Indígena do povoado Krikati, fotografada na década de 1990Hiromi Nagakura
Publicado 26/02/2024 00:00
Foram quase cinco anos de expedições pela Amazônia. De 1993 a 1998, a liderança indígena, ambientalista, filósofo e escritor Ailton Krenak guiou o fotógrafo japonês Hiromi Nagakura até povos originários de estados como Acre, Roraima, Mato Grosso, Maranhão, São Paulo e Amazonas. As viagens renderam fotografias sensíveis, que ecoam a intensidade dos encontros da dupla com os indígenas, e 160 delas estarão em cartaz na exposição 'Hiromi Nagakura até a Amazônia com Ailton Krenak', no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), a partir de quarta-feira.
No Japão, as viagens de Krenak e Nagakura já tinham sido registradas em exposições e livros. Nagakura já havia publicado um somente com imagens do povo Yanomami. Então, era antigo o desejo de Krenak de trazer os registros para serem exibidos no Brasil.
"Ao selecionar as imagens, procuramos mostrar a diversidade dos povos e de situações focando na relação de Nagakura com os povoados, ficando claro no olhar e no gesto de quem está sendo fotografado. A escolha foi a partir do que essas obras transmitem de relação e encontro", conta Angela Pappiani, curadora adjunta da exposição.
Através de Ailton, Nagakura entrou em contato com os povos Krikati, Gavião, Xavante, Huni Kuin, Yawanawá, Ashaninka, Yanomami e Kaxinawá e clicou momentos de intimidade de pessoas que receberam a dupla em suas cozinhas e canoas, praias de rios e aldeias. O acesso a lugares onde só os indígenas andavam foi garantido pela figura de Krenak. Hiromi conseguiu registrar de crianças se banhando nos afluentes do Rio Amazonas a homens pescando para a subsistência de suas famílias, além de rituais com pintura corporal e danças em volta da fogueira. A chave de entrada foi ficar na cola de Ailton. Quando a solicitação do plano de viagens foi feita pela intérprete Eliza Otsuka, em um encontro de Nagakura e Ailton na sede da Aliança dos Povos da Floresta, em São Paulo, ela resumiu a Krenak o conceito do projeto com essas palavras: "Ele [Nagakura] vai ser a sua sombra por onde você for, quando estiver dormindo e quando estiver acordado".
No entanto, fotografar durante as incursões não era a pretensão inicial de Hiromi. A motivação era conhecer povos e comunidades resilientes, que enfrentam situações difíceis e resistem, foco que orienta as viagens do fotojornalista ao redor do mundo.
A exibição contempla objetos como cestos, vestuário, chapéu, tiaras e objetos musicais usados em rituais indígenas. Conversas com lideranças indígenas de diversas etnias estão na programação.
Percurso da exposição é igual ao da viagem
A mostra ocupará as oito salas do primeiro andar do CCBB e a rotunda, no térreo, onde haverá uma instalação aérea inédita, pensada especialmente para o espaço e seguindo o formato circular da estrutura, com imagens da exposição plotadas em tecido.
As salas seguirão a ordem cronológica das visitas da dupla à Amazônia, como se o público estivesse viajando junto com eles. Na primeira, estarão fotografias dos povos Krikati e Gavião, localizadas em regiões impactadas por invasões, desmatamento e hidrelétricas na região.
O espaço seguinte terá registros dos povos Ashaninka, Yawanawá, Xavante e Kaxinawá. Já nos cofres, serão montadas salas imersivas com sons da floresta e cantos indígenas, levando o público a viajar por estes territórios e etnias. Além disso, haverá um vídeo com registros de viagens de Nagakura por todos os continentes e uma sala dedicada aos Yanomami.
Continuando o percurso, chega-se à sala 'Imagem e Cultura', com fotografias inéditas e objetos dos povos visitados. Este será um espaço multiétnico, com imagens que conversam entre si, agrupadas por temas, situações, cores ou paisagens, sem divisão por etnia, acolhendo todos os povos em um só lugar.
No último ambiente, estarão os núcleos 'O Reencontro' (onde será exibido um vídeo com conversas de Krenak e Nagakura com lideranças indígenas de todas as etnias visitadas, além de outro com a íntegra da conversa entre o fotógrafo e o curador registrada para o projeto 'Conversa na Rede', gravada na Casa Ateliê de Tomie Ohtake) e 'A Viagem', com registros de bastidores, retratando Krenak e Nagakura durante a viagem, a cumplicidade deles e junto aos amigos das aldeias. Ainda estará abrigada a obra 'Território imemorial ou Hiromi Nagakura até a Amazônia com Ailton Krenak', do artista Gustavo Caboco, feita para a mostra e que apresenta um mapa com os territórios visitados por Nagakura e Krenak.
Rodas de conversa e palestras
Lideranças indígenas de diversas etnias participarão de conversas realizadas em torno da exposição, junto com Nagakura e Krenak. No dia da abertura da exposição, às 17h, haverá a conversa 'Hiromi Nagakura e Ailton Krenak encontram os povos da floresta', com a presença da dupla e também das lideranças indígenas Moisés Pyianko Ashaninka e Leopardo Huni Kuin, além da participação de Marize Guarani, presidente da Associação Indígena Aldeia Maracanã. No quinta-feira, às 17h, haverá mais uma roda de conversa, 'Hiromi Nagakura e Ailton Krenak encontram os povos do cerrado', com Krenak, Nagakura e as lideranças indígenas Marineuza Pryj Krikati, Maria Salete Krikati e Caimi Waiassé Xavante, além da participação de Carlos Tukano, presidente do Conselho Estadual de Direitos Indígenas do Rio. Sexta-feira, às 17h, Krenak e cinco lideranças indígenas da Amazônia farão palestra.
Os ingressos para as conversas e palestras são distribuídos na bilheteria física e virtual a partir das 9h do dia da atividade. O CCBB fica na Rua Primeiro de Março, 66, Centro do Rio. De quarta a segunda, das 9h às 20h.
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