Celular é um dos objetos mais roubados no BrasilTania Rego / Agência Brasil
Publicado 15/09/2024 06:00
“A sensação foi de impotência, porque foi tão rápido que eu não tive tempo de absolutamente nada”, desabafou a jovem Maria Clara Anselmo, 20 anos, ela teve o celular furtado enquanto estava no transporte público. Assim como ela, cerca de 9,2% da população foi vítima de furto ou roubo de celular no país, segundo apontam os dados recentes de um levantamento do Datafolha, encomendado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) e pela Folha de S.Paulo.
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A pesquisa, realizada com 2.508 pessoas maiores de 16 anos de todas as regiões do país, aponta que 53% dos entrevistados evitaram passar por determinados locais ou horários por medo de perderem seus smartphones. A situação é especialmente crítica nas capitais, onde 15% das vítimas residem. Com base nos dados coletados, estima-se que 14,7 milhões de pessoas foram alvo de criminosos ao longo do período analisado, resultando em uma média alarmante de 1.680 celulares roubados por hora no Brasil.
Para a jovem, o celular era essencial para que ela pudesse gerenciar sua vida entre múltiplas responsabilidades, incluindo faculdade, estágio, projetos de pesquisa e extensão, além de compromissos pessoais e religiosos. Ela relatou que, no dia do furto, estava resolvendo questões pessoais quando, de repente, um homem passou correndo e arrancou o celular de sua mão.
“Eu era uma das pessoas menos prováveis [de ser furtada] porque eu não estava próxima da porta, eu não estava sentada mais perto do corredor, mas foi o que aconteceu e acabou levando meu celular”, contou.
Apesar de ter feito um boletim de ocorrência online, ela tentou localizar o celular usando ferramentas de rastreamento, mas sem sucesso. Além disso, os criminosos tentaram enganá-la e a seu irmão com tentativas de golpes, se passando por pessoas que tinham encontrado o celular na tentativa de obter informações confidenciais. Para ela, além do prejuízo financeiro, o mais difícil foi perder os itens pessoais armazenados no aparelho.
No Rio, onde a violência urbana é uma preocupação constante, a segurança dos dispositivos móveis tem ganhado cada vez mais espaço. Desde a criação da plataforma Celular Seguro em 2023 pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública, mais de 10.574 celulares roubados foram bloqueados apenas no Rio de Janeiro. Com mais de 2,2 milhões de pessoas cadastradas em todo o país.
De acordo com o coordenador geral de planejamento, integração e inovação de Soluções de TIC para a Segurança Pública, José Rocha, o Programa Celular Seguro é uma medida essencial para proteger os consumidores no ambiente digital, combatendo o roubo e o furto de aparelhos celulares no Brasil. “O programa disponibiliza uma ferramenta única que permite ao cidadão acionar bloqueios tanto do aparelho (IMEI) quanto da linha telefônica, além de aplicativos bancários e outras plataformas de serviços”, pontua. Ele ainda explica que, ao ativar o alerta e efetuar o bloqueio, o aparelho se torna inutilizável, o que "desincentiva o crime de revenda ilegal de celulares resultantes de um crime."
Rocha também destaca que a ferramenta contribui para a redução da suscetibilidade dos cidadãos a fraudes financeiras, pois bloqueia a linha telefônica e os aplicativos embarcados, como ferramentas de internet banking. Olhando para o futuro, ele menciona a intenção de evoluir a plataforma para permitir a recuperação de aparelhos roubados, através da criação de um Protocolo Nacional de Recuperação de Celulares.
Além de proteger os dispositivos, Rocha salienta a importância de conscientizar a população sobre a necessidade de registrar e bloquear o aparelho imediatamente após um roubo ou furto, promovendo uma cultura de segurança digital. Ele também recomenda a implementação de medidas de segurança adicionais, como a autenticação em dois fatores ou biométrica, para aumentar a proteção dos dispositivos e dos dados dos usuários. Essas ações combinadas, segundo Rocha, não só desestimulam a prática do crime, como também dificultam a revenda dos aparelhos e frustram tentativas de golpes adicionais nos aplicativos dos dispositivos.
Segundo o especialista em segurança e capitão veterano do BOPE, Paulo Storani, o furto e roubo de celulares se tornaram uma das formas mais comuns de criminalidade. Ele explica que, embora o valor de um celular possa parecer baixo, a realidade é que esses crimes têm se tornado cada vez mais violentos. "Nós tivemos um acréscimo significativo de todas as modalidades de delitos a partir de 2023 e principalmente esses delitos de rua. São aqueles que teriam ali, teoricamente, o menor potencial ofensivo, quando a gente fala do valor do celular que não seja um aparelho de um valor muito alto", afirma Storani.
Contudo, ele ressalta que o problema vai além da capacidade de atuação da polícia, que é limitada pelo número de agentes disponíveis para patrulhar as cidades. "A polícia atua na oportunidade do cometimento do delito. E quando você tem um grande número estimulado a cometer o delito, não há policiais suficientes para patrulhar todas as cidades, em todos os lugares, ao mesmo tempo", destaca. A gravidade da situação aumenta pelo fato de que muitos desses crimes resultam em violência extrema, com vítimas sendo mortas durante os roubos. "Pessoas são mortas em razão do roubo do seu celular. Os criminosos estão tirando a vida dos proprietários, não se limitando simplesmente a desapropriá-lo", ressalta.
O especialista em segurança ainda salienta que os criminosos frequentemente escolhem alvos mais vulneráveis, como mulheres, idosos e pessoas distraídas, além de utilizarem disfarces, como o de entregadores de comida, por exemplo, para cometerem os delitos. "A população acaba adotando determinadas estratégias ou mudando seu comportamento para diminuir o seu potencial de vitimização, lembrando que esses criminosos são covardes, eles sempre buscam mulheres, pessoas com mais idade, idosos, ou pessoas que estão ou distraídas ou estão usando o seu aparelho celular", alerta.
Para Storani a importância crescente dos celulares na vida das pessoas, torna esses crimes ainda mais lucrativos para os criminosos: "O celular não é mais um aparelho de comunicação, boa parte da vida das pessoas está registrada nos aplicativos desses aparelhos, e principalmente aqueles que trazem informações financeiras", pontua. Ele explica que os criminosos frequentemente desbloqueiam os celulares para realizar transferências bancárias, tornando o crime mais rentável, mas também mais perigoso para as vítimas, que podem ter suas vidas ameaçadas ao tentar resistir. "Numa tentativa de resistir a uma situação como essa, pode ter ali a sua vida ceifada por esses criminosos que não têm nada a perder”, diz.
O que pode ser feito em caso de roubo ou furto
O advogado criminalista Felipe Juliasse orienta que, em caso de perda ou roubo de celular, o primeiro passo é tentar bloquear o aparelho remotamente usando serviços como o Find My iPhone (para dispositivos Apple) ou Find My Device (para dispositivos Android). Caso isso não seja possível, ele recomenda solicitar o bloqueio do IMEI junto à operadora. Juliasse também enfatiza a importância de registrar um boletim de ocorrência online logo após o incidente, explicando que "é importante para realizar a formalização da denúncia, além de servir como prova para bloquear serviços bancários, entre outros, acionar seguros e identificar o proprietário do celular em caso de recuperação do mesmo", pontua o especialista.
O advogado ressalta a importância de adotar medidas preventivas de segurança, como utilizar senhas fortes, evitar padrões simples, e habilitar a autenticação biométrica e a criptografia dos dados no aparelho. Ele também recomenda ativar a verificação em duas etapas e manter backups sempre atualizados. Segundo ele, "a criptografia protege os dados contra acesso não autorizado, já a autenticação biométrica dificulta o desbloqueio do aparelho por terceiros", enfatiza Juliasse.
Em caso de perda ou roubo, além de bloquear o celular remotamente, Juliasse aconselha a mudar as senhas das contas prioritárias, desconectar o dispositivo de todas as contas, e revisar as configurações de autenticação em duas etapas para garantir a proteção dos dados. Ele ainda sugere que se evite expor o celular em locais de risco, mantenha o IMEI anotado e o sistema do aparelho sempre atualizado para prevenir vulnerabilidades.
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