Publicado 15/08/2024 14:44
Rio - A quadra da Portela, em Madureira, na Zona Norte do Rio, vai abrir as portas à cultura com a sua tradicional festa literária — pela primeira vez celebrada em agosto. A quarta edição da "FliPortela", que acontece gratuitamente nesta sexta-feira (16) e sábado (17), vai homenagear dois históricos baluartes da agremiação, Monarco (1933-2021) e Candeia (1935-1978).
PublicidadeCom o tema "Territórios", a programação vai contar com feira de livros, oficinas, atrações musicais e diversas rodas de samba. O evento terá, ainda, a exibição do Cine Samba Candeia, que conta um pouco sobre cultura do samba e do Carnaval, em particular, sobre a história e os personagens portelenses.
Em entrevista ao DIA, o diretor cultural da agremiação, Rogério Rodrigues, afirma que esta é uma forma que a Portela encontrou de incentivar o acesso à cultura, especialmente para o povo suburbano. Para ele, as escolas de samba têm uma função social importante que vai além do Carnaval.
"O povo suburbano também consome literatura. É importante que todos tenham acesso à leitura e arte. Mais do que uma feira, nós fazemos uma festa. Queremos abrir espaço para a comunidade, para que essas pessoas perceberem que escola de samba é um local de troca de conhecimento e de convivência para além do Carnaval", disse.
O presidente da Portela Fábio Pavão, também comentou sobre o papel da feira para a comunidade portelense: "É uma forma de aproximar a comunidade da literatura, a partir de temáticas que valorizam o povo preto e suburbano."
Segundo Rogério, a edição deste ano pretende propor uma reflexão sobre a importância dos territórios para as escolas de samba. Representantes de agremiações de diversos locais da cidade e até da Baixada Fluminense vão participar nas rodas de conversas da festa literária.
"Queremos falar sobre as favelas, os subúrbios, as periferias e outros espaços de reflexão. Mas queremos falar de potências, não apenas de problemas", completou o diretor cultural.
Programação
Historicamente celebrada em abril, a edição deste ano acontece em agosto para que dois grandes baluartes da agremiação sejam homenageados. Monarco e Candeia fariam aniversário no sábado (17) e, segundo Rogério, a data foi escolhida para que os dois pudessem ser lembrados.
"São dois gênios da cultura brasileira. O Monarco foi uma grande enciclopédia do mundo do samba. Ele era portador de um enorme acervo, resgatando sambas antigos da Portela e de outras escolas. O Candeia era um intelectual negro e posso afirmar que ele criou uma pedagogia. Ele escreveu o livro 'Escola de samba: árvore que esqueceu a raiz'. O livro foi relançado e nós vamos falar sobre essa obra que propõe uma reflexão sobre a importância das agremiações no resgate da ancestralidade e da cultura do samba", explicou.
As atividades terão início na sexta-feira, às 17h, com uma mesa de discussão sobre os movimentos afrodiaspóricos. Em seguida, às 19h, haverá a abertura oficial do evento, que contará um pouco da história portelense. Às 20h30 será feita uma homenagem aos históricos baluartes e, para fechar o primeiro dia de festa, os grupos De Qualquer Maneira e Herdeiras do Samba vão animar o público com um show.
Já no sábado, o evento irá começar às 10h com a oficina "Pedagogia dos Terreiros", seguido por mesas redondas sobre territórios do samba e o musical infantil "As Aventuras de Pé-de-Vento no Dia de Cosme e Damião", com Clara Santhana e Leandro Castilho. A partir das 14h, começam discussões sobre territórios, memórias e patrimônios, com diversos convidados. A festa termina com uma roda de samba-enredo com o grupo Samba Enredo de Raiz.
A quadra da Portela fica na Rua Clara Nunes 81.
Monarco e Candeia
Hildemar Diniz levava o apelido de Monarco desde sua infância, quando vivia em Nova Iguaçu. Nascido em Cavalcanti, na Zona Norte do Rio, passou a frequentar as rodas de samba ainda na adolescência. Foi nessa época em que ele conheceu Paulo da Portela (1901-1949), fundador da Azul e Branco, e virou seu discípulo.
Na década de 1950, ingressou na ala de compositores da escola. Nos anos 1960 ele chegou a integrar o Unidos do Jacarezinho, mas retornou à Portela em 1969. Autor de clássicos sambas da agremiação, como "Passado de Glória", ele também deixou sua marca com músicas como "Vai vadiar" e "Coração em Desalinho", eternizadas por Zeca Pagodinho. Monarco faleceu em dezembro de 2021, aos 88 anos, em decorrência de complicações de uma cirurgia feita no intestino.
Filho do portelense Antônio Candeia, o sambista Candeia - que levava o nome do pai - nasceu em Oswaldo Cruz e cresceu na escola, já que desde os seis anos de idade frequentava as rodas de samba e de choro organizadas pelo pai. Aos 17 anos, Candeia apresentou para a agremiação o samba "Seis Datas Magnas", escrito em parceria com Altair Prego.
A música não só venceu o concurso para ser o samba-enredo do ano como rendeu nota 10 do júri em todos os quesitos do desfile de 1953 – algo que nunca havia acontecido no Carnaval do Rio. Com a Portela, ele ainda foi tricampeão do Carnaval em 1955, 56 e 57 e venceu as edições de 1959 e 1965, somando seis títulos pela agremiação.
Compositor do samba "Preciso me Encontrar", gravado e eternizado na voz de Cartola (1908-1980), Candeia morreu em novembro de 1978, aos 43 anos, após sofrer uma parada cardíaca provocada por uma septicemia.
*Reportagem do estagiário João Pedro Bellizzi, sob supervisão de Thiago Antunes
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