bastaria. Teria que entregar a administração para o crime organizado porque é a única instituição que conseguiria impedir a entrada da droga na cadeia", ressaltou.

Segundo a prefeitura, a ideia é que as internações sejam de pouco tempo e começando por pacientes em situações mais graves, aqueles que não têm condições de responder pelos próprios atos. Soranz estima que cerca de 130 pessoas vivem nessas condições. O secretário informou que o objetivo é diminuir a mortalidade dessa população. "São situações específicas onde o desfecho negativo do óbito acontece muito rápido. Infelizmente, esses pacientes não sobrevivem muito tempo", disse.
A coordenadora de saúde e tutela coletiva da Defensoria Pública do Rio de Janeiro (DPRJ), Thaisa Guerreiro, afirma que para diminuir a mortalidade dessa população, é necessário o investimento em políticas sociais. "Nós temos pouquíssimas unidades de acolhimento no Rio, e essas com estruturas precárias. Ou seja, se o prefeito quer solucionar o problema de desigualdade social no Rio, o correto é é investir em projetos para que os abrigos sejam locais adequados. Não é criminalizando que a gente vai solucionar o problema da desigualdade estrutural e sim investimento em políticas sociais de educação, moradia, assistência social, psicossocial. Isso faria com que a população fosse acolhida de forma adequada", ressaltou ao DIA.
Para a defensora pública, a declaração do prefeito viola instrumentos de proteção aos direitos humanos. "É uma medida inconstitucional porque viola a constituição federal e é ilegal porque viola as próprias políticas nacionais que veda a remoção forçada. A internação involuntária é uma medida excepcional determinada apenas a critério clínico e se dá a um período curto. Tem que lembrar também que temos pouquíssimos leitos de saúde mental em hospitais gerais no Rio", concluiu.
O relato de Paes foi publicado em uma rede social. "Não é mais admissível que diferentes áreas de nossa cidade fiquem com pessoas nas ruas que não aceitam qualquer tipo de acolhimento e que mesmo abordadas em diferentes oportunidades pelas equipes da prefeitura e autoridades policiais, acabem cometendo crimes. Não podemos generalizar mas as amarras impostas às autoridades públicas para combater o caos que vemos nas ruas da cidade, demanda instrumentos efetivos para se evitar que essa rotina prossiga", escreveu o prefeito.

No ano passado, o prefeito Eduardo Paes afirmou que considerava a população de rua o principal problema da cidade. Na ocasião, disse que avaliava voltar com a política de internação compulsória para dependentes químicos.

Em agosto, o Supremo Tribunal Federal (STF) proibiu a remoção e o transporte compulsório de pessoas em situação de rua às zeladorias urbanas e aos abrigos. A decisão também veda o recolhimento forçado de bens e pertences desse público.
Drauzio Varella é médico formado pela USP. Nasceu em São Paulo, em 1943. Na Rede Globo, participou das séries sobre o corpo humano, primeiros socorros, gravidez, combate ao tabagismo, planejamento familiar, transplantes e diversas outras, exibidas no programa 'Fantástico'. Além disso, Drauzio também é escritor e autor do livro 'Carandiru'.
Tarcísio Motta aciona STF
O deputado federal Tarcísio Motta (Psol-Rio) decidiu acionar, nesta terça-feira (21), o ministro do STF Alexandre de Moraes depois da declaração do prefeito Eduardo Paes, em suas redes sociais, sobre a internação compulsória de usuários de drogas.
No documento enviado ao ministro do STF, o deputado solicita que a Prefeitura da cidade do Rio de Janeiro seja intimada a certificar-se da decisão exarada pelo Supremo Tribunal Federal no âmbito da ADPF 976, mesmo que este Poder Executivo Municipal já tenha sido posteriormente intimado, como medida adicional de precaução diante o possível iminente descumprimento das determinações da corte.
O documento ainda solicita ainda que a Prefeitura do Rio preste esclarecimentos sobre as medidas que pretende adotar e que possam implicar no recolhimento forçado de pessoas em situação de rua e também quanto ao andamento da adoção de medidas que possam atender ao conjunto das determinações do Supremo Tribunal Federal que cabem aos Poderes Executivos Municipais no âmbito da ADPF 976.
Publicidade
Leia mais